A expressão é usada nos contos infantis, normalmente no final, como uma espécie de lengalenga de remate lúdico: «(...) E entrou por um perna de pato e saiu por uma perna de pinto, mandou El-Rei Meu Senhor, que me contassem cinco... », Francisco Ildefonso (Chico Preto), «Joãozinho e Maria», Praia de Areia Preta. Natal, in CASCUDO, Luís da Câmara. Contos tradicionais do Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1986. pp. 163-5.
No entanto, caiu em desuso, pelo que é difícil atualmente ouvi-la ou lê-la nos contos ou histórias infantis.
Dá-se o nome de parlendas a uma declamação poética para crianças, acompanhada por música (Dicionário Houaiss). Estas criações anónimas fazem, muitas vezes, parte do folclore brasileiro e passam de geração em geração, veículos de uma cultura oral, popular. São versos simples, divertidos, recitados em brincadeiras de crianças cuja finalidade é entreter e distrair, mas também ensinar. Possuem uma rima fácil, ritmada e repetitiva e, por isso, são populares entre as crianças, contribuindo para o desenvolvimento da memorização, da comunicação, da socialização e do raciocínio lógico. São usadas em diversas situações, tais como, brincadeiras de roda, jogos, histórias ou apenas por diversão.
Também se chamam parlandas, parlenga, perlendas ou perlengas.
Lengalengas é ainda outra maneira de dizer a mesma coisa, como atesta o Dicionário Infopédia: texto transmitido de geração em geração, constituído por palavras que geralmente rimam e com muitas repetições, conferindo-lhe um carácter musical que facilita a rápida memorização.
Para além de José Lins do Rego, citado pelo consulente, encontramos a expressão noutros autores, por exemplo em Jorge de Lima, no poema sobejamente conhecido «Essa negra Fulô», em que a voz da negra se faz ouvir, contando uma história a pedido da sinhá:
«[...]
"Era um dia uma princesa
que vivia num castelo
que possuía um vestido
com os peixinhos do mar.
Entrou na perna dum pato
saiu na perna dum pinto
o Rei-Sinhô me mandou
que vos contasse mais cinco". [...]»
Segundo Kathleen Lessa, «PARLENDA [ou parlanda ou parlenga] tem origem em "parolar", "parlar", que significam "falar muito", "tagarelar", "conversar bobagens", "conversar sem compromisso".
É um conjunto de palavras com pouco ou nenhum nexo e importância, de caráter lúdico, muito usadas em rimas infantis, em versos curtos, ritmo fácil, com a função de divertir, ajudar na memorização, compor uma brincadeira.
Pode ser destinada à fixação de números, dias da semana, cores, dentre outros assuntos.» E dá este exemplo, entre outros:
Entrou pela perna do pato,
Saiu pela perna do pinto.
O rei mandou dizer
Que quem quiser
Que conte cinco:
Um, dois, três, quatro, cinco!
Para Regina Antunes Meyerfeld, «a parlenda, por ser lúdica, não traz em si um sentido propriamente lógico, simbólico ou metafórico. Temos uma frase cuja função da linguagem é a de confirmar o processo da comunicação entre o emissor e o recetor. Trata-se de uma função fática, traduzida por uma fala encantatória e convincente. Neste caso, os referenciais "perna do pinto e do pato", com a aliteração do fonema /p/ cria uma redundância que permite cristalizar, eternizar a comunicação.
Finalmente, a gradação entre pato e pinto é crescente ou decrescente, se pato ou pinto iniciam a parlenda.»¹
Esperamos ter deslindado a dúvida do consulente.
¹Repare-se que aparecem as duas cantilenas:«E entrou por uma perna de pato e saiu por uma perna de pinto» e «E entrou por uma perna de pinto e saiu por uma perna de pato».
N.E – Os nossos agradecimentos aos prfessores brasileiros Eliene Zlatin, Luciano Eduardo de Oliveira e Regina Antunes Meyerfeld o contributo para esta resposta.