Na televisão anunciava-se com grande destaque o Concurso da Palavra mais Usada. Pronto, que mais não era do que um mero adjetivo quase ignorado, mas com grandes ambições, sentiu-se tentado. Talvez não conseguisse o primeiro lugar (a conjunção e parecia imbatível), mas poderia conseguir chegar ao pódio e, consequentemente, aos holofotes da fama.
A sua vontade de sobressair no dicionário não era de agora. O sonho começara discretamente com um primeiro esforço para deixar de ser um adjetivo esquecido. Para tal, desenvolveu uma robusta preparação física de modo a conseguir ocupar o lugar de outros adjetivos mais preparados e mais requisitados. Se alguém queria dizer «O almoço está concluído!», ele punha-se a correr e chegava antes do adjetivo concluído e o que acabava por ser dito era «O almoço está pronto!» E assim fez o seu caminho, deixando para trás adjetivos que começaram a ser menos solicitados: «O trabalho está pronto (em vez de terminado)», «O aluno está pronto para o exame (em lugar de preparado)», «Ele já está pronto (adeus, vestido)», «Sempre pronto para ajudar (esqueçam o disponível)».
E assim de significado em significado, Pronto foi-se impondo na conversação diária. Tinha sabido mostrar os seus dotes de palavra económica, de fácil articulação e foi ocupando espaços de significação cada vez maiores: já tinha direito a dez linhas numa coluna de dicionário!
Mas, ainda assim, tinha uma existência modesta, pelo que o concurso agora anunciado lhe abria outras expectativas. E se alargasse a sua capacidade a outras classes de palavras? Foi assim que, discreta mas decididamente, se fingiu advérbio: «Responderemos pronto ao seu pedido.» E lá ficou o advérbio prontamente a sentir-se ultrapassado. Também conseguiu enganar o advérbio logo ao surgir, feliz, na frase «Pronto ele chegará.» Agora, nada o podia deter. Sentia-se já um vencedor. Foi então que teve a melhor ideia de todas: e se fosse também uma interjeição? Daquelas que se usam por tudo e por nada. Sim, ser uma bengala linguística era muito boa ideia. E assim foi: «Pronto, vou começar!», «Pronto, vamos embora!», «Pronto, pronto, já passou!», «Pronto, não chores mais!»
As solicitações passaram a ser tantas que Pronto precisou de arranjar um duplo para fazer as suas vezes em momento de sobrecarga de usos. Apareceu o “Prontos”, primo de sangue, um pouco mais plebeu, que passou também a ser muito solicitado. Em momentos de grande aperto até chamavam um primo bastardo, o “Prontes”, que estava disponível para surgir em conversas pouco cuidadas.
E se Pronto começou por ser um bordão que marcava o início da fala, rapidamente percebeu que também podia assinalar o fecho das conversas. E por todo o lado se começou a ouvir conclusões como «… Pronto, já está.», «… Pronto, é isto.»
Sempre com a expansão em vista, vemo-lo atualmente numa parceria quase indestrutível que é inclusive adotada como imagem de marca por alguns falantes: a dupla de sucesso «Prontos atão».
E o concurso? Pronto envolveu-se de tal forma na sua campanha de ascensão que se esqueceu de concorrer. Mas também agora já não interessa nada. «Prontos atão!»