Edite Prada - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Edite Prada
Edite Prada
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Edite Prada é consultora do Ciberdúvidas. Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, variante de Português/Francês, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa; mestrado interdisciplinar em Estudos Portugueses, defendido na Universidade Aberta de Lisboa. Autora de A Produção do Contraste no Português Europeu.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

As orações introduzidas pelos advérbios conectivos, como porém e contudo, são classificadas como coordenadas adversativas?

Resposta:

A classificação das orações em que há um advérbio conectivo tradicionalmente relacionado com a coordenação adversativa causa-nos problemas que se prendem, sobretudo, com o hábito.

Na verdade, não analisamos, ou, melhor, não costumamos classificar, em espaço-aula, frases em que entrem outros advérbios conectivos, e isso não nos preocupa porque já o não fazíamos… Com sentido próximo, o contraste — ainda que concessivo e não adversativo —, temos, por exemplo, o conectivo contrariamente, que não costuma ser objeto de divisão e classificação de orações.

Voltando aos advérbios conectivos até agora entendidos como conjunções adversativas, caso pretendamos analisá-los, poderemos considerar que se trata de orações adversativas assindéticas, ou seja, sem conjunção expressa. Poderemos assumir esta atitude, uma vez que o advérbio veicula sentido contrastivo, próximo do que é veiculado pela conjunção mas.

Podemos sempre optar por não dividir nem classificar orações deste tipo, como fazemos com muitas outras, por não serem paradigmáticas.

Bom trabalho.

Pergunta:

Quero saber se está correto escrever:

«A criança procurou um "espaço vazio" na cartolina.»

Ou seria apenas «espaço», que já indicaria um local livre?

Resposta:

Pessoalmente, creio que em «espaço vazio» não estamos rigorosamente perante um pleonasmo, em que vazio repita, exactamente, o que significa espaço, na medida em que, se estiver ocupado, ou preenchido, continua a ser espaço. No entanto, em muitas situações, usa-se apenas o nome espaço para designar espaço vazio, em expressões como «Não posso entrar porque já não há espaço», ou «Não colei o meu desenho por não haver espaço».

Nos exemplos que apresenta, e tendo como base a minha sensibilidade de falante, creio que ambas as expressões — uso de «espaço vazio» ou, apenas, de «espaço» — estão correctas.

Pergunta:

Gostaria de saber se, na frase «a delimitação dos objectivos não tem outra função que não...», fica melhor «que não» ou «senão».

Eu acho que o correcto é senão, mas gostava de saber a vossa opinião.

Obrigada.

Resposta:

No excerto em apreço, o que é correcto é escrever senão. O sentido geral é restritivo, e senão, mantendo a estrutura da frase, poderia ser substituído por a não ser: «A delimitação dos objectivos não tem outra função a não ser...»; Colocando a frase na afirmativa, e com as devidas alterações, claro!, seria necessário introduzir um advérbio de exclusão , ou apenas, para manter o sentido: «A delimitação dos objectivos só tem a função de...»

A expressão que não em frases como «A delimitação dos objectivos tem uma função orientadora, que não controladora» tem um valor de oposição, e o que corresponde a uma conjunção adversativa, de uso raro hoje em dia, diga-se.

Pergunta:

Explique as diferenças morfológicas e semânticas dos pares: escrever, escrevinhar e ferver, fervilhar.

Resposta:

Do ponto de vista morfológico, o que me ocorre dizer é que em escrever e ferver estamos perante palavras simples, verbos no infinitivo, enquanto em escrevinhar e fervilhar estamos perante palavras derivadas, igualmente verbos no infinitivo, mas cujo sentido sofreu, por via da derivação, alteração de sentido.

Para ferver, o dicionário em linha da Porto Editora apresenta os seguintes sentidos:

verbo intransitivo
1. entrar ou estar em ebulição
2. movimentar-se como um líquido em ebulição; borbulhar
3. escaldar; queimar
4. Figurado:
 – sentir grande calor

 – sentir grande inquietação; agitar-se

 – sentir vivamente uma paixão

 – existir em grande número; fervilhar
8. fermentar o mosto no balseiro, na cuba ou no lagar

verbo transitivo
Cozer num líquido em ebulição;
Ferver em pouca água: exaltar-se por pouca coisa, irritar-se com facilidade

Por seu lado, fervilhar é apontado, no mesmo dicionário, como verbo intransitivo, com os seguintes valores:

1. ferver pouco mas continuamente
2. existir em grande quantidade; pulular
3. mexer-se incessantemente
4. Figurado: sentir grande inquietação; agitar-se

Pergunta:

Vejo bastante oscilação no uso e nenhuma referência, nas gramáticas, quanto à análise da expressão «qual seja» em frases como:

«O sujeito tem um papel importante na frase, qual seja o de conjugar o verbo.»

Entendo essa expressão como uma oração adjetiva explicativa, por isso não uso vírgula após o «qual seja». Mas vejo que se usa bastante como uma intercalação («... papel importante, qual seja, o de conjugar...»). Como devo usar essa expressão, entre vírgulas, ou não? E qual a análise correta das orações da frase que ora apresento como exemplo?

Obrigado pela atenção.

Resposta:

Pela análise dos exemplos que observei no Corpus do Português, parece-me que a expressão é usada com dois sentidos levemente distintos: quando ocorre entre vírgulas é equivalente a «ou seja», como se estivesse a explicitar o sentido do que está antes:

1. «O crime não produz o efeito desejado, qual seja, a morte...»

Quando aparece apenas antecedido de vírgula tem, sobretudo, um valor expletivo, ou de realce:

2. «Todas as informações nasceram de uma fonte teoricamente insuspeita e qualificada, qual seja a Procuradoria de Justiça do Rio de Janeiro…»

Curiosamente, em ambos os casos a expressão pode ser omitida sem grande alteração de sentido:

1.1. «O crime não produz o efeito desejado, a morte...»

2.1. «Todas as informações nasceram de uma fonte teoricamente insuspeita e qualificada, a Procuradoria de Justiça do Rio de Janeiro…»

Pela sua interpretação, ao considerar a expressão como uma oração adjectiva explicativa, está a atribuir-lhe um sentido equivalente a «ou seja», pelo que deverá colocar a expressão entre vírgulas. Note-se que é esse o procedimento previsto na língua portuguesa para as orações adjectivas explicativas, sendo esse facto que, formalmente, as distingue das relativas restritivas.

Quanto à análise dessa expressão, em 1 poderemos, efectivamente, como diz, considerar que equivale, de certo modo, a uma oração relativa explicativa. Porém, se a compararmos com uma relativa explicativa típica, do tipo:

3. «O João, que é um jovem muito perspicaz, percebeu logo a situação»,

vemos que, quer do ponto de vi...