Na edição impressa do jornal desportivo A Bola em 24/07/2024, escrevia-se que, no jogo amigável disputado na véspera entre o Sporting e o Sevilha, «os espanhóis apresentaram-se em bom plano[...], com marcação "serrada" a Pedro Gonçalves». No momento da redação destas breves linhas, a edição digital da mesma publicação continua a exibir a mesma sequência, incluindo a referência a uma «marcação "serrada"» (ver imagem ao lado).
A comunicação em linha permite a correção, e na esperança de que este reparo surta algum efeito, convém lembrar que serrar não é o verbo adequado ao contexto em causa, no qual deveria ter sido escrito o verbo cerrar com c – portanto, «com marcação cerrrada», e nunca «com marcação serrada».
Cerrar e serrar são verbos homófonos, isto é, pronunciados da mesma maneira, mas bem diversos quanto ao significado e à origem. Vejamos, então. Serrar, de acordo com o dicionário Houaiss, tem origem no verbo latino serro, as, āvi, ātum, āre, que significa «serrar», por sua vez, derivado de serra, ae («serra»); e historicamente atesta-se com formas como sserrar (séc. XIV) e serar (séc. XV). Relativamente ao seu significado, este dicionário define o verbo como «cortar com serra ou serrote, produzir um som semelhante ao da serra ou do serrote em ação, conseguir algo gratuitamente com habilidade» (regionalismo brasileiro informal), ou «dividir cartas de baralho ou outros jogos em grupos ou montes (ludologia)».
Quanto a cerrar, tem origem no espanhol cerrar (1140), que, por sua vez, vem do latim tardio serāre, de sera («fechadura, ferrolho, aldrava»); historicamente atesta-se como formas como cerrar e sarrar (séc. XIII), çarar (1390) e carar (séc. XV) (ibidem). Quanto à sua significação, usa-se com o sentido de «unir partes e impedir a passagem de ar, luz ou pessoas; bloquear ou obstruir uma abertura; apertar ou pressionar algo; cobrir ou resguardar; dar-se por encerrado; concluir ou finalizar algo; cicatrizar-se; convergir para um ponto; adensar-se ou acumular-se; tornar-se enevoado; travar combate; alcançar o desenvolvimento completo dos dentes (hipologia); e, na marinha, mover o leme para um dos lados e aproximar o poleame aos teques ou estralheiras.»
Portanto, para evitar confusões e garantir que o futebol permaneça livre de ferramentas de carpintaria, é importante usar o verbo correto. No caso da «marcação cerrada» a Pedro Gonçalves, é melhor deixar os serrotes fora do campo e lembrar que cerrar é o verbo adequado para descrever uma defesa firme e impenetrável.