Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

O aumentativo de ladrão, ladravaz, faz referência à forma corpórea do ladrão, ou seja, seria um ladrão grande fisicamente falando; ou faz referência a conduta criminosa, ou seja, um ladrão que pratica, de modo perito, muitos roubos? Ou ambas definições estão corretas?

Desde já, cordialmente agradeço.

Resposta:

Considerando que ladravaz é definido como «grande patife», «grande patife», «grande tratante»1, todas estas apreciações também morais, é de concluir que a palavra em questão denota a pessoa que se distingue sobretudo por uma conduta criminosa, imoral, e não propriamente pela sua grande estatura  ou forte compleição. Note-se, aliás, que ladravaz (os dicionários também registam o sinónimo ladravão) parece ocorrer com tom depreciativo, sugerindo mediocridade e falta de imaginação, como sucede no seguinte contexto:

(1) «Dizia-te igualmente, expondo uma regra que considero essencial para gatuno debutante, que nunca roubasses em tom menor, que deixasses o pequeno roubo para o pequeno ladrão, aquele que não quer verdadeiramente enriquecer, prosperar, chegar entre lágrimas e gritas de honra ofendida às páginas mais brilhantes das revistas do coração e partes mais abaixo, ou seja para aqueles que quer apenas aguentar o cadáver no dia a dia, o ladravaz de vistas curtas, sem olhos para o futuro» ("Suplemento a um suplemento ou requiem por um ladrão", 27/03/1997, in Corpus do Português).

Ladravaz e ladravão, como ladroaço (ou ladronaço; cf. dicionário de Caldas Aulete), constituem aumentativos irregulares, fixados pela tradição. Registaram, portanto, certo grau de evolução semântica, afastando-se do simples valor aumentativo original.

 

1 Foram consultados o dicionário da português da Infopédia, o

Pergunta:

Embora a palalavra "concertionista" não exista no vocabulário português, na minha muito modesta opinião, penso que a mesma deve ser usada quando se referir a um tocador de concertina.

Ao logo do tempo têm sido introduzidas outras palavras que não existiam mas que correspondem a uma designação correta. Ora, se um tocador de acordeão é designado acordeonista, um tocar de concertina também deve ser um "concertionista" ou "concertinista".

Obrigado.

Resposta:

Apesar de não estar dicionarizada, a palavra concertinista está bem formada, é correta e, portanto, existe, como até várias ocorrências em páginas da Internet confirmam.

Já "concertionista", que segue o modelo de acordeonista (de acordeão), é forma não aceitável, visto que, na derivação da palavra, o radical a considerar é concertin-, de concertina, e não "concertion-", que pressupõe uma palavra inexistente ("concertião" ou "concertiona"?).

Pergunta:

Sempre cresci a ouvir a palavra esfregona [em Portugal], e mesmo quando aprendi inglês, aprendi que mop corresponde a esfregona.

De há uns poucos anos para cá, tenho visto a palavra "mopa" em grandes superfícies comerciais, e parece que até consta no dicionário.

Podem por favor esclarecer de onde surgiu esta palavra?

Obrigado.

Resposta:

Como a própria pergunta parece implicitar, a palavra mopa tem origem no inglês mop e é termo que se tem popularizado em Portugal, onde já chegou aos dicionários, para denominar «[um]pano ou esfregão usado para limpar o chão» ou «[um] utensílio para limpeza do chão constituído por um cabo com tiras de pano ou esponja na extremidade» (Infopédia; cf. também  Dicionário Priberam da Língua Portuguesa).

No território do continente, terá difusão relativamente recente, ao lado de esfregona, que será ainda a palavra mais corrente. Contudo, está já enraizada no uso dos Açores, na variante "mapa", provável imitação da pronúncia norte-americana do o de mop, certamente devida aos fortes laços do arquipélago com os EUA, tanto em resultado da emigração como da própria presença militar deste país (na base das Lajes, na ilha Terceira).

Pergunta:

Qual a origem da palavra Guimbra?

Resposta:

Trata-se de um topónimo sobre cuja origem não há consenso.

Poderá ser variante de um outro, Guímara, ao que parece, com origem num nome de pessoa (antropónimo) de origem germânica, talvez proveniente do radical germânico *weig-, que significaria «luta» (cf. José Pedro Machado, Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, 2003).

No entanto, há também quem avente (cf. A. Almeida Fernandes, Toponímia Portuguesa. Exame a um Dicionário, Associação para a Defesa da Cultura Arouquense, 1999, pp. 373/374) a hipótese de Guimbra ter origem num nome comum pré-latino há muito perdido, de significação imprecisa, com a terminação -ara, que ocorrerá noutros nomes comuns como cântara e gândara e em topónimos como Tavara (forma antiga que deu o atual Távora, no concelho de Arcos de Valdevez) e Tâmara (Arouca e Évora).

Pergunta:

É correto dizer-se «vou fazer skate»?

Comummente as pessoas utilizam a expressão «vou andar de skate», mas skate é também a denominação de um desporto, portanto, seria correto utilizar a expressão «fazer skate»?

Resposta:

Não há razão linguística para impedir o uso de «fazer skate» justamente porque já é considerado um desporto: assim como se diz «fazer natação» ou «fazer ginástica», também poderá dizer-se «fazer skate».

Sobre o termo skate, recorde-se que, embora este possa ser substituído por patim, ou pelo seu aportuguesamento fonético esqueite (cf. Dicionário Houaiss), a verdade é que a prancha dotada de rodas e a modalidade desportiva associada continuam a ser conhecidas e referidas na escrita sob a forma inglesa skate.