Ana Carina Prokopyshyn - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Ana Carina Prokopyshyn
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Ana Carina Prokopyshyn (Portugal, 1981), licenciada em Línguas e Literaturas Modernas (2006) e mestre em Linguística Geral pela FLUL (2010). Desde 2010 frequenta o doutoramento em História Contemporânea (Lusófona e Eslava). Participou com comunicações e a nível da organização em várias conferências internacionais, e presta serviços em várias instituições como professora de Português para estrangeiros, tradutora e revisora. Atualmente é leitora de Língua e Cultura Russa I e II na mesma universidade e investigadora no Centro de Línguas e Culturas Lusófonas e Europeias. Colabora como consultora de língua Portuguesa no Ciberdúvidas desde 2008.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Aproveito a vossa resposta n.º 30 079 para fazer uma pergunta. Nesse caso, para manter uma certa coerência com aquilo que os senhores dizem no terceiro parágrafo, não se deveria escrever (e pronunciar) VlaDÍmir e BaRÍS (em vez dos já muito disseminados VladiMIR e BÓris)? Segundo aquilo que um falante de russo me informou, a palavra Vladimir é paroxítona, e a palavra Boris é oxítona, para além de a letra russa o ser pronunciada de um modo parecido ao nosso â fechado, quando não é acentuada. Correcto? Estendo a minha pergunta para todos os casos em que, na tradução/transliteração para o português, tornou-se corriqueiro fazer a deslocação do acento.

Resposta:

Exatamente. Se quisermos, ao transliterar os nomes próprios Владимир (Vladimir) e Борис (Boris), manter a pronúncia original, como indica o consulente, é necessário reconhecer que a primeira palavra é paroxítona – não precisando de um acento gráfico em português para que se acentue assim – e a segunda, oxítona. Também é verdade que o nome Boris, em russo (e sem equivalente em português, pelo que não pode ser traduzido, e tal prática, como dissemos em resposta anterior, caiu em desuso), é pronunciado [bɐris], portanto, com redução vocálica do o – precisamente por fazer parte de sílaba átona e, acrescentamos nós, com o som [s] no fim, e não [ʃ], como habitualmente pronunciamos, ou seja, para lermos este nome tal como se pronuncia em russo, teríamos de grafar algo como Barice (neste caso, paroxítona, não se pronunciando o e final, mas que teria de ser grafado para c ter valor de [s] e não de [k], como leríamos em baric). Mas surge-nos, com isto, outro problema, ao mantermos a pronúncia, afastamo-nos da transliteração (passemos a redundância) «à letra».

Esta questão é complexa, e, enquanto não existir uma norma, será difícil estabelecer parâmetros que cumpram, ao mesmo tempo, vários objetivos: a) fazer corresponder as letras, ou seja, transliterar fielmente; b) fazer corresponder a pronúncia, procurando, nesse sentido, a melhor combinação de letras existente no alfabeto de destino; c) obedecer às regras ortog...

Pergunta:

Gostaria de saber qual a grafia correta em português da capital do Montenegro, que em sérvio e em montenegrino se escreve Подгорица, e que normalmente se encontra em português na forma Podgorica.

Tendo-me deparado com formas aportuguesadas (como Podgórica), questionei-me se a utilização do c seria a mais correta neste caso, já que a informação da pronúncia que encontrei dizia [ˈpɔdgɔˌriʦa]. Não serão Podgorítesa/Podgoríteza ou Podgóritsa/Podgóritza melhores alternativas? Onde colocar a acentuação? Colocar um e entre o d e o g?

Resposta:

Grafia correta no que trata topónimos e antropónimos transliterados menos conhecidos é ainda «terreno lamacento», já que, como várias vezes abordado no Ciberdúvidas, não existe uma norma de transliteração.

O que acontece é que há uma transliteração que se vai generalizando, é adaptada pela maioria dos falantes e, assim, passa a ser considerada como «a mais correta». Podgorica é, sem dúvida, a transliteração mais corrente, não só em português como em inglês, francês e noutras línguas. Mas a verdade é que, apesar de lícita, essa transliteração não dá conta do valor da última consoante da palavra, que se lê [ts] (som que em português se encontra na palavra tsunami) e não [k]. Ora, se temos tsunami e não *cunami, não vejo porque não podemos ter Podgóritsa em vez de Podgoritsa, respeitando a pronúncia original, a questão é que estamos tão habituados à referida transliteração, que se será difícil mudar hábitos.

Outra opção seria traduzir o topónimo (pois neste caso é possível), à semelhança do nome do país de que esta cidade é capital, Montenegro – Црна Гора, cuja transliteração mais fiel à pronúncia seria Tserna Gora – mas que se traduz por: Montenegro; Црна (Negra) Гора (Montanha). Assim poderíamos fazer como com a sua capital, Подгорица: que significa algo como «Debaixo da Colina/Monte» (e por acaso até temos um topónimo português parecido: Trás-os-Montes). Mas se Podgoritsa será difícil de adotar, muito pior será «Debaixo da Montanha».

Parece que, pelo menos para já, a ...

Pergunta:

Como se deve dizer: «ou eu ou tu fazemos isto...», ou: «ou eu ou tu faço isto»?

Resposta:

Numa coordenação deste tipo, a concordância entre o verbo e o sujeito depende do valor da conjunção ou (inclusivo ou exclusivo).

Quando a posição sintática de sujeito é ocupada por mais do que uma entidade referencial nominal e a conjunção ou tem um valor inclusivo, então a concordância é feita no plural – como podemos observar no exemplos abaixo, ou tem uma leitura quase equivalente à conjunção e – veja-se e compare-se a) e b):

a) i. «Ou eu ou tu fazemos isto sem dificuldades. Ambos somos qualificados para tal.»

ii. «Ou a faca ou a tesoura são objetos de perigo para as crianças.»

b) i. «Eu e tu fazemos isto sem dificuldades. Ambos somos qualificados para tal.»

ii. «A faca e a tesoura são objetos de perigo para as crianças.»

Por outro lado, quando ou tem um valor exclusivo1, então a concordância só poderá ser feita assim:

c) i. «Um de nós faz isto.»

ii. «Alguém tem de fazer isto: ou eu ou tu.»

iii. «Quem faz isto? Eu ou tu?»

E não de outras formas:

d) i. *«Ou eu ou tu faço isto.»2

ii. *«Ou eu ou tu faz isto.»

iii. *«Ou eu ou tu fazemos isto.»

iv. *«Ou eu ou tu fazes isto.»

Resumindo: pode d...

Pergunta:

No âmbito de uma tradução do castelhano que estou a realizar, e confrontada com a necessidade de encontrar equivalente em português para a função sintática de «complemento predicativo», sugiro como base de reflexão a seguinte frase:

«Os corredores chegaram transpirados à meta.»

Neste contexto, a palavra transpirados será um adjetivo e, como tal, desempenhará na frase a função sintática de modificador adjetival do nome (o antigo atributo), ou, pelo contrário, de modificador verbal?

Resposta:

Começando pela segunda parte da pergunta, no contexto acima, a palavra transpirados é um adjetivo que está a qualificar o sujeito ao momento da «chegada à meta», logo, podemos afirmar que desempenha a função de predicativo do sujeito.

Diferente seria se tivéssemos uma frase como «Os corredores chegaram depressa à meta». Neste caso, o que está a ser modificado é o verbo, e não o sujeito.

Relativamente à questão de encontrar um equivalente em português para o que se designa por «complemento predicativo» na terminologia castelhana, então indicamos predicativo do complemento direto, e um exemplo desta função sintática, mantendo o mesmo adjetivo, seria: «Achei os corredores transpirados

Esperamos ter ajudado.

Pergunta:

Qual a melhor grafia, em português, para os antropônimos V. I. Lenin e L. Trotski?

Quais são as regras para esses casos?

Resposta:

Infelizmente, como já várias vezes referimos aqui no Ciberdúvidas, não existe uma norma para a transliteração do alfabeto cirílico.

Normalmente, o que se tenta é encontrar a correspondência fonética mais próxima do original, respeitando as normas ortográficas da língua de destino, tratemos quer de antropónimos quer de topónimos, etc.  Desta forma, o já há muito consagrado antropónimo Lenine, em português (e ao contrário do russo, cuja composição letra a letra é Lenin), grafa-se com e no fim, precisamente para não termos uma palavra terminada em n, apesar de esta vogal não ser lida, como acontece com, por exemplo, Marlene.

É de sublinhar, no entanto, que, apesar de em russo não existir acento gráfico (à exceção do trema), a transliteração deve ser acentuada, para evitar que se fuja à fonética original, em que a sílaba tónica é a primeira, e não a penúltima. Portanto: Lénine/Lênine. O que não significa que esteja errada uma transliteração sem ser adaptada ao português, e portanto, sem o e final: Lénin/Lênin.

Claro que a questão é muito mais complexa do que parece à primeira vista, já que em russo se aplica uma regra fonológica denominada palatalização que, basicamente, se processa nas consoantes que antecedem vogais como e. Isto para dizer que a correta leitura do antropónimo em questão corresponderia em português a algo como Lhenin, em que se lê tal como em