O grande argumento (que não é necessariamente a favor, mas simplesmente realista) é que Portugal já não pode recuar num acordo que já assinou, e que agora só tem que ratificar. O que dizem os seus defensores?
É o acordo possível
Este é, com as diferenças que consagra, o acordo possível neste momento histórico, diz Malaca Casteleiro, linguista da Academia das Ciências de Lisboa e um dos responsáveis pelo Acordo Ortográfico (está ligado ao processo desde 1986). «A unificação absoluta [da grafia] tentou-se em 1945 e impunha ao Brasil o ponto de vista de Portugal [impunha, por exemplo, as consoantes mudas que o Brasil não usava], e é evidente que o Brasil não acatou.»
O acordo estabelecido em 1990 é "realista". «Ficamos com uma ortografia tão unificada quanto possível, sendo que é fácil memorizar os casos em que há dupla ortografia ou acentuação», refere Malaca Casteleiro.
Facilita a aprendizagem e a comunicação
O acordo aproxima a escrita da fala. «Seguiu-se o critério da pronúncia em detrimento do critério etimológico», explica Malaca Casteleiro. «Há certos casos, como a palavra "característica" em que há pessoas que pronunciam o c e outras que não. Se se consagrar a escrita opcional, não vem daí mal ao mundo.» (Graça Moura, num artigo recente no Diário de Notícias, contestava esta regra, afirmando que «o c que querem suprimir [...] é quase sempre essencial para abrir a vogal que o antecede», como em acção, e que tirá-lo afecta a pronúncia da palavra).
Esta aproximação entre a forma de dizer e escrever facilita a aprendizagem, segundo Malaca Casteleiro. José Eduardo Agualusa afirma que essa é, aliás, uma das grandes vantagens deste acordo para a alfabetização, que é uma das grandes prioridades dos países africanos.
Outra vantagem, dizem os defensores do acordo, como o especialista em assuntos africanos Jonuel Gonçalves (num artigo publicado há dias no "Publico"), é, por exemplo, permitir que em cimeiras internacionais com países lusófonos os textos tenham uma redacção única, «evitando-se situações, como ocorreu numa cimeira [da CPLP], em que foram exigidos dois textos de resolução final... na mesma língua». Jonuel Gonçalves lembra ainda que «a língua evolui», apesar dos nostálgicos de palavras como pharmacia, telephonico ou commércio. «Já D. Dinis teve que enfrentar narizes torcidos dos tracionalistas quando oficializou a língua em detrimento do latim», escreve.
Não podemos ficar de fora
É tarde para sair do comboio. Esta é, para Francisco José Viegas, escritor e director da Casa Fernando Pessoa, uma das grandes razões para se avançar para o acordo. «É verdade que os brasileiros se prepararam. Nós não tivemos nenhuma política de defesa da língua, não tivemos uma política de expansão da língua no estrangeiro, não fizemos o trabalho de casa. Não vale a pena ser conservador quando não há nada a conservar.»
Os brasileiros, diz, «têm cada vez mais gente em Angola, em Moçambique, e mais cedo ou mais tarde vão ser eles a locomotiva». Dá como exemplo Maputo, «onde as aulas de Português para estrangeiros são dadas pelo Centro Cultural Brasileiro».
Viegas pensa que perdemos 17 anos, quando nos poderíamos também ter preparado, a nível editorial, para um acordo que, desde que foi assinado por Portugal, era uma inevitabilidade. «Tivemos 17 anos para discutir, e ninguém quis discutir.» Além disso, argumenta ainda, chegámos a um ponto em que «o português já não nos pertence» e por isso temos toda a vantagem em «discuti-lo com quem o fala» — nomeadamente os 180 milhões de brasileiros.
*in "Público", de 29 de Novembro de 2007