F. V. Peixoto da Fonseca (1922-2010) - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
F. V. Peixoto da Fonseca (1922-2010)
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Fernando Venâncio Peixoto da Fonseca (Lisboa, 1922 – Lisboa, 2010) Dicionarista, foi colaborador da Enciclopédia Portuguesa e Brasileira e da atualização do Dicionário de Morais, membro do Comité International Permanent des Linguistes e da Secção de História e Estudos Luso-Árabes da Sociedade de Geografia de Lisboa, sócio de Honra da Sociedade da Língua Portuguesa e da Academia Brasileira de Filologia. Antigo decano dos professores do Colégio Militar, era licenciado, com tese, em Filologia Românica, distinguido com a Ordre des Palmes Académiques. Autor de várias obras de referência sobre a língua portuguesa, entre as quais O Português entre as Línguas do Mundo, Noções de História da Língua Portuguesa, Glossário etimológico sobre o português arcaico, Cantigas de Escárnio e Maldizer dos Trovadores Galego-Portugueses, O Português Fundamental e O Ensino das Línguas pelos Métodos Audiovisuais e o Problema do Português Fundamental. Outros trabalhos: aqui.

 
Textos publicados pelo autor

Em 1873, o grande Augusto Epifânio da Silva Dias, na 2.ª ed. da sua Gramática Portuguesa, nota que não abriram o o da sílaba tónica no plural as palavras adorno, bolso, estojo, folho, globo e molho (ô). Mas em 1883, dez anos depois, A. R. Gonçalves Viana, no Essai de Phonétique et de Phonologie de la Langue Portugaise, diz que já se pronunciava geralmente adornos (ó) e até gostos (ó), mas este termo só os algarvios o pronunciam assim.

Nas 45 palavras da lista que Viana apresenta, supri...

Reflexões acerca do Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa

«A edição do dicionário da Academia da Ciências de Lisboa – escreve neste artigo Fernando Peixoto da Fonseca – deve saudar-se, primeiro porque finalmente saiu como obra completa, isto é de A a Z, ao contrário das duas anteriores tentativas (fins dos séculos XVIII e XX), que se ficaram pela letra A. O facto de ser constituído por dois volumes é secundário, poderia tê-lo sido só por um, como o da Academia Espanhola. O importante é ter sido por fim dado a lume, se bem que bastante atrasado relativamente ao da Academia Francesa, do tempo de Richelieu  (...)»

Pergunta:

Tenho, por vezes, dificuldade em explicar aos meus alunos a diferença entre a sinédoque e a metonímia.
Por exemplo: "ferro" em vez de "espada" é uma sinédoque ou uma metonímia?
Desde já agradeço os esclarecimentos que me possam dar.

Resposta:

Transcrevo um passo de Napoleão Mendes de Almeida na sua Gramática Metódica da Língua Portuguesa, a partir dum trabalho meu intitulado Introdução ao estudo da semântica, que este filólogo brasileiro e meu grande amigo, infelizmente já falecido, resume amavelmente: «A sinédoque (gr. synedochê = compreensão) consiste no emprego de uma palavra em lugar de outra na qual está compreendida, com a qual tem íntima conexão: pão, por alimento; vela, por navio; ferro, por espada ou âncora; lar (ou fogão), por casa.» Aqui tem, portanto, a resposta. E logo a seguir, Napoleão Mendes de Almeida continua a resumir-me (p. 328 da 11.ª edição): «A metonímia é simples variante da sinédoque; são denominações essas de distinção tão subtil que autores há que dão como exemplo de metonímia aquilo mesmo que outros subordinam à sinédoque, e tratadistas há que mal mencionam essas denominações de tropos semânticos. [...] Se na sinédoque se emprega o nome de uma coisa em lugar do nome de outra nela compreendida, na metonímia a palavra é empregada em lugar de outra que a sugere, ou seja, em vez de uma palavra emprega-se outra com a qual tenha qualquer relação por dependência de ideia: damasco = tecido de seda com flores ou espécie de abrunho, ambas provenientes de Damasco [...]; louro, por glória, prémio; cãs, por velhice; Fulano é um bom garfo [...].» E chega de citações minhas por interposta pessoa!

 

Pergunta:

Num concurso público, através de um edital, foi solicitado estabelecer-se a distinção entre ortoépia e prosódia. Não obstante, apliquei-me em consultar este excelente guia de consultas cibernético, Ciberdúvidas, mas infelizmente não obtive graça. Ficaria encantado em poder obter vossas prestimosas colaborações.

Grato.

Resposta:

Ortoépia é a parte da gramática que ensina as regras da boa pronúncia, e igualmente esta mesma quando correcta. Pressupõe a existência duma norma de pronúncia, válida no interior dum agrupamento linguístico.

Prosódia é termo sinónimo, mas especificamente é a parte da fonética que estuda tudo o que, na fala, não conduz ou não diz respeito à realização dos fonemas: tons, acentos, ritmo, intensidade, intonação, pausas, elocução.

Pergunta:

Uma vez mais recorro aos vossos préstimos para me indicarem, por favor, como pronunciar "poesia". No Dicionário da Porto Editora, surge a indicação explícita de que a pronúncia será "pu-i...", enquanto o novo Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, na transcrição fonética da palavra, refere que o "e" deve ser aberto.

Como sou, para além de professor, um leitor ("diseur"?) assíduo de poesia em lugares públicos, onde a maioria dos poetas e leitores pronuncia também com "e" aberto, muito grato ficaria pela vossa opinião.

Resposta:

O que tem razão é o Dicionário da Porto Editora, se de facto lá vem assim (na minha edição, a 7.ª, não se indica a pronúncia). Discordo de que a maioria dos poetas e leitores pronunciem poesia com e aberto (como de facto indica o Dicionário da Academia), pois, durante os meus quase oitenta anos de vida, não inteiramente analfabeta, nunca ouvi tal pronúncia, que me parece completamente anómala e pretensiosa. Obs.: A pronúncia que defendo é a única constante do Dicionário Prosódico de Portugal e Brasil, de António José de Carvalho e João de Deus, editado em conjunto no Porto e no Rio de Janeiro.