Senhor Presidente,
É como Reitor da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias (mais conhecida simplesmente como Universidade Lusófona) e com uma ilimitada esperança para o Brasil, para a América Latina, para o Espaço Lusófono e para o Mundo, que tomo a liberdade de dirigir-me a V. Exa., enquanto Presidente democraticamente eleito da República Federativa do Brasil, nas históricas eleições de 27 de Outubro de 2002. A Universidade Lusófona, que é já, estatisticamente, a maior das Universidades Privadas Portuguesas e de reconhecido prestígio nacional e internacional, com iniciativas académicas em vários Países Lusófonos, tem como objectivos oficiais “o ensino, a investigação e a prestação de serviços nos vários domínios da ciência, da cultura e das tecnologias, numa perspectiva interdisciplinar e, especialmente, em ordem ao desenvolvimento dos Países e Povos de Língua Portuguesa” (Decreto-Lei nº. 92/98, de 14 de Abril), dela se tendo escrito que constitui «a Universidade Certa, na Hora Certa, para a Lusofonia Certa!»
A “Lusofonia” implicada no projecto da “Universidade Lusófona” é uma Lusofonia que nada tem a ver com quaisquer ressaibos vetero ou neo-colonialistas e vetero ou neo-provincianos e tudo a ver com uma “Lusofonia ecuménica ou universalista ao serviço da Humanidade”, englobando os seguintes aspectos essenciais:
1. Tomada de consciência, no conjunto dos vários espaços geopolíticos e culturais do mundo contemporâneo, de um imenso “Espaço Lusófono” próprio, com grandes potencialidades ainda desarticuladas e quase totalmente subaproveitadas, “Espaço Lusófono” utilizando a mesma Língua, a qual, muito mais que a “Última flôr do Lácio, inculta e bela”, segundo os famosos versos de Olavo Bilac, é hoje, objectivamente e segundo a não menos famosa profecia de Fernando Pessoa, “uma das poucas línguas universais do século XXI” (enquanto língua falada em todas as partes do mundo e com um grande País, o Brasil, seu falante), podendo tornar-se um instrumento inigualável de comunicação e de desenvolvimento entre os homens.
2. Necessidade da institucionalização cultural, económica e política de um “Espaço Lusófono” efectivo e sério, que vá para além da quase nulidade real da passada e presente “CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa” e que defina e realize uma verdadeira identidade e uma verdadeira cidadania Lusófonas, as quais não impedem antes estimulam e condicionam os verdadeiros pluralismos inter-lusófonos e inter-humanos. Tal “Espaço Lusófono” ou “Lusofonia” em nada se opõe, antes pelo contrário, não só ao diálogo omnidimensional com todos os outros Espaços Humanos e Geo-Políticos do mundo contemporâneo como também, especificamente, aos reais ou eventuais processos em curso da “Mercosulização e até Alcaização (desde que “soberana”) do Brasil”, da (tão desejável e tão dificultada por Bruxelas) “Aliança Mercosul-União Europeia”, da “Integração Europeia de Portugal” (desde que ultrapassando a “infantil doença do luso europeismo”), das várias “Integrações Regionais dos Países Africanos de Língua Portuguesa ou de Timor Lorosae”, de todas as “Aculturações das Diásporas Lusófonas” (de que os antigos “Emigrantes Portugueses no Brasil” e os novos “Emigrantes Brasileiros em Portugal” fazem parte eminente) e da “Globalização Societal (desde que “solidária e não-excludente”) à Escala Planetária”, opondo-se sim e frontalmente à “Loucura Terrorista” e à “Histeria Anti-terrorista” que o dia 11 de Setembro de 2001 despoletou nos Estados Unidos e na Humanidade e que, uma e outra , constituem, por razões diversas mas com possíveis idênticos resultados, sérias ameaças de regresso à barbárie, mediante o incumprimento ou o esquecimento da tão longa e tão difícil conquista que é o Estado Democrático de Direito e da única e para todos (“terroristas”, “não-terroristas” e anti-terroristas”) obrigatória “Carta-Magna” da Civilização que é a “Declaração Universal dos Direitos Humanos”.
3. Reconhecimento da evidência do lugar e do papel únicos e insubstituíveis do Brasil em todo este processo da “Lusofonia”, a qual (sem prejuízo do lugar e papel de outros Países e Povos de Língua Portuguesa, como, por exemplo, Angola, destinada a tornar-se um país de referência no Continente Africano) ou será prioritariamente Brasileira ou nunca será, embora também o contrário seja verdadeiro: o Brasil, com os seus ainda adiados lugar e papel como grande potência no concerto das Nações, ou será lusófono (no sentido antes explicitado) ou nunca será! E isto com tanta maior razão e com tanta maior urgência quanto as modernas elites Portuguesas, como antes surgiu, ainda não se libertaram daquilo que eu tenho vindo denominando como “a doença infantil do seu novo europeísmo”, como se Portugal, por ser e para ser “Europeu”, devesse deixar de ser “Luso” e “Lusófono” e como se, ao contrário, até não fosse a “Lusofonia” o grande e específico peso de Portugal, como aliás de todos os outros Países Lusófonos, na balança internacional. Mas também o Brasil, por ser e para ser o terceiro grande pilar autónomo do Mundo Ocidental (ao lado da União Europeia e dos Estados Unidos), não precisa de deixar de ser “brasileiro” e “lusófono”. Quando se conscientizará plenamente o Brasil da sua força e da sua responsabilidade histórica de, enquanto grande potência potencial do século XXI, cumprir a sua missão não só de indispensável motor da Lusofonia mas também, e simultaneamente, de reequilibrador, a nível universal, juntamente com outras grandes potências como a Europa, a Rússia, a China e a Índia, dos mais que evidentes e trágicos usos e abusos da auto-declarada e hetero-aceite única super-potência actual que são os Estados Unidos da América do Norte?
Com tudo isto, e até porque, mantendo-se as elites e as estruturas economico-sociais hoje existentes, nunca o Brasil deixará de ser o eterno país de nenhum futuro, não pretendo, obviamente, esquecer nem as lúcidas palavras do Presidente anterior Fernando Henrique Cardoso: “O Brasil não é um país subdesenvolvido, é um país injusto!” nem, principalmente, as coerentes palavras e actos de todo o percurso da vida de V.Exa, agora coroada por esta eleição paradigmáticamente democrática e que, pelas melhores razões, coloca o Brasil na condição e com a obrigação de ganhar o mais importante de todos os campeonatos, que é o de um Brasil de, com e para todos os Brasileiros!
Mas também por tudo isto, ao mesmo tempo que auguro a V.Exa e a todo o fantástico Povo Brasileiro as maiores felicidades, venho colocar a Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias à disposição do Presidente da República Federativa do Brasil, reafirmando que, ao nível que lhe é próprio e no âmbito dos seus princípios fundadores, a mesma continuará a ser fiel ao seu projecto lusófono e humano, em que o Brasil, para seu bem próprio e para bem de todo o Espaço Lusófono, de toda a América Latina e de toda a Humanidade, deverá ter os referenciados lugar e papel únicos e insubstituíveis. Viva o Brasil brasileiro, latino-americano, lusófono e universal!
Com os mais respeitosos cumprimentos e os melhores votos brasileiro-lusófono-universais.
Lisboa, 31 de Outubro de 2002
Fernando dos Santos Neves
Reitor da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias
P.S. Para melhor explicitação das minhas intenções, permito-me enviar a V.Exa. o opúsculo junto, acabado de sair e intitulado “Para uma Crítica da Razão Lusófona – Onze Teses sobre a CPLP e a Lusofonia” (Lisboa, Edições Universitárias Lusófonas, 2002).