Matematicamente, quando dizemos que temos de pagar duas vezes mais, além do seu valor inicial (a somar ao que era), por um artigo que custava x, isso significa, de fa(c)to, que o seu preço final será x+2x=3x.
Só que, por um lado, não é legítimo aplicar a matemática à língua: aquela é uma ciência exacta; esta, um conjunto arbitrário de convenções. Por outro lado, na expressão `um certo artigo custa duas vezes mais´, a ideia com que se fica, no uso da língua, é que o advérbio `mais´ não implica um custo `a somar´, mas simplesmente que na predicação estamos implicitamente a fazer `uma comparação´ entre um custo que é agora (2x) em relação ao que era (x). O advérbio neste caso é só expletivo, sublinhando o facto de se ter aumentado, não diminuído: `custa duas vezes (mais e não menos)´. É expletivo, porque, quando não houver dúvida, a expressão mais simples `isto custa duas vezes´ é suficiente para significar o dobro. Não obstante a minha falta de tempo actual, ocorre-me ainda o seguinte:
Repare, companheira de estudo, que se a frase fosse `custa duas vezes menos´, a ideia só podia ser que o custo final seria metade, pois se fosse duas vezes a subtrair, seria matematicamente x-2x=-x, ininteligível no uso pragmático da língua.
Ora este último exemplo mostra bem que a linguagem é uma utilização de códigos entre os falantes. Códigos que têm de ser dominados para que todos se entendam na comunidade que os utiliza.
Mas mostra também que a língua não se compadece com axiomas. E lembra-me sempre que devo respeitar o tumultuar criativo da voz do poeta, aparentemente sem regras, quando o `ainda misterioso´ espírito humano usa a transcendente liberdade da palavra para comunicar o inconsciente.