Sara de Almeida Leite - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara de Almeida Leite
Sara de Almeida Leite
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Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, variante de Português e Inglês, pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa; mestre em Estudos Anglo-Portugueses; doutorada em Estudos Portugueses, especialidade de Ensino do Português; docente do ensino superior politécnico; colaboradora dos programas da RDP Páginas de Português (Antena 2) e Língua de Todos (RDP África). Autora, entre outras obras, do livro Indicações Práticas para a Organização e Apresentação de Trabalhos Escritos e Comunicações Orais ;e coautora dos livros SOS Língua Portuguesa, Quem Tem Medo da Língua Portuguesa, Gramática Descomplicada e Pares Difíceis da Língua Portuguesa e Mais Pares Difíceis da Língua Portuguesa.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

«Eu equivali Matemática a Métodos Quantitativos.»

É possível utilizar o verbo equivaler neste contexto?

Resposta:

O verbo equivaler não pode ser utilizado nesse contexto, pois pede apenas dois argumentos: o sujeito (que seria «Matemática») e o complemento preposicionado, neste caso, «Métodos Quantitativos».

Por outras palavras, só podemos dizer que uma coisa ou pessoa equivale a outra, e não que «alguém equivale uma coisa a outra». Se existe, de facto, alguém que toma a iniciativa quanto à equivalência, então poderemos optar por outras estruturas, como: «eu faço equivaler uma coisa a outra», ou «eu solicito a equivalência de uma coisa a outra», «eu obtive a equivalência», etc.

A estrutura que o consulente apresenta (SUJEITO + VERBO + COMPLEMENTO DIRECTO + COMPLEMENTO PREPOSICIONADO) seria válida, por exemplo, para uma oração com o verbo comparar. Por exemplo: «Eu comparei Matemática a Métodos Quantitativos.»

Pergunta:

O que justifica a separação da palavra "quar-tzo"; não seria quart-zo, como sols-tí-cio, he-li-cóp-te-ro, etc.?

Resposta:

Antes de tentar responder, gostaria de chamar a atenção do consulente e dos leitores para a seguinte explanação do Prontuário Ortográfico e Guia da Língua Portuguesa, 33.ª edição, de Magnus Bergström e Neves Reis, cujos sublinhados são nossos: «Os falantes de uma língua têm de um modo geral consciência das sílabas, que correspondem às unidades em que se dividem as palavras quando são pronunciadas lentamente. Pode, pois, dizer-se que a sílaba constitui uma unidade de pronúncia intuitivamente reconhecida.»

Conclui-se, portanto, que a divisão silábica das palavras é mais intuitiva do que racional e que tudo o que não estiver explicitamente contemplado nos prontuários ortográficos e nas gramáticas terá de ser "descoberto" pelos falantes interessados.

Referindo-me, agora, à pergunta do consulente, eu diria que a justificação para separar a palavra quartzo nas sílabas "quar-tzo" estará no simples facto de ser essa a opção feita pelas pessoas que, ao pronunciarem quartzo lentamente, entendem que ela assim se divide.

Porém, se quisermos sistematizar as diferentes possibilidades e respectivas justificações, teremos:

a) quar-tzo: considera-se africada a sequência [tz], ou seja, [tz] será um par de consoantes oclusiva-fricativa produzidas na mesma emissão de voz (e portanto inseparáveis), tal como /ʧ/ em "tchio" (tio), e /ʤ/ em "dgia" (dia) na pronúncia do Brasil. Esta divisão está na origem de quarço, forma alternativa que se registra no Dicionário Michaelis, no Grande Dicionário da Língua Portuguesa

Pergunta:

Gostaria de saber a classificação gramatical da expressão «para tanto» e sinônimos.

Resposta:

A expressão «para tanto» está atestada no Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa com o seguinte significado: «para tal coisa acontecer». «Para tal» e «para isso» serão sinónimos adequados, nesse sentido.

Quanto à classe gramatical, trata-se da combinação entre uma preposição (para) e um pronome indefinido (tanto). Não sendo uma locução, «para tanto» não tem uma classificação gramatical que englobe as duas palavras.

Note-se, ainda, que «para tanto» pode não ter o significado a que nos referimos, se se empregar em contextos em que tanto é determinante. Por exemplo, «Para tanto café, vais precisar de duas caixas». Nesta frase, «para tanto» corresponde a preposição + determinante indefinido (ou quantificador existencial, de acordo com a versão revista da Terminologia Linguística para o Ensino Básico e Secundário — TLEBS) e o seu significado é «para tal/tamanha quantidade de».

Pergunta:

A frase «Não, obrigada» está na forma negativa?

Obrigada.

Resposta:

A frase «Não, obrigada» é negativa, estando contudo oculta a forma verbal. Esta poderá ser, por hipótese, quero («Não quero, obrigada»), aprecio («Não aprecio, obrigada»), preciso («Não preciso, obrigada»), ou muitas outras, dependendo do contexto.

Pergunta:

Está correcto utilizar o termo avaliando com o significado de «aquele que está a ser objecto de avaliação»?

Resposta:

Tendo em conta que os substantivos formando e educando já se encontram dicionarizados, parece-me natural que se use “avaliando” com um sentido semelhante, designando aquele que está a ser, ou sendo, avaliado.

Não se pode, ainda, dizer que é um vocábulo consagrado, nem tão-pouco aparece em bases de dados como a Mordebe ou o Corpus do Português.

Contudo, uma vez que o tema da avaliação (sobretudo do desempenho profissional) assume grande relevo na actualidade, é provável que venha a ouvir-se e a ler-se, cada vez mais, o nome “avaliando”.

Portanto, para responder à pergunta, não se pode dizer que esteja “correcto” o uso do substantivo “avaliando”, dado que não se encontra atestado nos dicionários. Mas é também verdade que nem os dicionários são lei, nem fazem justiça ao léxico efectivamente utilizado pela comunidade linguística em determinado momento histórico.