Maria Regina Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
Textos publicados pela autora

Artigo de Maria Regina Rocha publicado no Diário do Alentejo, na coluna "A vez ao… português", de 31 de Outubro de 2008, à volta de quatro palavras da área vocabular da Igreja Católica.

 

Pergunta:

Em Ainda demais, advérbio, Maria Regina Rocha, baseando-se no que, um pouco laconicamente, Rebelo Gonçalves anota no seu Tratado de Ortografia da Língua Portuguesa, não levou em linha de conta o facto de o mesmo autor (cf. Vocabulário da Língua Portuguesa, p. 317) classificar demais como advérbio de modo e não de quantidade, função esta que é suprida pela locução adverbial de quantidade «de mais». É inequívoco, pois, que apenas se poderá escrever «Os portugueses gastam de mais».

Cordialmente,

Resposta:

É muito interessante este assunto, dado suscitar dúvidas de pessoas conhecedoras da língua.

Vou, então, convidar o consulente a seguir a minha reflexão, por meio da qual tentarei esclarecer a dúvida levantada a respeito da frase «Os portugueses gastam demais».

Quando referi Rebelo Gonçalves, em resposta ao consulente Carlos Fontoura, citei o Tratado de Ortografia da Língua Portuguesa, por ser uma obra do mesmo autor, mas mais recente do que o Vocabulário. Efectivamente, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (da Academia das Ciências de Lisboa, coordenação de Rebelo Gonçalves) foi publicado em 1940, antes da entrada em vigor do Acordo Ortográfico de 1945, enquanto o Tratado de Ortografia da Língua Portuguesa, da autoria de Rebelo Gonçalves, foi publicado em 1947, tendo em conta o referido acordo ortográfico. Ora, nesta obra, o grande filólogo já não restringe o valor do advérbio, apenas refere (pág. 248) que demais é «advérbio, conjunção, pronome e elemento de várias locuções». E, noutra obra na qual colaborou, o Vocabulário Ortográfico Resumido da Língua Portuguesa, da Academia das Ciências de Lisboa, também de 1947, também se refere (pág. 132) que demais é «advérbio, conjunção e adjectivo ou pronome demonstrativo», fazendo também parte das locuções adverbiais «demais disso, ao demais». Em ambas as obras se indica «cf. a loc. adv. de mais, a que se opõe de menos».

Ou seja, considero que o que Rebelo Gonçalves postula finalmente é o que decorre do acordo de 1945: demais é um advérbio com diversas ac...

Pergunta:

Há dias, ouvindo José Sócrates num comício do seu partido nos Açores, dou por ele a dizer: «Viva o PS, viva os Açores!». «“Viva” os Açores», ou, antes, «"Vivam" os Açores»?

Resposta:

A construção correcta é «Vivam os Açores!».

Em primeiro lugar, lembremos que o nome do arquipélago, ou da região autónoma, é um plural – Os Açores –, levando o verbo para a 3.ª pessoa do plural. Por exemplo: «Os Açores integram a União Europeia com o estatuto de região ultraperiférica do território da União, conforme estabelecido no artigo 299.º-2 do Tratado da União Europeia.»

Quando à expressão «Viva!», ela não é mais do que uma forma do verbo viver, devendo, pois, concordar com o sujeito. A exemplo da expressão «Morra!», do verbo «morrer» («Morram os traidores!»), «Viva!» deverá seguir a regra geral da concordância verbal: «Viva a rainha!», «Vivam os príncipes!», «Vivam os republicanos!», «Vivam os monárquicos!», «Vivamos nós!».

 

É muito interessante a frase «Lépido, filhote de Valente, um indômito de quatro anos, estava ontem deitado no pasto, sem sela, relinchando, quando foi laçado.», pois não é totalmente pacífica a análise dos termos «deitado no pasto», «sem sela» e «relinchando».

Observemos a frase.

Pergunta:

Gostaria de conhecer a origem e/ou motivo da expressão «dor de cotovelo» para exprimir a ideia de ciúme, inveja.

Resposta:

«Ter dor de cotovelo» significa ter inveja. Quando se bate com o cotovelo em algo, a dor é muito forte, pois está saliente a articulação do húmero com o cúbito. A dor de cotovelo é, portanto, muito forte, tal como o sentimento de inveja, que provoca insatisfação em que o experimenta.

Esta expressão está relacionada com o verbo acotovelar ou a expressão «dar uma cotovelada», que significam dar pancada ou empurrar com o cotovelo. Uma cotovelada também era um sinal que se dava para chamar a atenção de alguém sobre alguma coisa que se pretendia censurar ou ridicularizar: tocava-se com o cotovelo noutra pessoa para ela reparar nisso. Essa censura por vezes resultava de inveja. Se a pessoa dá muitas cotoveladas por muitas situações dessas, é natural que lhe doa o cotovelo.

Acotovelar-se significa bater com os cotovelos uns nos outros em virtude de aperto ou de aglomeração, tentando cada um sair-se melhor do que o outro.

Destes significados, resulta a expressão «dor de cotovelo», com o significado acima referido.