László Krasznahorkai ganhou o Prémio Nobel de 2025, e, em Portugal, os profissionais dos media devem ter sentido alguma perplexidade quanto à maneira mais adequada de pronunciar o nome do escritor1.
Nas redes sociais e no jornal Observador, o tradutor e divulgador de temas linguísticos Marco Neves deu uma boa ajuda, assinalando que, em húngaro, <sz> se pronuncia /s/, ou seja como o <s> de sala e os <ss> de massa ou, ainda, o ç de caça e o c de cinto e acento.
Já ao encontro dos perfecionistas, pode-se acrescentar que, em húngaro, os acentos agudos marcam vogais longas – á, ó – por oposição às vogais breves – a, o –, que não se acentuam. Além disso, o <h> é consoante aspirada de modo aproximado ao do h do inglês hot; e, curiosamente, o encontro vocálico <ai> é articulado não com o ditongo ai (como o que ocorre em pais) mas com duas vogais, cada qual na sua sílaba (um pouco como acontece com país). Só mais um pormenor: as palavras húngaras têm acento tónico na primeira sílaba de palavras simples e compostas, nestas últimas ocorrem acentos secundários. Assim, no caso em questão, o primeiro nome, László, tem o acento tónico na primeira sílaba (Lá-), e, em Krasznahorkai, o acento principal também recai na primeira sílaba (Kra-) e ocorre um acento secundário na sílaba -hor-.
Observe-se, como curiosidade, que a comunicação social de Portugal não parece ter-se preocupado muito em propor uma representação escrita da pronúncia do nome húngaro, ao contrário de algumas publicações do Brasil, que ensaiaram representações aproximadas da prolação húngara1:
(1) «László Krasznahorkai, cujo nome se pronuncia "láslo crasnarrorcaí" [...] (Folha de S. Paulo, 09/10/2025)
(2) «No caso de Krasznahorkai – se seu húngaro estiver enferrujado, o nome se pronuncia “crasnarrórcai” [...].» (Superinteressante, 09/10/2025)
Para o público de Portugal, podem parecer estranhos os <rr> nas figurações fonéticas em (1) e (2), mas lembrando como muitos falantes, sobretudo mais jovens, atualmente articulam o r forte de rápido e carro em Lisboa ou no Porto, talvez não estejamos assim tão longe do h aspirado que se pretende sugerir. Seja como for, o certo é que, com este nome, a língua húngara volta a chamar atenção e revela traços fundamentais da sua fonologia, bastante diferente da do português.
O interesse do nome do escritor não fica pela fonologia, pois, contextualizando-o, descobrem-se ainda algumas curiosidades já de ordem cultural. Uma delas é a particularidade de, ao contrário do português e de outras línguas, os nomes próprios se disporem pela ordem apelido-nome próprio, pelo que László Krasznahorkai é sempre Krasznahorkai László na Hungria. O segundo aspeto diz respeito ao nome nacional ou gentílico, pois húngaro tem um sinónimo, magiar. Como já foi explicado no Ciberdúvidas (ver Abertura de 01/04/2022), magiar adapta a palavra húngara magyar (soa aproximadamente como "mádiar") é o nome que os húngaros se dão a si próprios, portanto, um endónimo, cujo significado etimológico será «pessoa». Húngaro vem do nome que os povos europeus atribuíram (exónimo) quando, no século X, os Húngaros conquistaram a antiga Panónia, onde fica a atual Hungria, para daí atacarem várias regiões europeias. Geralmente, dizia-se que húngaro se relacionava com huno, porque se supunha que os Húngaros eram descendentes dos terríveis Hunos do século V, relação que os estudos históricos vieram a rejeitar.
A língua húngara é um tema fascinante e a Hungria, por distante que pareça, tem, desde há séculos, mantido contacto com territórios onde se fala português, incluindo, claro, Portugal. Mais oportunidades surgirão para falar aqui de muitas outras dimensões da língua e cultura húngaras, mas, como sinal dessa proximidade histórica, fica o registo da participação do autor premiado em 19/10/2025, pelas 17h00 (mesa 15), na edição de 2025 do festival literário FÓLIO 2025, que se realiza todos os anos em Óbidos.
1 Na imagem, capa da 1.ª edição (1989) de Az ellenállás melankóliája (A Melancolia da Resistência), de László Krasznahorkai.
2 Para ouvir o nome do escritor dito por falantes de húngaro, consultar aqui a plataforma Forvo.