Na Gramática da Língua Portuguesa, de Maria Helena Mira Mateus e outros (1989, p. 260), é feita a seguinte observação: «A relação de junção entre frases ou entre constituintes de frase que possuem dois elementos idênticos provoca a elipse do segundo elemento», ex.: «O Miguel tem ido ao cinema, e a Paula também tem ido.» Constatamos, portanto, que o complemento do verbo — «ao cinema» — foi elidido. Poderíamos até ter ido mais longe e suprimido todo o sintagma verbal: «O Miguel tem ido ao cinema, e a Paula também.»
Este tipo de processo é muito comum na língua portuguesa, sendo particularmente utilizado em estruturas coordenadas, como é o caso do exemplo acima citado e da frase sugerida pela consulente. No fundo, a palavra queijo, apesar de não ter uma concretização lexical na segunda oração, acaba por estar presente de forma subentendida: «Eu comprei um queijo, e tu ainda me deste um [queijo].»
Sendo assim, e respondendo directamente à pergunta feita pela consulente, o segundo um é, tal como o primeiro, artigo indefinido. Contudo, é importante referir que, se no lugar do artigo indefinido, estivesse um artigo definido, a concretização deste processo elíptico já não seria possível, pois «os artigos definidos não podem surgir isolados, quer por elipse do Nome, quer por movimento do Nome e do complemento (ao contrário dos indefinidos e de outras formas de quantificação)» (Gramática da Língua Portuguesa, Maria Helena Mira Mateus e outros, 2003, p.347), ex.: «* Eu comprei o livro, e tu também compraste o»; «Eu comprei um livro, e tu também compraste um».
Será ainda interessante notar que ao movimento inverso à elipse se chama processo enfático, isto é, quando se repetem, nas segundas orações das estruturas coordenadas, os elementos idênticos aos das primeiras, ex.: «O João foi ao cinema, e a Maria também foi ao cinema.»