Maria Regina Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Escalda chávenas ou escalda-chávenas?

Resposta:

Não encontrei este termo dicionarizado. Como é sabido, a composição por justaposição é um processo de enriquecimento da língua em que as duas palavras que formam uma nova começam por ser utilizadas juntas e depois, muitas vezes, ligadas por hífen, quando já sentidas como um termo autónomo, diferente dos dois que o compõem. Estão registados nos dicionários termos semelhantes ao que apresenta: escalda-favais, escalda-mão, escalda-mar, escalda-pés, escalda-rabo.

Pergunta:

Ouve-se, hoje em dia, por toda a parte televisiva (e não só), a expressão "nunca... antes", em algumas pequenas variantes: "nunca visto antes", "nunca referido antes", nunca publicado antes", etc.

Penso tratar-se de um pleonasmo, dado que o "nunca" implica necessariamente "antes".

Agradecia esclarecimento.

Resposta:

Os dois advérbios nunca (de negação) e antes (de tempo) são utilizados juntos para reforçar a ideia de negação: «nunca antes visto». Embora seja uma construção pleonástica, como muito bem diz o nosso consulente, pois no advérbio nunca está também presente a ideia de anterioridade, estes advérbios são muitas vezes utilizados em conjugação em frases enfáticas, em frases em que se pretende salientar o valor, a importância, o absoluto dessa negação. Se a função da frase não for apenas informativa, mas também expressiva ou apelativa, é admissível este emprego conjunto dos dois advérbios.

Pergunta:

Será correcto dizer, como por vezes se ouve, «no caso em apreço...»? Não deverá preferir-se «no caso em apreciação...»?

Por favor, um esclarecimento.

Resposta:

Está correcta a expressão no caso em apreço.

Apreço é um derivado de apreçar, que significa avaliar, estimar, saber o preço, perguntar o preço de. Apreço tem como significados estima, consideração, valor, respeito, importância, merecimento.

Apreciação é um derivado de apreciar, que significa avaliar, julgar, considerar. Apreciação é o acto ou efeito de apreciar, avaliação.

Apreçar e apreciar provêm do latim ‘appretiare’ (avaliar).

Como se vê, estes termos têm significados próximos, estando na sua origem a ideia de «avaliar», «analisar o valor de algo».

Com a expressão no caso em apreço pretende dizer-se que há um caso cujo valor está a ser tido em consideração, ao qual estamos a dar valor, que estamos a valorizar, a evidenciar, que está em juízo, em julgamento (no nosso espírito e não só), ou cujo valor estamos a tentar mostrar.

Também se utilizam expressões com o termo apreciação: «um caso para apreciação», «o requerimento está em apreciação». Nestes exemplos, o termo apreciação refere-se à actividade objectiva de análise de algo, independentemente de ter valor ou de lho atribuirmos.

Pergunta:

Gostaria de saber se se escreve Nélson ou Nelson. Já consultei um dicionário de antropónimos (ex.: Diciopédia – Porto Editora) onde o nome aparece grafado com acento agudo (Nélson), embora este nome apareça escrito, quase sempre, sem o referido acento. Estou com dúvidas e queria ser esclarecido.
Muito obrigado.

Resposta:

Nos dicionários onomásticos portugueses, este nome próprio está, efectivamente, registado com acento na penúltima sílaba: Nélson. Esta acentuação corresponde ao cumprimento da regra que determina que na língua portuguesa as palavras graves terminadas em -n levam acento gráfico (ex.: cânon, éden, hífen, íman, líquen, númen) e que os nomes próprios – portugueses ou aportuguesados – estão sujeitos às mesmas regras de acentuação estabelecidas para os nomes comuns.

No entanto, no que diz respeito à grafia de nomes próprios, para salvaguardar direitos individuais, quem o quiser poderá manter na sua assinatura a forma que foi registada no seu assento de nascimento ou a que usualmente sempre foi utilizada. O mesmo acontece a respeito da grafia original de firmas, sociedades, títulos ou marcas que tenham sido objecto de registo público.

No caso da palavra Nelson, segundo o Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, de José Pedro Machado, este nome começa a ser utilizado como nome próprio português por influência do nome do célebre almirante inglês Horácio Nelson (1758-1805), Nelson que está por Neilson, patronímico, isto é, «filho (son) de Neil». Como este nome próprio se afirmou em Portugal como cópia do nome inglês, sem o respectivo aportuguesamento (acrescento de um e final, que, aliás, desvirtuaria a essência do nome inglês), considero que é correcta a utilização da forma Nelson, não aportuguesada.

Pergunta:

Qual das seguintes frases escritas está mais correcta?

1) «Como vê, não há nada que nos distraia de fazer um bom trabalho.»

2) «Como vê, nada pode distrair-nos de fazer um bom trabalho.»

Obrigado.

Resposta:

Considero que nenhuma das frases está totalmente correcta. O verbo distrair quando regido da preposição de significa «desviar (a atenção de alguém) de», «afastar (alguém) de» e é seguido de um substantivo, e não de forma verbal: distrair de uma preocupação, de uma tristeza, de uma obsessão, do trabalho.

Assim, poderá substituir-se o verbo distrair por impedir:

1. «Como vê, não há nada que nos impeça de fazer um bom trabalho.»
2. «Como vê, nada pode impedir-nos de fazer um bom trabalho.»

As frases têm uma ligeira diferença de significação. Na primeira frase, transparece uma maior certeza acerca do facto.