Na verdade, «deixar-se submergir» é uma frase constituída por duas orações: uma subordinante, «deixar-se», e uma subordinada, «submergir».
O sujeito de «deixar-se» é nulo, uma vez que o verbo é empregado no infinitivo impessoal (não flexionado). Em casos como este, há gramáticos (ver M. H. M. Mateus et alii, Gramática da Língua Portuguesa, 2003, pág. 825) que consideram que o infinitivo faz parte de uma oração cujo sujeito não é realizado, muito embora, numa análise mais profunda, exista tal constituinte pelo facto de verbos como deixar terem normalmente sujeito (isto é, seleccionam um argumento externo, não sendo como o verbo chover; cf. idem). Diz-se então que essa posição de sujeito, ou para sermos mais rigorosos, esse lugar argumental é ocupado por um pronome nulo que tem interpretação arbitrária. Deste modo, uma interpretação possível de «deixar» como predicado de uma oração de infinitivo é «alguém deixar».
Quanto ao pronome se, trata-se de um pronome reflexo que remete para o sujeito indeterminado associado a submergir. Esta análise torna-se mais clara se parafrasearmos «deixar-se submergir» como «deixar alguém submergir». Repare-se que se trata de um sujeito indeterminado marcado por se e não de um sujeito realizado por ele, o que permite que «deixar-se submergir» seja parafraseado por «deixar que se submerja». Inferimos que o sujeito é se e não ele por causa do contexto em que a estrutura em análise ocorre: logo a seguir na citação, em «quando se está doente», encontramos um se indeterminado.
Ora bem, o verbo deixar, que é um verbo causativo, constrói-se com uma oração completiva de infinitivo. O sujeito desta oração é realizado como complemento directo do próprio verbo deixar; daí a equivalência entre os exemplos (1) e (2), que mostram que o sujeito «o submarino» pode assumir a forma pronominal de complemento directo:
(1) O comandante deixou o submarino submergir.
(2) O comandante deixou-o submergir.
Se a construção de se indeterminado estiver associada ao infinitivo impessoal da oração completiva de deixar, observa-se que o se indeterminado passa a ser realizado por um se reflexo, ligando-se ao próprio verbo deixar:
(3) Às vezes, é preciso deixar-se submergir.
Eu diria que o que ocorre em (3) é muito semelhante ao que acontece em (4) e (5), a seguir:
(4) eu deixo-me submergir
(5) ele deixa-se submergir
Em (4) e (5), vemos que, quando o sujeito de deixar e o da oração subordinada completiva são correferentes, o sujeito da segunda só poderá ter a forma de um pronome reflexo. Me e se são, portanto, pronomes reflexos que realizam como complemento directo o sujeito de submergir. Do mesmo modo, para o caso de «deixar-se submergir», sugiro que o pronome que é no fundo o sujeito de submergir terá de ser reflexo, na terceira pessoa, que é a que aparece necessariamente nos próprios infinitivos impessoais dos verbos usados na conjugação pronominal reflexa (p. ex., lavar-se).
Esta análise só é possível se considerarmos que há diferentes níveis de
organização sintáctica, um à superfície e outro em profundidade. Significa isto, quanto a mim, que a gramática tradicional tem enorme dificuldade em dar conta deste tipo de estruturas e que é necessário lançar mão de outras propostas teóricas.
Nota: Esta resposta foi amplamente reformulada depois de o mesmo consulente a ter contestado. Agradecendo as observações feitas, espero ter sido agora mais claro, com a consciência de que se trata de um caso com alguma complexidade, que terá certamente outras interpretações.