Num mundo onde as palavras têm cada vez mais pressa, os verbos são frequentemente escolhidos sem a devida ponderação quanto à adequação ao contexto. Veja-se o exemplo recente numa notícia onde, inspirada por uma versão original em espanhol – «Agostina Rubini se metió en un contenedor de basura en Palma y quedó atrapada» (Diario de Mallorca, 22 de outubro de 2024) –, se afirma que uma pessoa «entrou num contentor do lixo» (Correio da Manhã, 23 de outubro de 2024). Ora, num primeiro instante, tal frase pode não causar qualquer estranheza ao leitor, mas, será que um contentor de lixo é um espaço onde se entra, ou seria mais natural meter-se nele?
Em português, o verbo entrar parece estar mais reservado para espaços delimitados, acessíveis como lugares de entrada: entra-se numa casa, num carro, numa sala. Em resumo, trata-se de um verbo mais associado a locais próprios para a circulação humana, onde entrar evoca a passagem para um espaço interior e fechado, ainda que pequeno. Sendo assim, dizer «entrar num contentor» parece provocar um certo desconforto linguístico, pois não se alinha com os significados associados a entrar. Um contentor de lixo, sendo um recipiente, é menos um espaço de entrada e mais um lugar em relação ao qual ocorre, por acaso ou necessidade, usar meter-se ou colocar-se.
Este detalhe não é de menor importância, pois demonstra o cuidado necessário na transposição de uma língua para outra. Em espanhol, o verbo equivalente meter oferece uma elasticidade que abrange contextos distintos – note-se que o Dicionário da Real Academia Española apresenta como seu sinónimo entrar – e, por isso, uma escolha em português poderia ser entrar. No entanto, o verbo português mais literal meter-se salienta-se como mais adequado para dar conta do triste acidente noticiado.
Para evitar a impropriedade vocabular, recomenda-se, portanto, que se diga «meteu-se num contentor de lixo», escolha que reflete melhor a realidade descrita e a peculiaridade da ocorrência.