Há realmente um grande desconhecimento em Portugal acerca das afinidades linguísticas com a Galiza. Perante um falante de galego, é típico um português tentar falar castelhano, muitas vezes porque não reconhece o que ouve como língua ainda muito próxima da que fala a sul do rio Minho. Lembro-me, por exemplo, de que, durante a crise do Prestige no final de 2002, os noticiários portugueses normalmente legendavam as respostas das entrevistas feitas aos habitantes do litoral galego; muitos deles falavam um galego que, apesar da “geada” (troca do "g" por um som parecido com o "jota" castelhano), tinha uma entoação familiar para ouvidos portugueses. Este comportamento dos canais de televisão em Portugal parecia obedecer ao atavismo de considerar castelhano tudo o que se fala para lá da fronteira. Penso ainda que a identidade galega nem sempre é clara para o português médio ou popular. Assim, é curioso que, dialectalmente, nem sempre um galego é apenas um habitante da Galiza. Por exemplo, no Alentejo um galego pode ser um natural das Beiras (Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa). E suspeito que no Norte e no Centro de Portugal, em algumas regiões que não fazem fronteira com a Galiza, um zamorano, um salmantino ou até um estremenho de Cáceres – não sei se de Badajoz – sejam todos galegos (o que pode ter alguma verdade histórica em casos como os de San Martín de Trevejo, Valverde del Fresno e Eljas). É claro que também acontece que alguns (ou muitos?) portugueses ficam baralhados quando começam a ler o que se escreve a norte do Minho. É como se dissessem: «o que se passa, que os espanhóis andam a escrever num português estranho?» Recordo que há cerca de dez anos se dedicou um excelente número da revista Colóquio Letras (Fundação Calouste Gulbenkian) à cultura galega. Nele, a prof.ª Pilar Vázquez Cuesta abordava justamente o desconhecimento com que os portugueses (quase sempre não académicos, mas também há académicos) costumam “brindar” os galegos, quando se trata de falar dos laços comuns. Para esta situação contribui certamente o facto de a História ter dificultado desde muito cedo a descoberta ou o reforço desse elo: quando, com D. Dinis, os documentos notariais portugueses passaram a ser escritos na língua que se desenvolvera no Noroeste da Península e a que historicamente poderíamos chamar galego, o reino de Portugal já existia há mais de um século. Assim, ao querer dar nome ao “galego” que se falava do Minho ao Algarve, esse nome foi muito logicamente português, visto que se estava a designar o idioma do Reino de Portugal e do Algarve. Explica-se, deste modo, que se fale em português antigo, não porque se negue a relação ou mesmo a identificação com o galego, mas talvez porque se pensa que o Condado e, depois, Reino de Portugal é que deu consciência idiomática colectiva a uma parte dos dialectos galegos – os que eram falados pelos portugueses. Sobre este assunto, recomendaria uma obra que dedica alguns capítulos ao problema da designação da língua na faixa ocidental da Península: Ramón Mariño Paz, Historia da Lingua Galega, Santiago de Compostela, Sotelo Blanco, 1998.