Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Antes de mais, muito obrigada pelo vosso trabalho, que tanto me ajuda a fazer o meu!

A minha questão prende-se com a necessidade de utilização de aspas ou itálico com estrangeirismos, quando estes são nomes próprios. Aqui ficam alguns exemplos que me causam dúvida:

— A Grand-Place de Bruxelas, ou A "Grand-Place" de Bruxelas?

— O Schloss Hohenschwangau, ou O "Schloss Hohenschwangau"?

— De Stonehenge a Tower Bridge, ou De "Stonehenge" a "Tower Bridge"?

Já li vossa resposta à questão "Como grafar estrangeirismos?", mas não fiquei totalmente esclarecida.

Muito obrigada pela vossa atenção.

Resposta:

Com nomes próprios estrangeiros, o critério é (relativamente) simples: se não há expressão portuguesa consagrada, usa-se o nome estrangeiro sem aspas nem itálico. Nos casos apresentados, escreve-se (o negrito apenas se usa aqui para destaque; noutras circunstâncias não se emprega):

1. Grand-Place de Bruxelas, porque não se usa "Praça Grande de Bruxelas".

2. Palácio de Hohenschangau, porque Schloss significa «castelo» em alemão; não vale a pena traduzir o topónimo Hohenschawangau, embora este seja decomponível em elementos e traduzível: grande (= hoen) condado (= gau) do cisne (= schwan).

3. Escreve-se Stonehenge, uma vez que não há adaptação portuguesa, e Tower Bridge, porque "Ponte da Torre" não está consagrado; contudo, diz-se e escreve-se Torre de Londres, e não "Tower of London".

Pergunta:

Qual a origem do apelido Brazeta?

Resposta:

José Pedro Machado, no seu Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, põe a hipótese de o apelido/sobrenome Brazeta ter origem italiana, sendo a adaptação de Brazzeta, diminutivo de Brazza. Machado relaciona este nome com a forma latina Brattia. De salientar que os nomes latino e italiano designavam uma ilha do mar Adriático que hoje pertence à Croácia e se chama Brač.

Pergunta:

Gostava imenso que dissessem qual é a postura da Academia das Ciências de Lisboa ante questões polémicas/temas controversos. Os meus alunos espanhóis questionam a existência destas questões havendo uma academia da língua portuguesa. Entendo que eles não queiram ou não tenham tempo de reflectir sobre estes temas.

Poderiam exemplificar isto falando do plural dos substantivos compostos? Se calhar há outro tema mais apropriado para responder à minha dúvida. Fiquem à vontade.

Por falar nisto, como os exames oficiais de língua portuguesa deveriam tratar tais situações?

Desde já agradeço imenso a vossa resposta.

Resposta:

Em relação à Academia das Ciências de Lisboa, só consigo dar conta daquilo que se lê nos respectivos estatutos, disponíveis em http://academiadascienciasdelisboa.freehostia.com/joomla/:

«Artigo 4.º

São finalidades da Academia:

a) Praticar e incentivar a investigação cientifica, sempre que possível e necessário de forma interdisciplinar, e tornar públicos os resultados dessa investigação;

b) Estimular o enriquecimento e o estudo do pensamento, da literatura, da língua e demais formas de cultura nacional;

c) Promover o estudo da história portuguesa e suas relações com a dos outros povos e investigar e publicar as respectivas fontes documentais;

d) Colaborar em actividades de educação e ensino e fomentar a sua difusão e aperfeiçoamento;

e) Elaborar os pareceres que o Governo e outros serviços nacionais lhe solicitarem;

f) Participar no intercâmbio cultural com os países estrangeiros em espírito de aberta cooperação;

g) Contribuir, através da investigação, da extensão cultural e da discussão de ideias, para a valorização do povo português em todos os aspectos.

Artigo 5.º

A Academia é o órgão consultivo do Governo Português em matéria linguística.»

Nos estatutos, pode ainda ler-se no artigo 17.º que as sessões das classes académicas (a Academia tem duas classes, a de Ciência e a de Letras) podem ter por objecto «quaisquer outros assuntos que o presidente da classe, por iniciativa sua, por solicitação do presidente da ...

Pergunta:

Qual a origem da palavra "arraiá", utilizada em festas juninas? Ela tem alguma origem na palavra arraial?

Resposta:

O Dicionário Houaiss regista arraial com vários significados; entre eles, tem pertinência para esta resposta o de «cenário para festas juninas que imita antigos lugarejos do interior». É, pois, plausível considerar arriá como variante de arraial, dada a semelhança fonética e a identidade semântica destas palavras.

Pergunta:

Qual o significado de «hora de burro»? É uma expressão utilizada em Portugal?

Muito obrigado!

Resposta:

Parece que «hora do burro» significa as horas a meio do dia em que se sente sonolência, quando está calor. É o que consegui apurar de uma página em espanhol, na qual se explica a origem desta expressão:

«Há pouco tempo estive em Maracaibo [capital do estado de Zulia, Venezuela], entre as muitas coisas que fiz no curto espaço de tempo que lá estive, dei um passeio no eléctrico, que faz um percurso por muitos dos sítios mais representativos e turísticos da cidade, como são algumas igrejas, velhos hotéis e casas de pessoas reconhecidas na região, entre elas, "pa que Luis", cervejaria muito conhecida pela "gaita zuliana" [música tradicional de Maracaibo].

Entre as histórias que nos contaram enquanto fazíamos o percurso, está a de «a hora do burro» resultar de antigamente na cidade haver um eléctrico puxado por mulas, que por volta do meio-dia se atiravam ao chão e se negavam a puxá-lo até que passasse pelo menos uma hora e o calor não cedesse um pouco. Por isso, o período que vai das 12 até às 2 da tarde é chamdo "a hora do burro". Não sei se esta história é certa, mas pelo menos é muito curiosa.»1

De qualquer modo, não sei qual é exactamente a origem da expressão: é ibérica, sul-americana, ou tem outra proveniência? Foi formada em espanhol, em português, ou noutra língua?

Em português europeu, julgo que a expressão é rara, para não dizer desconhecida, mas consegui descobrir uma ocorrência num texto em linha (o itálico é meu):

«Interrogo-me — sempre me interroguei! — sobre coisas como estas que, de tão óbvias, só por serem faladas a sós comigo, na penumbra das sestas forçadas (a ouvir ladrar os cã...