A sua pergunta, prezado consulente, foca dois aspectos próximos, mas distintos.
Por um lado, com lavo-me, ilustra, através de uma construção reflexiva, o caso de verbos que podemos chamar genericamente pronominais, ou seja, o caso em que o verbo surge associado a um pronome pessoal clítico, que tem a particularidade de estar sempre na mesma pessoa em que está o sujeito – eu lavo-me; tu lavas-te, etc.
Por outro lado, com lavo-te, ou seja, «Eu lavo-te, ilustra situações em que o complemento directo de um verbo pode ser substituído por um pronome que não equivale à pessoa do sujeito, mas, sim, a uma outra entidade.
O facto de o pronome reflexo e o não reflexo serem iguais na primeira e na segunda pessoa pode causar alguma confusão. A dificuldade de exemplificação é ainda maior no caso da segunda pessoa, pois dificilmente se substitui o pronome te, num discurso directo, pelo nome da pessoa, a menos que criemos artifícios como «Eu lavo-te a ti, bebé...». Quando o pronome corresponde à terceira pessoa, tudo se simplifica. A frase «Eu lavo o bebé» passa facilmente a «Eu lavo-o». Se se tratar de um verbo pronominal, a forma equivalente à terceira pessoa é se e só pode ser usado em frases cujo sujeito corresponda também a uma terceira pessoa. Assim, aceita-se «Ele lava-se», mas nunca *“Eu lavo-se”.
Os verbos pronominais são referidos nas gramáticas em dois locais distintos, mas que se complementam: enquanto detentores de uma conjugação característica devemos procurá-los nos verbos, mas é, sobretudo, no capítulo referente aos pronomes que as suas especificidades são descritas mais detalhadamente.
Devo dizer, antes de mais, que, se, para simplificar, consideramos pronominais, todos os verbos que se conjugam com um pronome equivalente à pessoa representada pelo sujeito, não é assim que os estudiosos os analisam. Cunha e Cintra, na Nova Gramática do Português Contemporâneo, distinguem verbos reflexivos de verbos pronominais.
a) No primeiro grupo inserem os casos em que o pronome tem conteúdo semântico e se reporta ao sujeito, como em «Eu lavo-me». Eu e me têm um referente, embora seja o mesmo. Alguns destes verbos ocorrem igualmente em conjugações não reflexas.
Fazem, além disso, distinção entre reflexos e recíprocos, ou simétricos. Assim, se em «Eu lavo-me» a acção praticada pelo sujeito recai sobre ele próprio, o mesmo já não se pode dizer em «Eles cumprimentam-se». O segundo exemplo ilustra uma situação em que duas pessoas praticam ao mesmo tempo a mesma acção recaindo o acto de uma sobre a outra e não sobre si próprias.
b) Nos verbos pronominais inserem aqueles cujo pronome não tem significado, fazendo parte intrínseca do próprio verbo, como em «Ele queixou-se do empregado», etc. A este pronome sem valor semântico chamam alguns estudiosos se inerente.