Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Gostaria de saber qual é a semelhança entre a origem das línguas e a origem das pessoas.

Obrigada.

Resposta:

A pergunta não é clara, mas vou tentar responder. Houve um período em que a investigação em linguística histórica confundiu um pouco a origem de uma língua com a origem étnica do povo que a falava. Contudo, é óbvio que esta ideia é falsa, porque o português deriva do latim que surgiu na Itália, mas os portugueses não têm apenas origem italiana. É, porém, verdade que a presença dos Romanos na Península Ibérica entre o século II a. C. e o século V d. C. deve ter sido de tal maneira intensa, que os povos ibéricos deixaram de falar as suas línguas e passaram a usar o latim, porque havia muitos colonos romanos.

Esta situação verifica-se, pois, em situação de colonização, originando casos em que um povo deixa de falar a língua que lhe é própria e passa a usar a que é de um invasor. Foi o que aconteceu na Europa com os irlandeses, que deixaram o irlandês e adoptaram o inglês; ou, na América do Sul, em que muitas comunidades indígenas prescindiram das suas línguas e passaram a usar o espanhol ou o português. E o mesmo se passou (ou se está a passar) em África, na Ásia ou na Oceânia.

Pergunta:

Trabalho há 18 anos em colégio como assessora e dou aulas para nove turmas com faixa etária entre 6 e 15 anos.

 

Em roda de colegas, conversando sobre sotaques, afirmei que cientificamente o sotaque mais semelhante à norma culta (língua portuguesa) é o do carioca. Fui advertida e desafiada.

Gostaria de uma explicação científica e argumentada. Será que estou certa? Agradeço a atenção antecipadamente.

Resposta:

Inês Duarte (Português: Instrumentos de Análise, Lisboa, Universidade Aberta, 2000, pág. 25) considera que «[…] no caso do português brasileiro, a variedade que se impôs como padrão é utilizada pelas camadas mais cultas do Rio de Janeiro e de S. Paulo». No entanto, Paul Teyssier (Manual da Língua Portuguesa, Coimbra, Coimbra Editora, 1989, pág. 17) adverte: «A norma de Portugal é muito fácil de definir, pois é objecto de um vasto consenso e foi estudada muitas vezes. A do Brasil, pelo contrário, põe um problema específico, pois está longe de ser universalmente reconhecida pelos próprios brasileiros. Enquanto no Brasil não se pode estabelecer um consenso como em Portugal, o enunciado da norma brasileira será, por vezes, necessariamente vago e impreciso.»

 

Pergunta:

Qual a origem da palavra turismo?

Resposta:

Segundo José Pedro Machado (Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa), a palavra turismo é uma adaptação do inglês tourism, através do francês tourisme. Esta relação etimológica é confirmada pelo Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa e pelo Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa, de Antônio Geraldo da Cunha. A palavra turismo terá sido introduzida na língua portuguesa no século XX.

Resta explicar que terá sido a aristocracia inglesa a responsável pela criação do termo e do conceito em questão. Era hábito no século XVIII enviar os jovens ingleses, de meios nobres ou abastados, numa viagem pela Europa (normalmente, até Itália), para completar a sua educação.

 

N.E. – (12/08/2017) Formado da palavra turismo, surgiu nos últimos tempos o neologismo turismofobia (turismo + fobia, «aversão», «medo»), a propósito de reações hostis à sobrelotação de turistas nalgumas zonas turísticas europeias, como Paris, Florença ou Barcelona. No

Pergunta:

Desejava saber se um topónimo inclui o tipo de artéria (rua, avenida, etc.) ou se se refere apenas à designação (Boavista, Miguel Bombarda, etc.).

Obrigada.

Resposta:

Num núcleo urbano, as artérias andam sempre associadas aos nomes que as individualizam. Assim, uma coisa é falar da Avenida da Boavista, e outra é mencionar a Boavista, zona que abrange não só a avenida do mesmo nome, mas também as suas imediações.

De notar que o termo topónimo não se aplica apenas às ruas (identificadas por placas toponímicas) de um aglomerado urbano. Os nomes de cidades, vilas, aldeias e simples lugares são também topónimos.

Pergunta:

Vi numa resposta vossa relativamente ao nome Valter que o utilizam sem acento, como aliás surge em regra na comunicação social.

Todavia, ninguém pronuncia «Valtér» como deveria (estando escrito «Valter»), visto a palavra terminar em er, mas «Válter». Acresce que no bilhete de identidade o nome surge com acento.

Gostaria de um esclarecimento vosso a este respeito.

Resposta:

Os nomes próprios portugueses seguem, em princípio, as regras da ortografia vigente. Se temos, como nomes comuns, póquer, ácer, carácter, com acento gráfico na penúltima sílaba, porque são palavras graves, então também teremos de escrever Válter, de modo a pronunciar este nome como palavra grave. A forma Valter terá de ser lida como palavra aguda (com acento tónico na última sílaba), à semelhança de colher ou mulher.

Observe-se, contudo, que o Vocabulário da Língua Portuguesa (1966), de Rebelo Gonçalves, consagra a forma Válter, como aportuguesamento do inglês Walter e do alemão Walther. Também com origem nestes nomes, existem as formas mais antigas Gualter, Gualtério e Gualtero.