Pergunta:
Gostaria, se possível, de esclarecer uma dúvida linguística e gramatical. Nas situações em que a função sintática, seja de sujeito ou complemento verbal, aparece com o núcleo referencial "deslocado" do núcleo sintático, seria lícito considerar tal núcleo referencial como um adjunto adnominal? Exemplos:
«A maioria das pessoas não se convenceu disso.»
«Das pessoas» pode, neste caso, ser considerado como adjunto adnominal? Sabendo que o núcleo do sujeito é «maioria», então a minha dúvida é se, quando ocorre expressões partitivas, a função inteira pode ser entendida como uma coisa só, sem adjuntos. Outro exemplo:
«Tomei um pouco de café.»
«Pouco», núcleo do objeto direto, «um» adjunto adnominal, e quanto a «de café», como núcleo referencial, pode ao mesmo tempo ser entendido como adjunto adnominal?
Eu sei que estou misturando duas coisas... análise sintática e semântica, é que muitas vezes as duas. Para mim, não são tão separáveis, pois tenho a impressão de que as estruturas sintáticas, a grosso modo, não deixam de ser uma cristalização de conteúdos semânticos — com o perdão pela divagação de um leigo sobre o assunto.
Esta dúvida sobre expressões partitivas me surgiu quando eu estava lendo a gramática de José Carlos de Azeredo (do instituto Houaiss) e ele diz que em «uma xícara de café» o «de café» só seria entendido como uma locução adjetiva quando não se refere ao conteúdo, mas sim ao tipo de xícara. Sei que este último exemplo não se trata de uma expressão partitiva, mas, mesmo assim, o raciocínio parece análogo.
Obrigado.
Resposta:
Antes de mais, há que distinguir determinante de adjunto adnominal. Em «Tomei um pouco de café», «um» é um determinante, uma palavra que especifica o nome a que se liga e que, tradicionalmente, não se classifica de forma isolada numa análise sintáctica.
Adjunto adnominal, por seu lado, corresponde a um conceito sintáctico, que de alguma forma pode associar-se, para não dizermos opor-se, a complemento nominal. A função do adjunto adnominal é a de restringir o âmbito do nome, fornecendo acerca dele informações consideradas acessórias, contrariamente ao que acontece com o complemento do nome que se associa ao nome completando o seu pleno sentido. Por vezes, torna-se difícil distinguir as duas funções — adjunto ou complemento — sobretudo porque, na maioria dos casos, o complemento do nome, contrariamente ao que acontece, geralmente, com o complemento do verbo, pode ser omitido.
Nos dois exemplos que apresenta, creio que estamos perante complementos do nome, pois as duas expressões — «das pessoas» e «de café» — veiculam informação necessária à plena compreensão dos nomes a que se ligam. Assim, em 1, estamos perante uma frase cujo sujeito tem como núcleo uma expressão partitiva e que é constituído por essa expressão e pelo seu complemento:
1. «A maioria das pessoas não se convenceu disso.»
i. Complemento do nome: «das pessoas».
Note-se ainda que a concordância está feita com o núcleo, pelo que é ele que se constitui o referente dessa mesma concordância.
Em 2, «de café» é também complemento do nome, pois, tal como no caso anterior, contribui para completar, ou esgotar, o seu sentido.
2. «Tomei um pouco de café.»