Pergunta:
Peço, por favor, que me esclareçam a seguinte dúvida.
Por que razão, na frase «Desde os Romanos aos Mouros, aqui se encontram diferenças, se debatem ideias, se cria», o pronome pessoal se surge antes do verbo?
Transcrevo, de seguida, o texto completo de onde a frase acima foi retirada:
«Quem és tu, Coimbra? Coimbra, a cidade do conhecimento! Na verdade, desde há séculos que a cidade é um ponto de encontro entre culturas. Desde os Romanos aos Mouros, aqui se encontram diferenças, se debatem ideias, se cria. Depois de tornada cidade universitária – a única em Portugal durante 400 anos – foi também lugar de polémicas e de paixões. O seu Fado, triste e melancólico, fala desta cidade como porto de encontros e de partidas. E o rio Mondego traz à cidade a água profunda que vem da Serra da Estrela e atravessa a cidade até chegar ao mar na Figueira da Foz.»
Agradeço, antecipadamente, a vossa disponibilidade.
Resposta:
Os advérbios locativos, quando surgem antes do verbo, poderão ou não atrair o pronome átono para posição proclítica (colocação antes do verbo). A diferença de comportamento sintático está associada ao valor que o advérbio expressa.
Assim, quando os advérbios estão focalizados, usa-se a posição proclítica, como em (1):
(1) «Aqui se faz o melhor pão da região.»
Como explica Martins, «[a]s frases em que ocorrem os advérbios locativos focalizados podem […] ser parafraseadas por ‘[aí/ali/… é que’ ou por ‘só [ai/ali/…] e não noutro lugar’»1. Neste caso, a frase veicula a ideia de que o espaço é exclusivo, destaca-o entre outros lugares onde também se faz pão. Deste modo, a frase (1) equivale a
(1a) «Aí nesse lugar, e em nenhum outro, é que faz o melhor pão da região.»
Os advérbios locativos em posição pré-verbal associam-se à ênclise quando estão topicalizados. Como explica Martins, «[n]esta situação, ou o advérbio locativo tem um antecedente discursivo, interpretando-se como um locativo anafórico ou a referência locativa definida resulta da sua natureza deítica»2.
(2) «A padaria ficava no final da rua. Ali fabricava-se pão de centeio.»
Neste caso, o advérbio não admite a focalização «aí/ali/… é que». Na frase apenas se afirma que naquele local se fabrica pão de centeio.
Se atentarmos na frase apresentada pela consulente, vemos que a sua interpretação é dúbia:
(3) «Coimbra, a cidade do conhecimento! Na verdade, desde há séculos que a cidade é um ponto de encontro entre culturas. Desde os Romanos aos Mouros, aqui se encontram diferenças, se debatem ideias, se cria.»
Considerando apenas o ex...