Pergunta:
Gostaria de saber dos especialistas do Ciberdúvidas o que acham quanto à gramaticalidade, adequação e registro da seguinte frase, dita ontem pela minha esposa, que é tcheca, mas fala excelente português: «Espero não perdermos o ônibus.» Não me parecendo tão comum dita construção, creio que usar o subjuntivo aí teria sido mais corriqueiro — «Espero que não percamos o ônibus» —, ou mais popularmente, pelo menos no Brasil, «espero que a gente não perca o ônibus».
Gosto do jeito que ela raciocinou: se o infinitivo (acredito pessoal neste caso) se usa com o verbo esperar quando o sujeito de ambas as orações é o mesmo («espero pegar o ônibus», melhor do que um estranhíssimo e talvez agramatical «espero que eu pegue o ônibus»), não se poderia usá-lo também no referido caso, apenas acrescentando-lhe a marca de primeira pessoa do plural -mos? Daí vieram-me à mente casos, na minha percepção menos freqüentes, como «Creio terem razão» (em vez de «Creio que têm/tenham razão») e por isso acho bem possível que a frase supracitada seja gramatical (e pessoalmente acho-a muito elegante, portanto espero uma resposta positiva da parte do Ciberdúvidas).
Muito obrigado pela ajuda a dirimir esta questão.
O sempre amigo do Ciberdúvidas,
Resposta:
A frase que a sua mulher construiu é perfeitamente gramatical em português europeu, uma vez que o verbo esperar pode seleccionar tanto uma oração finita com o verbo no conjuntivo como uma oração não finita de infinitivo, quando o sujeito da oração subordinante e o sujeito da subordinada não são correferentes. É o caso da frase em apreço: o sujeito da oração subordinante é «eu» (subentendido), e o da subordinada, «nós» (também subentendido). São, portanto, equivalentes e correctas as seguintes frases:
(1) «Espero que não percamos o ônibus.»
(2) «Espero não perdermos o ônibus.»
Geralmente, os verbos que têm por complemento uma oração substantiva completiva finita são compatíveis com uma estrutura oracional não finita com o verbo no infinitivo; por exemplo (cf. Maria Helena Mateus et alii, Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa: Editorial Caminho, 2003, pág. 599):
— verbos epistémicos (acreditar, pensar, saber, etc.), declarativos (afirmar, dizer, prometer, etc.) e perceptivos (ouvir, sentir, ver);
— verbos psicológicos (gostar, desejar, esperar).
N. E. (6/...