Eunice Marta - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Eunice Marta
Eunice Marta
66K

Licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre (Mestrado Interdisciplinar em Estudos Portugueses) pela Universidade Aberta. Professora de Português e de Francês. Coautora do Programa de Literaturas de Língua Portuguesa, para o 12.º ano de escolaridade em Portugal. Ex-consultora do Ciberdúvidas e, atualmente, docente do Instituto Piaget de Benguela, em Angola.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

É correcto dizer: «Envio os respectivos mapa e calendário»? Ou será «Envio o mapa e calendário respectivos»?

Segundo Lindley Cintra e Celso Cunha, na Nova Gramática do Português Contemporâneo, «Quando os adjectivos vêm antes do substantivo e os substantivos são nomes próprios ou graus de parentesco, o adjectivo vai sempre para o plural», não sendo o caso da frase acima, na qual os substantivos são nomes comuns.

Como deve ser feita a concordância?

Resposta:

Em primeiro lugar, aconselhamo-la a consultar a resposta Concordância de adjetivos com substantivos coordenados, de Carlos Rocha.

No entanto, como na 1.ª frase que o consulente nos apresenta — «Envio os respectivos mapa e calendário» —, o adjetivo está colocado antes dos substantivos, a situação é diferente da focada na resposta citada, pois «a posição do adjetivo (anteposto ou posposto aos substantivos)  [é uma das] condições que permitem a concordância do adjetivo com os substantivos englobados, ou apenas com o mais próximo» (Celso Cunha e Lindley Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, 17.ª ed., Lisboa, Sá da Costa, 2002, p. 273).

Ora, e segundo a gramática referida, a regra geral para «o adjetivo [que] vem antes dos substantivos» estipula que «o adjetivo concorda em género e em número com o substantivo mais próximo, ou seja, com o primeiro deles» (idem), tal como se pode verificar através dos exemplos fornecidos:

«Vivia em tranquilos bosques e montanhas.»
«Vivia em tranquilas montanhas e bosques.»
«Tinha por ele alto respeito e admiração.»
«Tinha por ele alta admiração e respeito.»
 

O único caso em que o «adjetivo [colocado antes do substantivo] vai sempre para o plural» é precisamente o que foi citado pelo consulente, ou seja, «quando os substantivos são nomes próprios ou nomes de parentesco» (idem, p. 274), o que se observa nos seguintes frases:

«Conheci ontem as gentis irmãs e cunhada de Laura.»
«Portugal cultua os feitos dos heróicos Diogo Cão e Bartolomeu Dias.» 
 

Tratando-se, portanto, de uma frase cujos substantivos não são nomes próprios nem graus de parentesco, deduz-se que o adjetivo dev...

Pergunta:

Tenho a seguinte dúvida: lendo livro antigo de Pontes de Miranda, é fácil encontrar colocações pronominais do tipo: «quem não no tem»; «quem não no sabe». Está correto esse no, ao invés de «o tem», «o sabe»?

Obrigado.

Resposta:

Se nos regermos pelo estipulado pelos gramáticos, a forma correcta em tais casos é, precisamente, o uso do pronome pessoal o, pois «quando o pronome oblíquo da 3.ª pessoa, que funciona como objecto directo, vem antes do verbo, apresenta-se sempre com as formas o, a, os, as» (Celso Cunha e Lindley Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, 17.ª ed., Lisboa, Sá da Costa, 2002, p. 279), tal como se pode observar através dos seguintes exemplos:

«Não o ver para mim é um suplício.»

«Nunca a encontraram em casa.»

Por sua vez, os pronomes o, a, os, as assumem as formas no, nas, nos, nas, quando colocados depois de «forma verbal terminada em -m, -ão ou -õe, ou seja, em nasal» (Maria Regina Rocha, Maria João Matos e Sandra Duarte Tavares, Assim É Que É Falar!, Lisboa, Planeta, 2010, p. 112), o que se verifica em estruturas como: «Trouxeram-nas», «Dão-no», «Põe-na».

No entanto, e contrariando a norma, apercebemo-nos de que o uso das formas

Pergunta:

Gostaria que me ajudassem quanto à contagem de sílabas métricas nas sílabas com acento agudo. Por exemplo: «só aquele» conta-se o «só» como uma sílaba métrica, ou agrega a primeira vogal da palavra seguinte? E em «e água» conta-se o «e», ou junta-se-lhe o «á» de água?

Muito obrigado pela vossa prestimosa ajuda.

Resposta:

O facto de uma palavra terminar ou iniciar-se em vogal graficamente acentuada (, água) não impede que, na divisão métrica, se faça a contracção dessa vogal com outra que a siga ou preceda noutra palavra («só aquele»; «e água»), contando-se uma única sílaba métrica. Trata-se de um dos casos de «licenças poéticas de compressão», mais propriamente de um fenómeno de crase, em que «contrai, numa só sílaba, dois sons vocálicos de palavras diferentes» (Amorim de Carvalho, Tratado de Versificação Portuguesa, Porto, 1941, p. 45), como se pode verificar através dos exemplos retirados da obra citada:

              Já a / ro/xa / ma/nhã / cla(ra);
              E/ra  / de/ter / a/li os/ des/co/bri/do(res);
              De / Deus / gui/a/do / só e / de / san/ta es/tre(la);
                          Camões

              A ár/vo/re es/tá em/pé,/ no / meio / das / pla/nu(ras)
                                 ...

Pergunta:

Encontro na Net (especialmente sites com.br) a palavra "exfiltração". Não a encontro em nenhum dicionário português.

A palavra existe em português? Se não, qual o contrário de infiltração (quando é para o exterior)?

Obrigado.

Resposta:

"Exfiltração" não se encontra registado nos dicionários1 de língua portuguesa nem em nenhum dos vocabulários ortográficos2 (dos mais antigos aos mais recentes), o que nos indica que tal termo não se encontra atestado, como se pode verificar pelo resultado da pesquisa no Vocabulário Ortográfico do Português, do Portal da Língua Portuguesa, da responsabilidade do ILTEC, com as seguintes sugestões: «infiltração (nome), filtração (nome) — infiltrarão (do verbo infiltrar)».

Uma vez que se pretende um antónimo da palavra infiltração, será a partir do seu significado — «acto ou efeito de infiltrar(-se); acção de penetrar em algum lugar; introdução» — e da sua formação (de infiltrar + -ção) que se poderá indicar um termo de sentido contrário. Se se tiver em conta que o verbo infiltrar significa «fazer entrar», «instilar», «introduzir», «impregnar», «inserir», poderemos considerar como antónimos «expulsar», «excluir», «secar», o que nos permite retirar os respectivos nomes/substantivos: «expulsão», «exclusão», «extracção».

No entanto, não podemos excluir a hipótese de "exfiltração" pertencer ao vocabulário específico de determinadas áreas (científicas, técnicas…), cuja terminologia não é do domínio público, inscrevendo-se no universo lexical especializado. Parece-nos, de facto, que se trata de um term...

Pergunta:

Promulgar e homologar têm o mesmo significado?

Obrigada.

Resposta:

Segundo o Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa (1987), de José Pedro Machado, o verbo promulgar deriva do latim promulgāre, «afixar, ostentar, publicar; dar a conhecer, ensinar; publicar uma proposição de lei». Termo de origem culta, há registos da sua ocorrência do séc. XVI, pois António Ferreira utiliza-o na carta «Ao Cardeal  Ifante D. Anrique, Regente» (in Poemas Lusitanos, vol. II, 1940): «Qual respeito o Rei tem, quando promulga/ A lei igual em publico proveito,/ Que com prazer do povo se divulga…»

Associado ao campo semântico da legislação e do domínio jurídico, este verbo mantém o sentido original do seu étimo latino, uma vez que os dicionários1 actuais registam os seguintes significados: «ordenar a publicação de uma lei, disposição legislativa ou documento de natureza idêntica, dando dela conhecimento público»; «fazer a promulgação» (ex.: A assembleia promulgou o decreto); «publicar oficialmente (lei, decreto); tornar público, divulgar».

Por sua vez, o verbo homologar (de homólogo + -ar) remete para a palavra homólogo — do grego homólogos, «que fala de acordo com; concordante, de harmonia com, correspondente a», que se pensa ter sido usada em 1813 (Dic. Etim. Vol. III). Essa é a razão pela qual, este verbo significa «dar homologação a; aprovar; confirmar por sentença ou por autoridade judicial; ratificar por despacho ministerial» (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, 2010), «fazer a confirmação e divulgação oficial», «dar a aceitação,  depois de verificar (ex.: «A comissão acabou por homologar os preços.»), «confirmar ou apr...