Em português, do ponto da referência temporal, o pretérito perfeito pode ter dois valores:1
a) uma ação num tempo bem determinado e já acabado: «na década passada, os sindicalistas pediram (...) que garantisse...»
b) uma ação passada e perfeita mas num determinado período cronológico que ainda não findou: «hoje/esta semana/este ano os sindicalistas pediram (...) que garanta...»
Deste modo, não há qualquer violação da sequencialização dos tempos verbais (cf. M.ª Helena Mira Mateus et al. Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa, Editorial Caminho, 2003, págs. 173-178). Pelo contrário, a concordância existe, porque se faz em função de valores diferentes do pretérito perfeito simples.
1 Para a identificação destes dois valores, baseio-me no artigo de Roberto Ceolin, Falsos Amigos Estruturais: Entre o Português e o Castelhano, que compara o pretérito perfeito simples e composto do português com os do castelhano normativo da Península Ibérica. Os dois valores aparecem marcados por tempos diferentes no castelhano: a ação num tempo determinado, pelo simples; a ação acabada no tempo da enunciação, pelo composto:
[Se] duas acções coexistem numa mesma frase, o composto serve para enunciar aquela que estiver mais próxima do momento de enunciação:
1. Ayer comí en casa pero hoy he comido en el restaurante aquí al lado
Em relação ao momento de enunciação ambas as acções são pretéritas, mas uma se relaciona com ayer e outra com hoy. A mesma frase em português seria:
2. Ontem, almocei em casa mas hoje almocei no restaurante aqui ao lado
Ambas formas castelhanas — simples e composta — são equivalentes a formas simples em português.