Bárbara Nadais Gama - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Bárbara Nadais Gama
Bárbara Nadais Gama
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Licenciada em Ensino de Português Língua Estrangeira, mestre em Português Língua Segunda/Língua Estrangeira pela Universidade do Porto e doutoranda em Didática de Línguas. Foi professora de Português no curso de Direito da Universidade Nacional Timor Lorosae- UNTL, no ano letivo de 2011-2012.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

A palavra meia-noite pode ser considerada da família de noite?

Obrigado.

Resposta:

A palavra meia-noite é considerada da família de noite. O substantivo em questão é um composto morfossintático, isto é, é resultado da associação de um adjetivo – meia – a um substantivo – noite.

Na atualidade, o Dicionário Terminológico, criado para apoio do estudo da gramática no ensino básico e no secundário, define «família de palavras» como o «conjunto das palavras formadas por derivação ou composição a partir de um radical comum», dando como exemplo o conjunto formado por mar, maré, marítimo, marinheiro, marina, que partilham o mesmo radical, mar-.

Tendo em conta esta definição, os vocábulos meia-noite e noite pertencem à mesma família de palavras, uma vez que ambos partilham a mesma palavra e, logicamente, o mesmo radical. Recorde-se que noite evoluiu do «latim. nox, ctis [...]; formas históricas sXIII noite, sXIII noyte, sXIV nocte, sXIV noicte» (Dicionário Eletrônico Houaiss, Rio de Janeiro: Instituto Houaiss/Objetiva, 2001).

 

Pergunta:

Gostaria de solicitar por favor a vossa ajuda no sentido de averiguar a forma correta: paleopatologista, ou paleopatólogo?

Muito obrigada.

Resposta:

A forma correta é paleopatologista. Este termo poderá formar-se de paleopatologia, que surge, como se pode verificar numa tese de mestrado intitulada Pressentindo o Silêncio: A perda de osso relacionada com o envelhecimento na Colecção de Esqueletos Identificados do Museu Antropológico, de Francisco Curate. 

Apesar de nenhum destes termos ocorrer nos dicionários consultados – Dicionário Piberam da Língua Portuguesa, Dicionário Houaiss e Dicionário da Língua Portuguesa da Infopédia –, o termo que melhor parece servir a um especialista de paleopatologia é efetivamente paleopatologista, tal como a um especialista de patologia se chama patologista.

Pergunta:

Existe a expressão «estão completadas»?

Resposta:

A expressão apresentada é aceitável em português. O Dicionário Eletrônico Houaiss atribui origem latina a completo, não se tratando portanto de um particípio passado (irregular) que, do ponto vista sincrónico, faça parte de completar:

«lat. completus, a, um, part. de complere; ver plen(i)-; a datação é para o adj. `aquilo de que não falta parte´.»

Ainda sobre este tipo de adjetivos que são historicamente particípios, a Gramática do Português, da Fundação Calouste Gulbenkian, classifica-os (pp. 1491/1492) como «formas curtas [que] têm unicamente propriedades adjetivais, visto que não podem ser usadas em contextos onde predomina a natureza verbal do particípio – ou seja, nos tempos compostos e orações passivas». Com efeito, a mesma fonte dá como exemplo o adjetivo correto, «cujo sentido já não é o mesmo de corrigido – daí o facto de o particípio regular poder ser usado, com um sentido diferente do de correto, nas orações copulativas, como particípio adjetival – cf. Os exercícios ficaram/estão corrigidos)».

Com as mesmas características, no Corpus do Português verifica-se a existência do termo completado em orações com verbos copulativos:

1. «De facto, o gesto de confraternização e de solidariedade da Sociedade Nacional de Belas-Artes de Lisboa, considerando como portugueses os artistas brasileiros e abrindo de par em par as salas das suas exposições à arte da grande República, carece, para se converter num poderoso factor de aproximação, de ser completado por providências especiais do Estado português (Joaquim Paço d´Arcos, Tons Verdes em Fundo Es...

Pergunta:

No Brasil, temos expressões como «o escambau», «o escambau a quatro» e «(ser) o escambau», registrados no Houaiss. Mas não sabemos a origem da palavra escambau. Alguma pista do seu étimo?

Resposta:

Sobre o termo escambau, registado no português do Brasil, o Dicionário Eletrônico Houaiss considera-o de origem obscura, «talvez relacionado com a raiz de cambada, com alt. de sufixo para -al, ´grande quantidade´, e depois grafado com -u, seguindo a pronúncia do -l final, predominante no Brasil, *os cambal > *o scambal > o escambau, ou ainda da raiz de cambo/camba, por processo semelhante; levantou-se ainda a possibilidade de o voc. originar-se de *os cambau > *´s cambau > *scambau > escambau, hipótese que se poderia admitir do ponto de vista da fonética sintática, mas que seria de difícil sustentação do ponto de vista semântico [...]» (ver também artigo de Sérgio Rodrigues, "A palavra ´escambau´ e o escambau", publicado na versão em linha da revista Veja de 11/11/2014).

Pergunta:

O verbo "espetacularizar" existe? Ou algo que signifique tornar qualquer coisa um espetáculo, por exemplo como em «espetacularizar notícias»?

Obrigada.

Resposta:

O verbo que a consulente apresenta não está registado nos dicionários consultados – Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, Dicionário de Língua Portuguesa da Infopédia, e Dicionário Eletrônico Houaiss. 

Contudo, depois de algumas pesquisas, o termo ocorre, algumas vezes, em português do Brasil, tal como se pode verificar no artigo de Micael Herschmann, intitulado: A politização da cultura hip-hop no Brasil contemporâneo

Em suma, o termo ocorre recentemente em páginas da Internet, com o significado de «tornar espetacular», muito embora ainda não tenha registo dicionarístico. Os mais conservadores em relação à língua poderão ter relutância em usar este neologismo, mas, pela capacidade de fazer referência à tendência para encenar, à maneira de um espetáculo, muitos atos de domínio público, parece ficar justificado o uso do novo verbo.