Nuno Carvalho - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Nuno Carvalho
Nuno Carvalho
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Investigador do ILTEC; foi leitor de Português na Universidade de Oxford (2001-2003).

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Qual a função sintáctica de «com Ana» na frase «Miguel fala com Ana»?

Resposta:

Numa frase como «Miguel fala com Ana», o constituinte «com Ana» desempenha a função de complemento preposicional.

Pergunta:

Gostaria de saber por que a expressão «um monte de» pode vir acompanhada tanto por substantivos no singular (um monte de capim), quanto por substantivos no plural (um monte de pessoas).
Obrigada!

Resposta:

O facto de a expressão «um monte de» poder vir acompanhada de nomes no plural e no singular depende mais das características desses nomes do que da própria expressão.

Existem nomes contáveis e nomes não contáveis. Os nomes contáveis são aqueles que se aplicam a objectos ou referentes que podem ser diferenciados como partes singulares ou partes plurais de um conjunto. É o caso de pessoa: podemos dizer «uma pessoa, duas pessoas». Os nomes não contáveis aplicam-se a conjuntos de objectos ou entidades em que não é possível distinguir partes singulares de partes plurais. É o que acontece com capim: será estranho dizer «um capim, dois capins».

«Um monte de» é uma locução que significa uma grande quantidade de. O nome que se lhe segue será plural se for contável, e singular se for não contável.

Pergunta:

Em meu trabalho freqüentemente realizo traduções de japonês para português e vice-versa. Em muitas vezes valho-me do Ciberdúvidas para sanar dúvidas sobre a utilização de palavras.

No momento encontro uma dúvida sobre as palavras maior, menos, superior, inferior, acima, etc.

Na frase «Escolha um número maior que 20...», nesse caso inclui-se o número 20? Ciente de que na expressão «maior de 18 anos» inclui-se a idade de 18.

Então pergunto: qual seria a expressão adequada para designar «igual ou superior» e para «igual ou inferior»?

Poderia eu utilizar a expressão «igual ou...», mas gostaria de simplificar em uma só palavra.

Conto com a ponderação dos participantes do Ciberdúvidas.

Resposta:

A linguagem matemática usa «maior» para não incluir na contagem o número que se segue e «maior ou igual» para o incluir. Desta forma, «maior que 20» significa «21 ou mais», ao passo que «maior ou igual a 20» significa «20 ou mais».

Este uso parece ter correspondência na linguagem corrente. E a expressão «maior de 18 anos» chega a contrariar este facto, uma vez que a pessoa que completa 18 anos entra no seu décimo nono ano, ficando logo no minuto a seguir com mais de 18 anos.

Pergunta:

Ando a ler Os Colonos, de António Trabulo. Possuo vários dicionários Português-Neerlandês/Inglês/Francês, até o Lello Universal, e consigo entender 99% das palavras, [excepto] a expressão "galifões", de que não encontro o sentido. Cito: «Havia galifões no bairro. Nenhum reinava muito tempo. O vinho, a tuberculose e a polícia deitavam-nos abaixo.»

Nem uma pesquisa "google" o esclarece, porque as pessoas usam "galifão" como pseudónimo sem juntar mais explicações. Espero que o Ciberdúvidas possa ajudar.

Grato, desde já, pelo vosso esclarecimento.

Resposta:

O Dicionário de Expressões Populares Portuguesas (2.ª edição, Lisboa, Dom Quixote, 2000), de Guilherme Augusto Simões, regista galifão nas seguintes acepções: «indivíduo que consegue tudo; prepotente [...]; atrevido; brejeirote; malandreco; rapaz na transição para homem [...].»

Pergunta:

A dúvida que venho levantar surgiu-me numa aula de Português que tive recentemente. Na ocasião, ditava a professora alguns apontamentos sobre Sophia de Mello Breyner. Quando falou acerca da sua formação em Filologia Clássica, comentou acerca do modo como Sophia grafava as palavras gregas utilizando dígrafos como ‹ph› e ‹th›. Olhando para o meu caderno, onde (por ter surgido algures no ditado) estava escrita a palavra «Delphos» assim grafada, comentei o facto de eu fazer o mesmo. Fui prontamente instruído para que não o fizesse, porque, citando a professora, «as normas da língua assim o exigem».

Inconformado, procurei informar-me mais sobre o assunto. Pesquisando no Dicionário Porto Editora 2008 descobri que Delphos ainda não foi incorporado na língua como Delfos, a menos que esta palavra conste de outros dicionários mais completos. Pouca diferença faria, contudo, visto que o facto de uma palavra estrangeira ser introduzida na língua não me forçaria a utilizá-la com a grafia portuguesa (como confirmado pela resposta a uma dúvida que levantei anteriormente aqui no Ciberdúvidas, referente a aportuguesamentos).

De seguida, pesquisei os métodos oficiais de romanização do grego antigo, e verifiquei que, para esta língua específica (isto é, o grego antigo por oposição ao grego moderno), um grande número de sistemas de romanização (há muitos, como seria expectável) aceita o uso deste tipo de dígrafos em detrimento das letras isoladas.

Mantenho assim a minha convicção de que nada há de errado em escrever, para manter o mesmo exemplo, Delphos.

A partir desta questão originou-se outra dúvida: como proceder no que respeita aos nomes próprios? A minha professora de Português, estou certo, não hesitaria em escre...

Resposta:

A sequência de origem grega ph perdura normalmente em português sob a forma de f. Daí que seja natural que a forma Delphos apareça em português como Delfos.

O Dicionário Porto Editora 2008 que refere não regista a palavra Delfos porque se trata de um nome próprio. Assim como não regista a palavra aportuguesada, também não regista a palavra Delphos.

Não é missão dos dicionários gerais registar nomes próprios, pelo que não será de esperar que a palavra conste (como entrada) em dicionários mais completos. Pode, no entanto, encontrar a palavra délfico no dicionário que referiu, com o significado seguinte: «relativo a Delfos, cidade grega antiga».

Pode, também, consultar a enciclopédia da mesma editora para verificar que a grafia na entrada referente a esta antiga cidade grega é Delfos [Delfos. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2008. [Consult. 2008-09-20]. Disponível na www: <URL: http://www.infopedia.pt/$delfos>].

A tradução dos antropónimos tem muito que ver com questões de uso (e não encontramos grande constância neste aspecto). Em tempos, era normal traduzir os nomes próprios para português, tradição que parece estar a desaparecer aos poucos.

Veja-se, por exemplo, uma vez que fala do rei João, a família real inglesa. Historicamente, os reis ingleses que conhecemos têm nomes traduzidos para português: Henrique V, Henrique VIII, João I (João Sem-Terra) ou Ricardo III só para dar alguns exemplos — vemos também que os livros de William Shakespeare se chamam em português Otelo (não Othello)...