Ana Carina Prokopyshyn - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Ana Carina Prokopyshyn
Ana Carina Prokopyshyn
24K

Ana Carina Prokopyshyn (Portugal, 1981), licenciada em Línguas e Literaturas Modernas (2006) e mestre em Linguística Geral pela FLUL (2010). Desde 2010 frequenta o doutoramento em História Contemporânea (Lusófona e Eslava). Participou com comunicações e a nível da organização em várias conferências internacionais, e presta serviços em várias instituições como professora de Português para estrangeiros, tradutora e revisora. Atualmente é leitora de Língua e Cultura Russa I e II na mesma universidade e investigadora no Centro de Línguas e Culturas Lusófonas e Europeias. Colabora como consultora de língua Portuguesa no Ciberdúvidas desde 2008.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Qual a origem dos sufixos "-aio", "-garo", "-aco", "-eco", que ocorrem, respectivamente, em gentílicos como malaio, biscaio, paraguaio, uruguaio, búlgaro, húngaro, austríaco, eslovaco, polaco, valaco, checo, sueco, etc.?

Muito obrigado.

Resposta:

Antes de mais, há que distinguir os sufixos dos não sufixos, ou seja, da raiz da palavra. Nos exemplos que nos manda o consulente, apenas -aco é sufixo derivacional, ou seja, é um sufixo que pode ser usado para formar adjectivos de substantivos. O mesmo sufixo é um dos sufixos que indicam «natural de». Indicamos abaixo a respectiva origem:

-aco 1, sufixo tónico (do lat. -accu), como em eslovaco.
-aco 2, sufixo átono (do lat. -acu), como em austríaco.

Quanto a "-aio" e "-garo", não os podemos considerar sufixos, e -eco é um sufixo, mas com uma conotação depreciativa, normalmente usado na formação de alcunhas (ex.: padreco, marreca, careca, etc.) e, na sua maioria, nomes, não adjectivos. A terminação de sueco é pura coincidência, o gentílico deriva do topónimo Suécia : «sueco, alt. da f. ant. suécio (1572), do top. Suécia, adaptação vern. assim como o esp. Suecia, it. Svezia, fr. Suède, ing. Sweden e o al. Schweden do nome do país, em sueco Sverige; o top. origina-se do velho norreno Svearike, Svear-rige 'império, país dos suiões', antigo povo escandinavo mencionado por Tácito (c55-c120 d.C.), na Germânia (ver suião), como habitante do actual território da Suécia; f.hist. 1877 suéco (De Suécia, top.)»

Aos restantes gentílicos também não são afixados sufixos derivacionais, mas apenas flexionais, de...

Pergunta:

A expressão «até logo» tem o mesmo sentido em português europeu e em brasileiro?

Grata pela vossa atenção.

Resposta:

A expressão tem o mesmo significado e existe nas duas variantes, contudo, em português do Brasil não é usada coloquialmente, principalmente nas classes média e baixa, ou por indivíduos sem uma instrução média, o que não acontece no português europeu, em que a expressão não se restringe a nenhum registo específico. Em português do Brasil, as expressões coloquiais equivalentes a «até logo» são:

a) Tchau «n. interjeição 1 até logo, até a vista; n. substantivo masculino 2 aceno, sinal de despedida ou saudação; adeus, adeusinho. Ex.: dar um t.; etim. it. schiavo 'eslavo, escravo', pronunciado tchau nos dialetos do Norte da Itália como expressão de cortesia, com a acp. 'seu servidor, para servi-lo', na red. ciao, passa, no sXX, ao port. do Brasil tchau e esp. da América chau como expressão de despedida; aport. tchau; cp. escravo e eslavo.» (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa)

b) Até depois.

c) A gente se vê depois.

Esperamos ter ajudado.

N.E.: Em PE, o uso da expressão, na maior parte dos casos, aplica-se a uma circunstância em que se espera voltar a encontrar a pessoa a quem nos dirigimos  nesse mesmo dia, o que não acontece em PB.

Pergunta:

Estou a traduzir do polaco para português um livro no qual surgem frequentes referências ao movimento de resistência clandestina das florestas, cujos membros são os «partisans» — palavra existente na Internet e utilizada na tradução do livro de Norman Davis A Europa em Guerra, em itálico. Não gosto da palavra «partisan», que fica «coxa» em relação ao original polaco «partyzant». Gostaria de criar o neologismo «partisante» por associação com o polaco e outras palavras do português como «militante», «simpatizante». A minha editora sugere-me a tradução de «partyzant» como «resistente», que é um termo que, por sua vez, se associa à Resistência Francesa. Os «partisans» foram um fenómeno nos países eslavos ocupados pelos nazis e estão envolvidos por toda uma filosofia de combate. Que pensais?

1) criar o neologismo "partisante"?

2) traduzir como resistente?

3) empregar o termo, que circula na Internet (sobretudo em sites do Brasil) e na referida tradução, "partisan" em itálico?

Obrigada pela atenção.

Resposta:

Sugerimos o emprego do termo partisan em itálico, dado que o mesmo se encontra registado em vários dicionários de língua portuguesa, como, por exemplo, o Dicionário Houaiss:

«partisan, s. m. (sXVII) 1 partidário tendencioso de pessoa, grupo, partido ou causa 2 soldado de guerrilha ¤ etim fr. partisan (-ty- 1477) 'pessoa que toma um partido', (1573) 'banqueiro', (1878) 'combatente que estava ligado a uma pequena unidade', (1827) 'combatente não militarizado', este do it. partigiano (a1442) 'pessoa que toma partido', de parte + -igiano < lat. pars,tis 'parte'; note-se que a acp. que entrou em port. existiu também em it. e no fr.; ver part-»; e no Dicionário Enciclopédico Alfa: «partisan. m. Pal. fr. Membros das organizações secretas de residentes que lutaram contra as forças de ocupação al. durante a 2.ª Guerra Mundial.»

Quanto ao termo resistente, é uma tradução possível, apesar de não literal, o que pode gerar alguma dificuldade de interpretação, pois tem uma acepção muito geral, ao passo que partisan remete especificamente para o significado que se pretende.

Desaconselhamos o emprego de "partisante", pois não faz parte do vocabulário do português; existe, sim, em francês, e é precisamente o feminino de partisan, conforme podemos observar no Grande Dicionário de Francês-Português de Domingos de Azevedo: «partisan [...] || Adj. (faz no fem. partisane, e na linguagem fam. partisante) part...

Pergunta:

Agradecia que me indicassem quais as interjeições que se utilizam para fazer andar (ou andar mais depressa) um cavalo e para o fazer parar.

Resposta:

Na gramática, as interjeições são excluídas de qualquer classificação de classe de palavras, muitas delas não são representadas graficamente, e, quando o são, têm uma grafia oscilante. Cunha e Cintra, 2005, na Nova Gramática do Português Contemporâneo, descrevem as interjeições da seguinte forma:

«Interjeição é uma espécie de grito com que traduzimos de modo vivo as nossas emoções. A mesma reacção emotiva pode ser expressa por mais de uma interjeição. Inversamente, uma só interjeição pode corresponder a sentimentos variados e, até, opostos. O valor de cada forma interjectiva depende fundamentalmente do contexto e da entoação.»

Dito isto, justifica-se a escassez das interjeições apresentadas, dada a oscilação, exiguidade da representação gráfica e da dicionarização das mesmas. Por outro lado, há que ter em conta a possível variação dialectal ou a variedade do português em que se insere a interjeição.

Seguem-se as interjeições encontradas no Dicionário Houaiss para o efeito de incentivar o início ou a cessação da marcha de um equídeo (sublinhado nosso):

a) Incentivar a marcha:

i. «arre1 , interj. (1502-c1536 cf. GVic) 1 voz com que se tocam animais de carga <a., mula!> [...] etim. interj. ár. harr, us. para precipitar a marcha das bestas; a datação é para Gil Vicente, mas o voc. deve ser muito anterior; note-se que, segundo Corominas, não há motivo para considerar a interj. um arabismo, pois teria orig. no som consonântico rr, onom. expressiva universal, us. para forçar a marcha de animais.» 2

ii. «Upa, 1858, n interjeição 1  &#x...

Pergunta:

Ouvi, na comunicação social, falar-se da expressão «opção gestionária».

Nunca tendo ouvido falar desta palavra — "gestionária" —, fiz alguma pesquisa e descobri que se trata de uma palavra com consagração legal, nomeadamente na Lei 12-A/2008, que estabelece o novo regime da função pública em Portugal.

A minha dúvida é: esta palavra existe?

Obrigado.

Resposta:

Como nos foi pedido, verificámos a existência da palavra gestionário, e, realmente, é raro o dicionário que a registe. Contudo, é lícito dizer que pertence ao vocabulário da língua portuguesa, a mesma aparece na base de dados morfológica do português, a MorDebe, e trata-se de um adjectivo formado a partir do verbo gestionar, registado no Dicionário Enciclopédico Alfa: «Gestionar, tr. Gerar, produzir, gestação»; e no Dicionário da Língua Portuguesa de A. de Morais Silva: «Gestionar, v. t. Neol. Produzir gestação em; gerar.»

A palavra gestionário não tem uma entrada só para ela no Dicionário Houaiss, contudo, o mesmo dicionário integra-a na entrada que diz respeito a gest- (sublinhado nosso):

«gest-, elemento de composição, antepositivo, do lat. gĕro (< geso, por rotacismo), is,gēssi,gēstum,gerĕre (< gesere) 'andar com, ter consigo, trazer em cima do corpo; produzir, criar; encarregar-se voluntariamente de; executar, fazer', donde gesta,ōrum (neutro pl. substv. do part. pas. gestus,a,um) 'feitos ilustres, façanhas, proezas; atos, ações (em geral)', gerundĭum,ĭi 'gerúndio', gerundīvus (modus), der. pelos gramáticos do part. fut. pas. gerundus 'modo de ação que está por realizar ou que será realizada'; o v. gĕro apresenta der. em: 1) ger-, como -gĕrus, a,um (ver –gero ) e -gerĭes,-ei (ocorrente no s. f. congerĭes,ei 'monte, montão, acervo, meda; monte de ramos de árvores; acumulação; meda de lenha, monte de achas, fogueira') 2) gest-, como gestĭo,ōnis 'ação de administrar, dirigir; ...