O Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa (DA) explica que sequer se usa «com valor enfático em contexto negativo ou em orações condicionais, sendo parafraseável por "nem que seja/fosse", "(nem) ao menos"». Também o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (DH) indica que uma das acepções de sequer corresponde a «pelo menos» e «ao menos», apresentando como atestação um contexto em que ocorre a negação («não vai sequer comer a sobremesa?».
Na frase apresentada pelo consulente, sequer não ocorre nem em contexto negativo nem dentro de uma oração condicional. Não temos, portanto, a possibilidade, pelo menos em português europeu, de substituir «ao menos» por «sequer». Esta substituição seria aceitável, de acordo com o DA, se a oração condicional exprimisse uma situação imaginária, como na sua adaptação em (1):
(1) Se continuassem sequer a existir zonas obscuras, poderíamos reflectir sobre a combinação explosiva entre a ética e o realismo, naquele 2 de setembro de 1939.
Ora sucede que o DH inclui, entre as acepções de sequer, uma que é classificada como arcaica, a de «ainda»: «ademais, vamos circundar sequer o istmo.»
Recuando no tempo, sabe-se que sequer (ou siquer significava em português antigo «pelo menos, até mesmo» (Joseph Huber, Gramática do Português Antigo, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1984, pág. 258), podendo inclusivamente ser usado em contextos afirmativos, ao que parece, com função conjuncional e com valor concessivo: «siquer [=embora] meus olhos verdes son» (cf. Carolina Michaëlis de Vasconcelos, "Glossário do Cancioneiro da Ajuda" in Revista Lusitana, XXIII, 1920, pág. 85).
Estes dados sugerem, portanto, que sequer já teve valores próximos dos da locução ao menos mesmo em contexto afirmativo. Actualmente, não é assim: a relutância do consulente em usar sequer na frase em causa é bem indicativa da evolução semântica deste advérbio.