«Desde 1976 – escreveu Vasco Pulido Valente no jornal português “Público” [“Merecidos vexames”, 26 de julho de 2014] – nenhum Governo se ocupou seriamente da defesa da língua. O Dicionário da Academia de Ciências não passa de uma triste imitação do Oxford Shorter, não há uma gramática decente e acessível ao leigo ou um Thesaurus ou sequer, com as confusões do Acordo, um prontuário ortográfico decente e fiável.» A discordância de José Mário Costa, em artigo publicada no mesmo jornal, cinco dias depois – que a seguir se transcreve, na íntegra.
Em “Merecidos vexames” (“Público”, 26/07), Vasco Pulido Valente tece algumas considerações que só por desconhecimento e défice de informação se podem sustentar.
É o caso concreto dos dicionários, prontuários e gramáticas disponíveis em Portugal. Isto é: feitos em Portugal, de raiz; porque, do Brasil, também os há disponíveis entre nós (e, por regra, até melhores e mais variados).
1) 13 anos depois da sua publicação, a oferta lexicográfica portuguesa não se esgota, nem pouco mais ou menos, no Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa. Pelo menos, cinco dicionários podem ser apontados, alguns deles disponíveis gratuitamente via Internet e com regular atualização. Basta consultar o livro da Professora Margarita Correia, Os Dicionários Portugueses (ed. Caminho) e colher aí informação autorizada. O Ciberdúvidas da Língua Portuguesa também pode dar uma ajuda.
2) Idem quanto à qualidade e diversidade assinaláveis de prontuários ortográficos. Desde o mais antigo de todos eles, o de Magnus Bergström e Neves Reis – que vai já na 50.ª edição atualizada – até aos de José M. de Castro Pinto, de D’Silvas Filho ou de Olívia Maria Figueiredo e Eunice Barbieri de Figueiredo. E tantos outros mais.
3) «Não há uma gramática decente e acessível ao leigo». Então, e a Nova Gramática do Português Contemporâneo, de Celso Cunha e Lindley Cintra? Isto só para lembrar a mais clássica delas e continuadamente de consulta obrigatória. Já para não falarmos da Gramática da Língua Portuguesa, de Maria Helena Mira Mateus, Inês Duarte e Isabel Hub Faria, ou da recentíssima Gramática do Português, editada pela Gulbenkian, de nível mais académico.
4) É verdade que não temos um Thesaurus – como devíamos ter, se houvesse, entre nós, uma Academia bem mais atuante e competente para as questões da língua. Mas, como não há razão de só nos vergastarmos com as nossas misérias e insuficiências, cabe também lembrar que passámos a dispor, finalmente, de um Vocabulário Ortográfico que já não nos envergonha na comparação com o brasileiro que já vai na 5.ª edição. São até três, a bem dizer – sendo que o mais completo deles, com mais de 200 mil entradas, até se encontra acessível a qualquer pessoa ou entidade, via Portal da Língua Portuguesa, juntamente com uma série de outros recursos e ferramentas únicas em todo o espaço da lusofonia.
Enfim, como em matéria da língua só prevalece o ruído à volta do Acordo Ortográfico, de nada disto se fala nos jornais. Logo, não existe.
P.S. – Concordância óbvia quanto à inexistência, entre nós, de uma política da língua minimamente estruturada, consequente e com verdadeiro sentido de Estado. Já em relação aos supostos “vexames” das “lições” de português, vindas elas de onde vêm, bem prega frei Tomás...