Sempre que o tema em foco é a formação de professores(as) de línguas, obrigamo-nos a refletir sobre o perfil que o professor deve ter para enfrentar os desafios do mundo contemporâneo, com situações de ensino-aprendizagem cada vez mais diversos e complexos. No âmbito da formação em língua portuguesa, um dos aspectos que muito se discute é que não basta ao professor ter apenas o domínio do seu objeto de ensino, o conhecimento da língua em si, mas, especialmente, estar preparado para compreender o papel dessa língua no mundo globalizado. Assim, o conhecimento que ele tem sobre a língua só será efetivo se considerar as necessidades e demandas de seu público e de seu ambiente de atuação e de intervenção. Ensinar e aprender português, seja na perspectiva de língua materna ou para falantes de outras línguas, requer uma preparação do professor para lidar com os desafios impostos pela própria diversidade de uso da língua, nos espaços onde é idioma oficial e, também, fora dele.
Uma experiência recente, e ainda em curso, tem sido o desenvolvimento do Curso Português Pluricêntrico – Formação de professores de Português como Língua Pluricêntrica, iniciativa do Instituto Internacional da Língua Portuguesa, desenvolvida pelo Observatório de Português Língua Estrangeira / Segunda Língua, com o apoio do Ministério das Relações Exteriores do Brasil. O curso é oferecido em modalidade remota, com carga horária de 48 horas, e aborda diversos temas, que vão desde a mobilização de conceitos importantes para a formação docente, como concepções de língua, políticas linguísticas, multiletramentos, interculturalidade, até os relativos ao desenvolvimento de metodologias e práticas didático-pedagógicas. O mais importante é que todos os conteúdos têm como eixo articulador o pluricentrismo da língua portuguesa. Assim, na construção dessa experiência colaborativa, participam professores formadores de Angola, Brasil, Cabo Verde, Moçambique, Portugal e de vários outros países como Espanha, Itália, Estados Unidos, Uruguai, entre outros. E esse tem sido um desafio fabuloso e prazeroso, pois pela primeira vez num curso de formação temos a presença de diferentes normas da língua portuguesa, dialogando e articulando conhecimento de modo ativo e instigante. Isso tem contribuído para que os professores em formação reflitam sobre a língua que ensinam a partir de uma visão mais sensível e respeitosa às diferenças. Atualmente, 85 professores estão em curso, majoritariamente dos PALOP e Timor-Leste. Foi gratificante, por exemplo, ouvir um professor angolano, em um dos nossos encontros síncronos, dizer: «Professora, eu estou muito feliz com essa experiência. Eu nunca imaginei poder aprender tanto, conhecer a minha língua por outras perspectivas. E eu nunca me senti tão valorizado em meu modo de falar e de ensinar.» Essa experiência tem mostrado, na prática, que o crescimento e fortalecimento de nossa língua depende de um trabalho conjunto e colaborativo, nos respeitando uns aos outros em nossos modos de ensinar, aprender e viver em português.
Áudio disponível:
[AUDIO: Edleise Mendes – Pluricentrismo linguístico e formação docente]
Crónica do programa Páginas de Português na Antena 2, em 30 de outubro de 2022.