Bárbara Nadais Gama - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Bárbara Nadais Gama
Bárbara Nadais Gama
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Licenciada em Ensino de Português Língua Estrangeira, mestre em Português Língua Segunda/Língua Estrangeira pela Universidade do Porto e doutoranda em Didática de Línguas. Foi professora de Português no curso de Direito da Universidade Nacional Timor Lorosae- UNTL, no ano letivo de 2011-2012.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Posso aceitar, como diminutivo de corpo, corpinho e, como aumentativo, corpão?

Resposta:

A primeira forma de diminutivo que a consulente apresenta está correta. Quanto ao aumentativo de corpo, este pode assumir não só a forma regular corpão mas também outras que se fixaram no uso. 

Celso Cunha e Lindley Cintra (Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Edições João Sá da Costa, pág. 91) assinalam os sufixos diminutivos -inho e -ino, provenientes do latim -innus, como sendo os mais comuns em português; daí a forma de diminutivo corpinho afigurar-se correta. Quanto aos aumentativos em apreço, os mesmos autores consideram que -anzil é o sufixo aumentativo que ocorre em corpanzil e «deve ser composto de -ão + -il com a consoante de ligação -z-». A este, juntam-se mais dois aumentativos da palavra em questão, tal como se pode atestar no Dicionário Eletrônico Houaiss: «Corpanzil: 1. corpo grande, forte, volumoso; corpaço, corpanzão; 2. Derivação: por extensão de sentido. Uso: informal. Indivíduo que possui corpo grande e forte; indivíduo corpulento.» 

Pergunta:

Qual  o significado de «armar à lebre»?

Resposta:

A forma que encontramos registada é «andar à lebre» no Novo Dicionário de Expressões Idiomáticas (Lisboa, Edições João Sá da Costa, 2006), de António Nogueira Santos, que lhe atribui o significado de «visitar amigos e conhecidos na esperança de ser convidado para comer; não ter dinheiro». Acreditamos que a expressão em questão terá assim o mesmo sentido. 

Pergunta:

Imo(a) significa «íntimo(a)», «fundo(a)»?

Resposta:

A palavra imo pode ser usada como substantivo com os significados apontados pelo consulente. De acordo com o Dicionário Eletrônico Houaiss, à palavra imo podem ser atribuídos os seguintes significados: «1. Uso: formal. O mais baixo; inferior, ínfimo; 2. Derivação: por metáfora. Muito íntimo, muito profundo; interno, recôndito. Substantivo masculino: 3. o âmago, o íntimo.»

Pergunta:

Numa frase como «Estou tão, mas tão confusa», qual o valor de mas? Não tem valor de compensação nem de adversidade, por assim dizer. Ainda nessa frase, como se justifica o uso da vírgula aí empregada?

Obrigada!

Resposta:

A conjunção mas, no exemplo dado pela consulente, tem valor de advérbio, e «usa-se para corroborar o que a pessoa acabou de dizer» (cf. Dicionário Eletrônico Houaiss). Tal como no seguinte exemplo: «A moça deixou-o impressionado, mas muito impressionado» (idem).

O uso da vírgula antes de mas, neste tipo de construção em que a palavra vem marcar a repetição, a intensificação e o reforço da ideia que se pretende veicular, acaba por ser o mesmo de qualquer estrutura adversativa («a moça deixou-o impressionado, mas ele soube disfarçar as suas emoções»). No entanto, quando se trata, como é o caso, da repetição de um advérbio, a expressão que marca o processo de intensificação parece ficar interpolada, o que legitima a sua colocação entre vírgulas: «tão, mas tão, confusa» (ou entre travessões: «estou tão – mas tão – confusa»).

Observe-se, porém, que, com advérbios neste tipo de construção, nem sempre se usam vírgulas, tal como se ilustra na seguinte passagem de José Cardoso Pires, em que o advérbio muito modifica o advérbio mais:

«Ouvisse o que ouvisse, o desdenhoso passarão não se descosia. Só muito mas muito mais tarde é que ele voltou a pronunciar-se, e então com toda a alma» (José Cardoso Pires, A República dos Corvos, 1999, in Corpus do Português).

Sendo assim, a sequência «muito mas muito mais tarde» não se afigura incorreta, mesmo que possa aparecer mais adequado «muito, mas muito, mais tarde». Conforme este exemplo, poderia também escrever-se «estou tão mas tão confusa».

Pergunta:

Como devo classificar a palavra microcefálico quanto ao seu processo de formação? A dúvida surge relativamente ao elemento micro, que surge na gramática de Mira Mateus como um prefixo avaliativo (pág. 964), quando me parece estar perante um caso de composição morfológica.

Resposta:

Trata-se de uma palavra que à sua forma-base – cefálico – acrescenta o prefixo micro-. Celso Cunha e Lindley Cintra (Nova Gramática do Português Contemporâneo, 1984, p. 115) incluem micro- entre os pseudoprefixos1, que na prática se comportam como os prefixos. Esta perspetiva permite, portanto, encarar microcefálico como um derivado prefixal.

Contudo, há também fontes que classificam micro- como um radical que figura em vários compostos; tal é a posição do Dicionário Eletrônico Houaiss (edição de 2001), que regista micro- como elemento de composição: «antepositivo [...] na [significação] original de "pequeno", "curto" (não raro antonimizada com macro- ou mega- e megalo-, "grande", em meio de cujos pólos ocorre, por vezes, meso-, "meio", "médio", como em microcéfalo, "de cabeça pequena ou diminutiva", mesocéfalo, "de tamanho médio de cabeça", e macrocéfalo, "de cabeça grande"); ocorre em vocábulos em geral da terminologia científica, do sXIX em diante [...].»

Refira-se ainda a perspetiva da gramática de Mateus et al. (2003), à qual não é necessário recorrer, pois, embora proponha um tipo de análise dos diminutivos que é válida e adequada teoricamente, não é a praticada nos ensinos básico e secundário de Portugal. Com efeito, o Dicionário Terminológico, que se destina a esses níveis de escolaridade, prevê os derivados prefixais e os compostos morfológicos, mas não contempla a existência de prefixos avaliativos.

1 «Os pseudoprefixos caracterizam-se: a) por apresentarem um acentuado grau ...