Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Qual o acto ilocutório presente na frase «E pedi, mais que tudo, uma coisa que eu costumo pedir aos meus alunos: lealdade»?

Resposta:

Trata-se de um acto ilocutório assertivo, uma vez que pela frase «[...] o locutor compromete a sua responsabilidade sobre a existência de um estado de coisas e sobre a verdade da proposição enunciada (asserções, descrições, constatações, explicações, etc.) [...]» (Dicionário Terminológico). No caso, o locutor responsabiliza-se pela verdade da existência de um estado de coisas, a da formulação de um pedido, feito num momento anterior àquele em que se profere a frase.

Pergunta:

As minhas sinceras felicitações pelo vosso trabalho.

Venho, muito grata, pedir a fineza de me esclarecerem qual a pronúncia correcta da palavra: "pólipo", ou "polipo"?

Também gostaria de saber porque é que se diz que uma pessoa se "meteu em copas", quando não se manifesta sobre determinado assunto.

Resposta:

Agradecemos as suas felicitações.

A grafia e a pronúncia mais correctas da palavra em questão é pólipo (ver Textos Relacionados).

Sobre «meter-se em copas», diga-se que a forma registada é «fechar-se em copas», que, segundo Orlando Neves, no seu Dicionário de Expressões Correntes (Lisboa, editorial Notícias, 1999), significa «calar-se, silenciar» e «[p]rovém do jogo de cartas conhecido como voltarete».

 

Cf. De onde saiu a expressão «fechar-se em copas»?

Pergunta:

Minhas saudações. Qual, por gentileza, é a origem do nome Álvaro, dos sobrenomes Ferreira, Correia, Barros e Lima? Há possibilidade de serem de origem lusitânica?

Muito grato antecipadamente.

Resposta:

Consultando José Pedro Machado, Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, lê-se o seguinte acerca da etimologia de Álvaro:

«De origem ainda controversa: Meyer-Lübke, Romanische Namenstudien. I, 8, 81, II, 73, deriva de al-. alemão moderno alls, "todo, muito", e *wars, "atento, circunspecto"; Piel (s.v. Alvar) prefere como segundo elemento um der. do gótico warjan, sax[ónico] arc[aico] waron waran, "o que se ofende de todos"; ver Nunes, p. 44; Antr[oponímia Portuguesa de Leite de Vadconcelos]., p. 33. Estas explicações parecem forçadas. A popularidade do nome deve-se ao célebre escritor cristão Álvaro de Córdova (séc. IX) e ao beato Álvaro de Córdova (séc. XV, talvez nascido em Lisboa, festejado a 19-II). Latinizado Alvarus, este dever-se-ia a Alver, de Alvered (cf. Aliverdus, donde o esp[anhol] Alvarado), ou a forma apocopada de Alvaradu- (ver Alvarado). Em qualquer caso, o -v- é sonorização do -f- de AElfraed (> ingl[ês] Alfred, ver Alfredo), ligado ao germânico alfi, "elfo", radi, "conselho", influenciado pelo hispânico albar, der[ivado] do lat[im] albor (de albus, "branco"). O -v- era muitas vezes escrito -u-, daí outras formas como Aluer, por Alver (dada Withycombe, p. 14, como presentes no Domesday Book, séc. XI). Em fr[ancês] medieval Aluaru-, ou Alueru-, ter dado Alveré, Auveré. No séc. XIII:  "Don Aluaro ren non lhis da", Pêro da Ponte, no C. B. N., n.º [1558]. Fernão Lopes usava com frequência a var[iante] Álvoro. "constramgeo tamto este Álvoro Paaez..." na Crón. de D. João I, I, cap. 5, p. 12. Antes de voc[ábu...

Pergunta:

Ouvi recentemente o provérbio «Sarampo, sarampelo, sete vezes vem ao pêlo» num programa de rádio. Efectuei uma pesquisa para tentar perceber o seu significado, mas sem resultados. Poderia o Ciberdúvidas ajudar-me?

Obrigado.

Resposta:

O provérbio em apreço tem a seguinte variante:1

«Sarampo, sarampelho, sete vezes vem ao pêlo.»*

Trata-se de um dito que pertence ao conjunto dos provérbios relativos à saúde (por exemplo, «a doença vem a cavalo e vai a pé»; «a tinha é pior que a morrinha»; «água danificada fervida ou coada»)2, muitos dos quais reflectem práticas e crenças sobre a prevenção ou origem da doença ou a sua terapêutica.

Neste caso, o provérbio parece resultar da crença na possibilidade de uma pessoa poder ficar doente com sarampo até sete vezes, o que também remete para um certo pensamento mágico que investe os números de carga simbólica. Sobre a racionalização do provérbio, recomendo a leitura do blogue Provérbios Populares Portugueses (poste de 27 de Setembro de 2009).

1 Ver M.ª Alice Moreira dos Santos, Dicionário de Provérbios, Adágios, Ditados, Máximas, Aforismos e Frases Feitas, Porto, Porto Editora, 2000, e António Moreira, Provérbios Portugueses, Lisboa, Editorial Notícias, 2003.

2 Santos, op. cit.

* Com o Acordo Ortográfico de 1990 – e conforme o ponto 9 da Base IX – não se acentuam as palavras homógrafas paroxítonas, como é o caso de 

Pergunta:

Considere-se a frase «Ele tomou vacina contra gripe suína».

Na sintaxe, «contra gripe suína» é um adjunto adnominal?

Resposta:

Há duas possibilidades de análise:

a) «contra gripe suína» é adjunto adverbial, fazendo parte do predicado da frase («tomou vacina contra gripe suína»);

b) o constituinte em apreço é complemento nominal (ou do nome), porque a palavra vacina pode seleccionar um complemento oblíquo («vacina contra qualquer coisa»).

Em Portugal, de acordo com o Dicionário Terminológico, a função sintáctica referida em a) tem a designação de modificador, neste caso, do grupo verbal «tomou vacina contra gripe suína». Deve também observar-se que, em português europeu, se prefere usar o artigo definido junto dos nomes vacina e gripe no contexto em análise: «tomou a vacina contra a gripe suína».