Tem muita razão na dúvida que apresenta. E é tão difícil responder — responder certo! Conseguirei? E tal dificuldade é devida àquela particularidade a que a nossa prezada consulente se referiu, quando perguntou: «Mas a lógica da matemática é a mesma da língua?».
A lógica da matemática é a lógica do pensamento; e, no seu desenrolar, segue, determinado caminho.
A lógica da linguagem é também a lógica do pensamento; mas, no seu desenrolar, segue, por vezes, caminho diferente. Seja a seguinte frase:
1) Fulano teve morte feliz.
Onde está a lógica? Alguém poderá conceber uma morte feliz ou infeliz?
Analisando esta frase com lógica matemática, isto é, observando o significado de cada palavra e «somando-as», isto é, ligando-as na sua sequência, estamos em presença duma frase sem nexo, inteiramente ilógica, sem pés nem cabeça. Esta frase, dita «matematicamente» certa, seria assim, por exemplo:
2) Fulano foi feliz na morte que teve.
Quase o dobro das palavras da frase 1):
Na lógica da linguagem, seguimos caminho diferente: interpretamos a frase na sua globalidade, e não considerando palavra por palavra.
O ser humano é senhor de vários saberes. E assim, há o saber da matemática, o da medicina, o do comércio, o da carpintaria, etc. E cada saber, ou, se preferirmos, cada actividade tem a sua linguagem comum, a do dia-a-dia;
De facto, na linguagem da matemática, o vocábulo vezes só se usa no sentido da «adição» ou de «vezes maior».
Mas consideremos agora a linguagem comum. Suponhamos duas distâncias:
A —— B = 1 metro
C ——————— D = 5 metros
Se é que não é erro na linguagem da matemática (já lá vão umas dezenas de anos dessa escolaridade), dizemos que a distância de C a D é cinco vezes maior que a distância de A a B. Logicamente, diremos que a distância de A a B é cinco vezes menor do que a distância de C a D — isto, na linguagem coloquial, evidentemente. E dizemos menor, porque este vocábulo é o antónimo de maior. E é essa antinomia que se pretende evidenciar.
Parece, pois, que na linguagem coloquial (ou comum) podemos empregar à vontade, vontadinha, «tantas vezes menor». Ou, se quisermos, «tantas vezes mais pequeno/a».
Empregar uma ou outra linguagem depende, apenas, da intenção ou necessidade do emissor: rigor ou não rigor matemático.