Carlos Marinheiro - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Marinheiro
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Carlos Marinheiro (1941–2022). Bacharel em Jornalismo pela Escola Superior de Meios de Comunicação Social de Lisboa e ex-coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa. Colaborou em vários jornais, sobretudo com textos de análise política e social, nomeadamente no Expresso, Público, Notícias da Amadora e no extinto Comércio do Funchal, influente órgão da Imprensa até ao 25 de Abril.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Qual é o alcance injurioso da palavra palhaço?

Resposta:

A palavra palhaço (do it[aliano] pagliaccio) significa, em sentido figurado, pejorativo, «pessoa que está sempre a brincar e/ou a dizer piadas nem sempre com muita graça»; «pessoa que não é possível levar a sério»; ou «pessoa que muda constantemente de opinião». Assim, se alguém chama palhaço a um indivíduo que não é «personagem cómica e burlesca de circo que diverte o público com brincadeiras, anedotas, etc.», está, em princípio, a injuriá-lo, embora não se possa considerar uma injúria muito grave.

Temos de ter em conta que a profissão de palhaço é uma das mais dignas, especialmente pelo fa{#c|}to de proporcionar momentos de alegria às crianças.

[Fonte: Dicionário da Língua Portuguesa 2008, da Porto Editora]

Cf.:  Como inventar um palavrão?20 insultos inconvenientes (e pouco conhecidos…)

Pergunta:

Qual a origem da palavra adoção ou adotar?

Resposta:

A palavra adopção, de acordo com o Dicionário Houaiss, vem do «lat[im] adoptĭo,ōnis, "adoção", de adoptatĭo,ōnis, "adoção, perfilhamento"»; trata-se de «ação ou efeito de adotar, de aceitar (alguém ou algo)» ou, como termo jurídico, de «processo legal que consiste no ato de se aceitar espontaneamente como filho de determinada pessoa, desde que respeitadas as condições jurídicas para tal». Por extensão de sentido, é «aceitação espontânea de (pessoa ou animal, ger[almente] doméstico) como parte integrante da vida de uma família, de uma casa» ou «aceitação, admissão do que antes era externo, alheio, estranho ou não era conhecido ou cogitado».

Adoptar, segundo o mesmo dicionário, deriva do «lat[im] adopto,as,āvi,ātum,āre, "adotar, perfilhar, escolher, pôr o seu nome em alguma coisa, enxertar"»; significa, como termo jurídico, «aceitar legalmente (alguém) [como filho], concedendo-lhe direitos; perfilhar». Por extensão de sentido, quer dizer, entre outras coisas, «ocupar-se de outrem como se fora filho» ou «aceitar ger[almente] por um período relativamente extenso ou permanente (idéia, doutrina, opinião etc.) como boa ou necessária; optar por; assumir, seguir».

Pergunta:

Ouço e leio com frequência esta frase: «Vou tomar uma ducha» (banho de chuveiro). Pensei que o correcto seria «um duche». Na gíria futebolística então é corrente: «vai para o duche mais cedo», etc. Acontece que há dias, ao ler A Cidade e as Serras, Eça escreveu uma frase em que entra a palavra ducha referente a banho. Não sei se de chuveiro ou outra forma de banho. Não me lembro da frase, mas anotei para colocar a pergunta: Qual a forma correcta, ou serão os dois géneros correctos?

Resposta:

Actualmente, em Portugal, chama-se duche (do fr[ancês] douche) ao «jacto ou chuveiro de água que se aplica ao corpo de alguém, com fins higiénicos ou terapêuticos; banho de chuveiro». Além de duche, o Dicionário da Língua Portuguesa 2008, da Porto Editora, também regista ducha, nome (substantivo) feminino do Brasil, mas remete-nos para duche, o termo usual em português europeu. Contudo, usual não significa que o outro é incorre{#c|}to, dado que se trata, até, da forma usual em português do Brasil.

Assim, a consulta do Dicionário Eletrônico Houaiss permite-nos ver que regista a palavra duche e diz que é regionalismo de Portugal, mas encaminha-nos para a entrada ducha, onde encontramos todas as acepções desta palavra: «jato de água lançado sobre o corpo com finalidade higiênica e/ou terapêutica»; por extensão de sentido, «banho de chuveiro com jato forte de água»; numa derivação por metonímia, «local onde se toma esse banho» ou «espécie de chuveiro com jato forte»; numa derivação por metáfora, «grande quantidade» (por exemplo, «d[ucha] de ofensas») ou «oportunidade, momento de alívio; desafogo» (a exemplo de «vislumbrar o antigo orientador entre os espectadores funcionou como uma d[ucha]». Trata-se, ainda, de um regionalismo do Brasil (derivado por metáfora) com o significado de «censura severa; repreensão». Em medicina, é «administração de jatos de água, ar ou gases com finalidade terapêutica».

Pergunta:

Indescortinável existe (com o significado de «não descortinar qualquer coisa»)?

Resposta:

O adjectivo indescortinável (de in- + descortinável) encontra-se registado no Dicionário Eletrônico Houaiss, com o significado de «não descortinável; que não se pode descortinar».

Por exemplo, o Dicionário da Língua Portuguesa 2008, da Porto Editora, só acolhe o antónimo da palavra: descortinável («que se pode descortinar; visível; compreensível»).

De qualquer modo, a palavra existe, está bem formada e já se encontra dicionarizada.

Pergunta:

Gostaria de saber o plural de arco-íris e de mil-folhas.

Resposta:

O plural de mil-folhas é, de acordo com a MorDebe, mil-folhas: igual ao singular. Mil-folhas, em culinária, é «bolo de forma quadrangular composto por duas capas de massa folhada e recheado com um creme consistente à base de claras e gelatina»; em botânica, é o mesmo que milefólio, ou seja, «planta de raiz, da família das Compostas, espontânea, subespontânea e cultivada em Portugal, também conhecida por mil-em-rama, mil-folhas, milfolhada, aquileia, etc.» [Dicionário da Língua Portuguesa 2008, da Porto Editora]

Quanto ao plural de arco-íris, é arcos-íris. Veja, por favor, a resposta anterior Arcos-íris.