Sara Mourato - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara Mourato
Sara Mourato
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Licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre em Língua e Cultura Portuguesa – PLE/PL2 pela mesma instituição. Com pós-graduação em Edição de Texto pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, trabalha na área da revisão de texto. Exerce ainda funções como leitora no ISCTE e como revisora e editora do Ciberdúvidas.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Tenho uma dúvida sobre uso do verbo ressecar. Podemos usá-lo para indicar outra situações que não envolvam água?

Por exemplo: «o plástico da carenagem da minha moto está ressecado de tanto pegar sol»?

Pergunto isso porque sempre ouço na linguagem do dia a dia frases desse tipo, porém ao consultar alguns dicionários, só vi abonos com contextos envolvendo água.

Agradeço desde já o apoio e compreensão de sempre.

Resposta:

De facto, secar, verbo do qual deriva o verbo ressecar, está associado, essencialmente, a líquidos, i.e., fazer desaparecer líquidos/humidade. 

Também ressecar pode ter uma aceção próxima, «secar ou secar-se, de novo» (Dicionário da Língua Portuguesa, Academia das Ciências de Lisboa). Contudo, este verbo está também atestado como «tornar muito seco; fazer perder a elasticidade, flexibilidade de alguma coisa» (Ibidem) e, por isso, afirmar que «o plástico da carenagem da minha moto está ressecado de tanto pegar sol» está correto. Quer com isto dizer-se que o plástico está muito seco e a perder a sua flexibilidade.

O enigma do <i>ghosting</i> nas relações modernas
Qual a origem desta expressão?

É fácil ouvirmos os millennials ou Geração Z, entre eles, principalmente, relatarem que alguém lhes «deu ghost/ghosting». Esta expressão aparenta estar relacionada com as relações modernas, vinculadas, em grande medida, às interações digitais. Mas do que se trata, e qual a origem, afinal, desta expressão? A esta pergunta dará resposta a consultora Sara Mourato, num artigo acerca da recente expressão «dar ghost/ghosting». 

Pergunta:

O «conhece-te a ti mesmo» está correto e não implica em redundância, certo?

Obrigado.

Resposta:

Não ocorre nenhuma redundância quando enunciamos «conhece-te a ti mesmo».

A estrutura «a ti mesmo» dá ênfase à mensagem transmitida pelo verbo reflexivo. Celso CunhaLindley Cintra referem, na Nova Gramática do Português Contemporâneo (Lisboa, Sá da Costa, 2002, p. 300), que as formas tónicas de pronome pessoal (mim, ti) regidas da preposição a se usam, «acompanhando um pronome átono [clítico], para ressaltar o objeto/complemento».

Se por ventura causar estranheza a colocação do clítico, é de reforçar que conhecer é um verbo pronominal nas aceções de «encontrar-se pela primeira vez» e «saber julgar-se ou avaliar-se» (Infopédia).

Pergunta:

Pode dizer-se desregulatória?

Obrigado.

Resposta:

Aquilo que encontramos atestado é, como adjetivo e nome masculino, desregulador/a: «que ou o que desregula ou tem por função desregular» (Priberam). O sufixo -(d)or é usado como agente, instrumento da ação. 

Por outro lado, encontramos atestado o oposto de desregulatória, i.e., regulatório (Ibidem). Por isso mesmo, não há como não aceitar a forma desregulatória. Note-se que o sufixo -tório/a é usado com o sentido de lugar e, à semelhança de -(d)or, instrumento da ação (Cunha, Celso, Cintra, Lindley. Nova Gramática do Português Contemporâneo). Portanto, as duas formas estão corretas, sendo que significam o mesmo. À sua semelhança, por exemplo, encontram-se atestados outros substantivos formados com os sufixos -(d)or -tório, como são caso inibidor e inibitória

Pergunta:

Como fica esta frase na passiva: «O João costuma ler as revistas»?

 Obrigada

Resposta:

A frase na voz passiva correspondente a «O João costuma ler as revistas» é «As revistas costumam ser lidas pelo João».

O que aqui acontece é que, na voz ativa, temos o núcleo verbal preenchido por uma perífrase verbal composta pelo verbo costumar seguido do verbo pleno ler, na alternativa passiva, a perífrase verbal, desde que se mantenha a sinonímia, é: verbo auxiliar da voz ativa [costumam] + verbo auxiliar da voz passiva [ser] + particípio passado do verbo pleno [lidas]. 

Neste caso, o verbo costumar não intervém na seleção dos argumentos nem altera os valores semânticos que o verbo pleno lhe atribui, daí, manter-se na frase da voz passiva.