As atentas observações do consulente e as perguntas e as respostas em causa mostram que a conjunção ou é ambígua: tem dois valores, inclusivo e exclusivo. A sequência e/ou acaba por revelar-se inequívoca, porque evita a ambiguidade de ou, por exemplo, num contexto como o seguinte:
(i) As portas foram pintadas a verde ou a vermelho.
Em (i), são possíveis duas interpretações (cf. John Lyons, Semantics, Cambridge, Cambridge University Press, 1977, pág. 144):
a) inclusiva, quando a frase (i) é sempre verdadeira, tenham as portas sido pintadas só a verde, só a vermelho ou a verde e vermelho simultaneamente;
b) exclusiva, se for verdade que as portas foram pintadas a verde mas não a vermelho ou vice-versa.
Dada a ambiguidade de ou nos planos lógico e semântico, percebe-se que a expressão e/ou se torna mais clara, já que representa apenas o valor inclusivo de ou. Cabe, porém, referir que este ou outros pareceres serão sempre controversos, porque o próprio modelo de e/ou, que é and/or, tanto tem defensores como tem detractores no próprio mundo de língua inglesa. Sem querer e/ou poder ir mais longe, deixo a tradução de algumas linhas de uma página da Internet a propósito dessa controvérsia:
«No seu excelente livro The Language of Judges [= A Língua dos Juízes] (Chicago 1993), Larry Solan (que é linguista e professor de Direito) dedica catorze páginas à "regra do and/or" como é usada no contexto jurídico, assinalando que os comentadores de estatutos que se têm deparado com usos jurídicos de and [=e], or [=ou] e and/or [=e/ou] dizem que esta expressão tem fama de vaga e inexacta.
Pareceria que Geoff Pullum tem razão quando diz: "A teoria certa do que or [= ou] significa em inglês é que, geralmente, é inclusivo mas por vezes o caso exclusivo é comunicado como uma implicatura conversacional.»1 2
1 No original, em inglês, disponível em http://languagelog.ldc.upenn.edu/nll/?p=47 (consultado em 7/01/09): «In his excellent book, The Language of Judges (Chicago 1993) Larry Solan (who is both a linguist and a law professor) devotes 14 pages to "the and/or rule" as it is used in the legal context, noting that commentators on statutes who have encountered the legal uses of and, or, and and/or say that this expression is notoriously loose and inaccurate.
[...] It would seem that Geoff Pullum is quite right when he says: "The right theory of what or means in English is that it is in general inclusive but that sometimes the exclusive case is conveyed as a conversational implicature."»
2 Sobre implitação ou implicatura, leia-se a definição José Pinto de Lima, em Pragmática Linguística (Lisboa, Editorial Caminho, 2006, pág. 108):
«"Implicitar algo" contrasta com "dizer algo": se X disser a Y "Já não te via há séculos!", X não quer dizer literalmente o que disse, mas — através dessa enunciação — implicita o que quer dizer (i. e., que já não via Y há bastante tempo). Literalmente, a enunciação de X infringe o princípio de cooperação e, mais espcificamente, a máxima conversacional da Qualidade, "Não digas o que crês ser falso!" Mas como Y crê que X continua a querer cooperar na conversação, Y toma a infração à máxima da Qualidade como um meio de que X se serve para introduzir uma implicitação, que compete a Y descobrir. Implicitação tanto pode designar o acto de implicitar como o produto desse acto, i.e., a proposição implicitada. Ambas as coisas também podem ser designadas por implicatura, embora este termo designe preferencialmente o produto do acto.»