Eunice Marta - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Eunice Marta
Eunice Marta
67K

Licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre (Mestrado Interdisciplinar em Estudos Portugueses) pela Universidade Aberta. Professora de Português e de Francês. Coautora do Programa de Literaturas de Língua Portuguesa, para o 12.º ano de escolaridade em Portugal. Ex-consultora do Ciberdúvidas e, atualmente, docente do Instituto Piaget de Benguela, em Angola.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

A palavra campanário pertence a alguma família de palavras?

Resposta:

Não há consenso sobre a etimologia da palavra campanário, pois apercebemo-nos de que há duas versões: uma, a de que deriva do latim medieval campanarius (Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, de José Pedro Machado, 1990), e outra, que remete para o «latim tardio campăna, […] já no início do séc. VI. "sino" (it., provç., cat., esp., port. campana), donde campanŭla, "sino pequeno"» (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2007; Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora).

Independentemente da sua etimologia, o termo campanário implica a presença de sinos, uma vez que tal palavra designa «torre da igreja onde ficam os  sinos» (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa) ou «parte da torre em que estão suspensos os sinos» (Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora), o que nos permite associar essa palavra a outros vocábulos «derivados e a compostos eruditos [que se formaram a partir do étimo campăna] que ocorrem desde o Renascimento em diante»: campainha («pequeno sino de mão, ou sineta, usado para chamar a atenção de alguém»), campainhada («toque de campainha; som prolongado, geralmente barulhento, que produz a campainha ao ser muito accionada»), campainhar («accionar uma campainha para fazê-la soar»), campana («sino; sinos utilizados como instrumentos de percussão em orquestra»), campanado («que tem a forma de sino»), campânula («objecto em forma de sino»), campanologia («arte de tocar sinos»), campanólogo («instrumentista que executa composições musicais em sinos, campainhas, copos afinados, etc.»), campanomania («comportamento maníaco caracterizado...

Pergunta:

O que significam a palavra composta farinha-flor e a expressão flor de farinha? Seriam sinônimas? A última seria hifenizada?

Flor de farinha é uma expressão que somente encontro em textos bíblicos do Pentateuco traduzidos para o português por católicos e protestantes. Aparece em contextos de sacrifícios e oferendas de bolos, pães ázimos etc. no Tabernáculo.

Em ambos os casos, creio que se trata de farinha de trigo, não é mesmo?

Muito obrigado sempre.

Resposta:

Flor de farinha e farinha-flor são palavras sinónimas.

A expressão «flor de farinha» está registada no verbete correspondente à entrada farinha do Grande Dicionário da Língua Portuguesa (Lisboa, Círculo de Leitores, 1991), de José Pedro Machado, com as seguintes acepções:

«farinha muito fina e de primeira qualidade»;

«(em sentido figurado) massa, têmpera, género, qualidade; estirpe»

«pó que resulta da trituração de várias sementes, para uso alimentar ou medicinal».

Não tinha hífen antes da adopção do Acordo Ortográfico de 1990 (AO 1990) e agora, com a aplicação deste, continuará a não ter, uma vez que se enquadra no tipo de compostos constituídos por locuções substantivas em que existe uma preposição como elemento de ligação (cão de guarda, fim de semana, sala de jantar; cf. Base XV, n.º 6 AO 1990).

Farinha-flor encontra-se no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, com a seguinte acepção:

«farinha de trigo, muito fina, de primeira qualidade. FLOR DE FARINHA»*

* Na fonte consultada, o símbolo ≃ significa «sinónimo».

Pergunta:

Devo pronunciar compressa com e aberto, ou com e fechado? "Compréssa", ou "comprêssa"?

Obrigada.

Resposta:

A palavra compressa pronuncia-se com o e aberto, tal como se pode verificar a partir da sua transcrição fonética «[kõpɾέsɐ]» (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, 2004), transcrição que é confirmada pelo Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa (2001).

Etimologicamente, a palavra compressa deriva «do francês compresse, “compressa”» (Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, de José Pedro Machado, 1987), que, por sua vez, remete para o «latim compressa-, particípio passado feminino de comprimĕre, “comprimir”». Poder-se-á, portanto,  associar a abertura do e na palavra portuguesa à da pronúncia da palavra original francesa a partir da qual se formou, que tem o e aberto.

Pergunta:

Num convite dirigido aos professores do meu agrupamento constava a seguinte frase: «Inaugurações dos Centros Escolares.» Parece-me que deveria ser «Inauguração dos Centros Escolares». Gostaria de saber qual das opções é a correcta e qual a regra gramatical que a sustenta. De referir que a entidade responsável pelas ditas inaugurações é a mesma (no caso, a Câmara Municipal).

Resposta:

O substantivo/nome inauguração tem a forma plural. Portanto, o uso do singular ou do plural estará relacionado com o contexto em que se enquadrar.

Se nos referirmos a «inauguração» como tema/área privilegiada de determinado(s) projecto(s)/trabalho(s), parece-nos que a forma singular é a adequada, como se pode depreender a partir de frases do tipo: «A inauguração de espaços lúdicos nos bairros problemáticos faz parte dos projectos dessa associação.»

No entanto, há casos em que a forma plural é a mais correcta, pois representa melhor a situação que se pretende apresentar. Por exemplo, a frase «Assisti a várias inaugurações de centros náuticos durante este Verão» implica o uso da forma plural, uma vez que pretende evidenciar a quantidade/o número elevado de ocorrências de tal realidade.

O caso que o consulente nos apresentou, o do texto de um convite feito pela câmara municipal aos professores do agrupamento da área concelhia em que inaugurações surge no plural — «Inaugurações de Centros Escolares» —, justifica-se pelo facto de se tratar de uma situação em que convém esclarecer-se as pessoas que se convidam sobre o programa das actividades que tal convite pressupõe. Uma vez que haverá mais do que uma inauguração de centros escolares, é conveniente informar os possíveis convidados sobre o que os espera: assistir a vários actos solenes com que se inaugura vários centros escolares.

Pergunta:

Como se chamava (nos anos 50/60) aquele pedaço retangular de papel com goma na parte de trás que se colocava nos cadernos e livros escolares para identificar o nome do dono. Não é etiqueta, nem rótulo. Tinha um outro nome. Qual é? Tentei me lembrar do nome, mas não consigo.

Agradecida.

Resposta:

Etiqueta ou rótulo são as palavras que têm sido usadas, em Portugal, para designar o «pequeno pedaço de papel, cartão, plástico…, fixado ou colado num objecto, para sua identificação, ou para indicação do seu conteúdo, do proprietário, da procedência ou destino, do preço ou de qualquer outro tipo de informação (Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, 2001, da Academia das Ciências de Lisboa), o que é comprovado pelo Dicionário Priberam da Língua Portuguesa: «O «impresso que identifica o conteúdo, as características ou a composição (em frascos, garrafas, etc.)» é denominado de etiqueta ou rótulo. Em conversa com colegas, surgiram ainda os termos moldura e estampa, como palavras de uso corrente, entre estudantes portugueses, para se referirem ao rótulo ou à etiqueta que colam nos cadernos.

No entanto, a edição brasileira do Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (Rio de Janeiro, Ed. Objetiva (2001) indica-nos outros vocábulos sinónimos de etiqueta e de rótulodístico, inscriçãoletreiro e tomba.