A linguagem publicitária é prenhe de duplos (e triplos!) sentidos.
As frases em apreço integram um conjunto maior de situações, ou previsão de situações, em que a primeira parte difere, e a segunda («Quando esse dia chegar, não lhe fales») se repete, tal como se repete o apelo «Mantém-te original».
No caso da frase que se repete, gramaticalmente, porque a presença de um pronome exige a ocorrência do seu antecedente, ou seja, do nome a que se refere, o pronome lhe reporta-se a, ou substitui, «esse dia».
No entanto, importa ter em conta que, face ao uso que fazemos da nossa língua, existem dois tipos de criatividade:
a) A criatividade linguística, comum a todos nós, que nos permite fazer frases novas nunca antes ditas ou escritas, obedecendo a todas as regras intrínsecas da gramática;
b) A criatividade artística (literária ou publicitária), que vive, muitas vezes, de segundos sentidos, da exploração de aspectos marginais às regras gramaticais. Nem todos conseguem este tipo de efeito.
Nas frases «Um dia vais achar que sair à noite é ir deitar o lixo fora. Quando esse dia chegar, não lhe fales», há recurso aos dois tipos de criatividade. São duas frases correctas do ponto de vista gramatical, ou sintáctico. Do ponto de vista do referente real, ou seja, da realidade a que se reportam, é que surgem interpretações diversas. Literalmente, ou seja, à luz da criatividade linguística, o lhe reporta-se como já referi a «esse dia», único nome existente na frase e susceptível de ser substituído por pronome. No entanto, essa associação é estranha, uma vez que, no mundo real, os dias não são entidades que possam ser interlocutoras numa conversa. Do ponto de vista da criatividade artística, parece-me que a frase «não lhe fales» não pode ser entendida à letra. Antes, importa ter em conta em que situações reais se poderia utilizar uma frase como «não lhe fales». Não falamos a pessoas/entidades com quem não mantemos uma boa relação, ou a pessoas/entidades que não têm nada que ver connosco, com as quais nos não preocupamos e pelas quais nada mudaríamos na nossa vida. Creio que esta seria uma interpretação possível. Não falar aos dias seria, assim, não alterar nada por causa deles, mantendo tudo como anteriormente. Essa ideia é reforçada pela frase «Mantém-te original».