Na literatura, foi criado o discurso indireto livre, para que se tenha a liberdade de misturar discurso direto e indireto sem necessidade de travessão ou aspas. Ora, a ausência destes sinais gráficos de pontuação é o sinal de que o autor está a usar o discurso indireto livre, para que o leitor esteja atento à distinção. Muitas vezes, porém, a liberdade é tal, que o leitor fica confundido. Temos exemplos típicos na literatura dos nossos dias, com autores que me dispenso de citar porque não sou crítico literário e todos os viandantes da escrita me merecem respeito.
No caso em apreço, deseja-se distinguir o discurso direto do indireto, dado que foi usado o travessão. Nestes casos, põe-se o problema de haver necessidade de se cumprirem as regras. Caso contrário, a confusão pode ainda ser maior.
Analisemos cada uma das frases em apreço:
A «– Nem desses plenários tive conhecimento. – Garanti. – Nada tenho a ver com isso.»
O primeiro travessão introduz o discurso direto na narrativa, o segundo passa à narrativa e o terceiro volta ao direto.
O que um dos meus mestres na língua me ensinou é que, se na escrita dum diário pode não haver grande preocupação com as interpretações erradas, normalmente esta preocupação é fundamental para que a mensagem seja exatamente a que desejamos transmitir.
Na pontuação usada na frase A, o que é que a personagem garantiu? O texto antecedente ou o sequente? Era o antecedente? Então seria preciso fazer a ligação:
«– Nem desses plenários tive conhecimento –, garanti. – Nada tenho a ver com isso.»
Mas é o sequente? Então, seria:
«– Nem desses plenários tive conhecimento. – Garanti: – Nada tenho a ver com isso.»
Garantiu tudo? Seria preciso outro arranjo para que a ideia ficasse clara.
Na frase B o problema é semelhante.
C «– Como não há?! – E eu próprio fui procurar aquele produto insubstituível. – Ora vê! Está aqui!...»
A mensagem está clara na separação. Não há outro parágrafo, o interlocutor é o mesmo. O leitor depreende que a última fala é o resultado da primeira ação da personagem na procura.
Devem-se evitar os declarativos que se subentendem, mas pode haver nessa escolha também já discurso livre.
Canonicamente, para separar as duas ações distintas: procura e apresentação do produto, seria:
C «– Como não há?! – E eu próprio fui procurar aquele produto insubstituível. Mostrei: – Ora vê! Está aqui!...»
Muito obrigado pelo seu reconhecimento sobre o nosso contributo em defesa da nossa língua. Gracioso, empenhado, nem sempre fácil...
Ao seu dispor,