«O chefe do auto-proclamado* Estado Islâmico para o Afeganistão e Paquistão foi morto o mês passado, divulgou o Pentágono, acrescentando que Hafez Saif morreu na província afegã de Nangarhar.
Esta morte, que ocorreu a 26 de Julho, constitui um revez** para o grupo jihadista*** que se tenta implementar**** com mais força, naqueles dois países, continua o porta-voz do Pentágono, citado pela AFP.
Hafez Saif era conhecido por, embora fosse um líder, participar directamente nos ataques contra as forças de coligação.
Recorde-se que em Maio,***** o chefe dos talibãs afegãos, Akhtar Mansour, foi morto por um drone norte-americano, no Paquistão.»
[in jornal Público de 13/08/2016]
Até é bem possível que a notícia acima transcrita corresponda, ipsis verbis, ao original recebido de um qualquer despacho de agência. Seja como for, é no mínimo surpreendente a ausência de qualquer cuidado editorial na publicação de tantos erros (primários) em tão poucas linhas. Mais estranho, ainda, por acontecer precisamente no jornal que fez do Acordo Ortográfico a fonte de todos os atropelos à língua portuguesa. A verdade é qualquer destes contende com a própria norma tão arreigadamente seguida no jornal. Fora os outros, bem piores, que nada têm que ver com as novas ou antigas regras da ortografia. Apenas, e só, défice do português básico.
* As regras para o uso do hífen em palavras compostas com o falso prefixo auto mantêm-se desde a norma de 1945. Portanto, sempre foi assim e assim se deve continuar a escrever: autoproclamado. Cf. Prontuário Actual da Língua Portuguesa. Guia Alfabético. Edições Asa, 1.ª edição, p.230] + O AO de 1990, no ponto 1 da sua Base XVI: Do hífen nas formações por prefixação, recomposição e sufixação, que regula exatamente o mesmo: as palavras compostas com o prefixo auto apenas levam hífen quando o segundo elemento elemento for iniciado por o (auto-observação) ou por h (auto-hemoterapia). Quando o segundo elemento começa por r ou s, verifica-se a duplicação dessa consoante (autorretrato, autosserviço). No resto dos casos, procede-se à aglutinação (autoestrada, autoaprendizagem, autopreparação, autoproclamado).
** É revés, e não “revez”. Revés = «contrariedade; infortúnio; fatalidade; acontecimento imprevisto que reverte uma coisa boa para má» entre outros significados. Revez = «iteração da vez, repetição de um evento» (in Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa).
*** Desde a primeira reforma ortográfica do português, em 1911, que deixou de se usar o h medial etimológico entre vogais. Há cem anos é que, por exemplo, se escrevia ahi, coherente, inhibir, exhortar, prohibir ou sahir. Assim continuou com a reforma de 1945 e assim se manteve, obviamente, com a atualmente em vigor no país. Não obstante isso, o “Público” teima em ser dos raros jornais portugueses na preferência pela anómala forma "jihadista".
**** Implementar já é aquele neologismo que serve para tudo e para nada, em especial para um certo discurso estereotipado e à míngua de um léxico minimamente diversificado. Só faltava mesmo darem-lhe, agora também, o sentido do verbo implantar (= «enraizar-se»).
***** Erro de pontuação na frase: faltou a vírgula a seguir ao pronome que, a qual, em conexão com a vírgula à direita de «em Maio», permite assinalar a intercalação deste sintagma preposicional [nota alterada em 30/08/2016, na sequência de um reparo feito pelo consulente Jorge Baptista na página do Ciberdúvidas no Facebook].