Segundo o Dicionário Terminológico (DT), o complemento do nome (ou complemento nominal) é «seleccionado por um nome [podendo] ser um grupo preposicional [...] ou, menos frequentemente, um grupo adjectival [...]. Os complementos do nome são sempre de preenchimento opcional». Assim, são apresentados os seguintes exemplos:
(a) [A ideia [de que o João aceitaria o lugar]] é absurda. ([de que o João aceitaria o lugar] é o complemento do nome ideia no grupo nominal [a ideia de que o João aceitaria o lugar])
(b) [A construção [do edifício]] parece-me difícil. ([do edifício] é complemento do nome construção no grupo nominal [a construção do edifício])
(c) [A pesca [baleeira]] tem vindo a aumentar. ([baleeira] é o complemento do nome pesca no grupo nominal [a pesca baleeira])
(d) [A oferta [de livros] [às bibliotecas escolares]] é importante. ([de livros] e [às bibliotecas escolares] são complementos do nome oferta no grupo nominal [a oferta de livros às bibliotecas escolares])
Como complemento da informação veiculada pelo DT, será também de todo o interesse, creio eu, ler esta resposta de Edite Prada, que clarifica de forma exemplar alguns aspectos mais polémicos e cinzentos associados à definição de complemento do nome, nomeadamente no que diz respeito à difícil destrinça entre as características deste e as do modificador restritivo.
Dito isto, julgo que facilmente se perceberá que, na frase concreta em análise, o constituinte «em suas funções» dificilmente poderá ser considerado complemento do nome, pois, neste caso, «incapaz» é, do ponto de vista morfológico, um adjectivo e não um nome1, desempenhando, sintacticamente, a função de predicativo do complemento directo, gerado, digamos assim, pelo verbo transitivo-predicativo «considerar»2. No fundo, o adjectivo «incapaz» está a predicar3 algo acerca do complemento directo «técnico».
Assim, dependendo do grau de profundidade da análise que levarmos a cabo, podemos considerar o constituinte «incapaz em suas funções» apenas um predicativo do complemento directo, como podemos também esmiuçar um pouco mais, considerando «em suas funções» um modificador, visto que a sua ausência não torna o enunciado agramatical: «Os torcedores consideram o técnico incapaz (em suas funções).»
No que diz respeito à formulação «incapaz em suas funções», concordo com as conclusões do prezado consulente, isto é, não encontrei em nenhum dos instrumentos linguísticos consultados (portugueses e brasileiros) o contexto «incapaz + em». O Dicionário Houaiss, por exemplo, acolhe apenas «incapaz + de», e os corpora CETEMPúblico e CETENFolha (Folha de São Paulo) apresentam apenas as ocorrências «incapaz + de» e «incapaz + para», em sintonia aliás com Bechara (já citado pelo consulente). Ex.: «A Casa Branca parece ser incapaz de oferecer ao povo americano a verdade»; «Complementar a vontade do réu, relativamente incapaz para decidir sozinho sobre os seus próprios atos.».
Deste modo, no que se refere à frase em apreço, seria talvez mais avisado optar por uma formulação do tipo «Os torcedores consideram o técnico incapaz de exercer [as] suas funções» ou «Os torcedores consideram o técnico incapaz para [as] suas funções».
1 A palavra incapaz pode, em certos casos, ser um substantivo de dois géneros: Ex.: «faz tudo errado, é um incapaz» (Dicionário Houaiss). Porém, não é manifestamente o caso do «incapaz» em análise. Neste caso, trata-se de um adjectivo de dois géneros.
2 Para além de considerar, o DT elenca como verbos transitivos-predicativos achar, chamar, julgar, tratar, eleger, nomear. Mateus e outros (Gramática da Língua Portuguesa, 2003, p. 297) identificam ainda como transitivos-predicativos os verbos classificar e tomar.
3 Atribuição de uma propriedade a uma entidade ou estabelecimento de uma relação entre entidades (cf. DT e Mateus e outros, op. cit., p. 182).