A Academia Brasileira de Letras actualizou o seu Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, com termos que estão em uso, mas não eram até aqui considerados oficiais, como é o caso de 'deletar'. Notícia da "Folha de S. Paulo" do dia 10 de Setembro de 1998.
A expressão «deletar um arquivo de computador» não é mais jargão de quem lida com informática. A partir de hoje, o termo passa a ser aceito como uma palavra da língua portuguesa escrita no Brasil. Ele faz parte de um conjunto de cerca de 6000 novas palavras incluídas na recente edição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, que será lançada hoje pela Academia Brasileira de Letras (ABL). Além de reconhecidas, as novas palavras passam a ter uma grafia oficial definida. Agora é possível «deletar um arquivo», «assistir a uma teleconferência» e até «tomar suco de acerola» – frutinha hoje comum no mercado, mas rara nos dicionários. Também foram incluídos termos como "Internet", "scanear" e "mouse", entre outros da informática. Eles se somam às 400 mil palavras catalogadas na primeira edição do vocabulário, de 82. Diferentemente de um dicionário, que se preocupa em explicar o significado de uma palavra, um vocabulário apenas lista as palavras. Seu objetivo é consolidar a grafia delas (o modo como são escritas), classificá-las segundo o gênero (masculino ou feminino) e categoria morfológica (substantivo, adjetivo etc.). É também um instrumento normatizador oficial, por ter sido feito pela Academia.
Critérios
Para entrar no vocabulário, a palavra tem de ser usada por um autor ou em alguma situação que tenha importância, ou seja, ter uso corrente na TV ou em jornais, diz o lexicógrafo Antônio José Chediak, coordenador da equipe que elaborou o vocabulário.
Ou seja, uma língua não pode ser pensada de maneira isolada em relação à sociedade, sua cultura e os processos que a atravessam. Esses processos influenciam e modificam aspectos de uma língua de formas diferentes.
E, devido à influência crescente da tecnologia e da ciência, os termos usados nesses campos tendem a ganhar mais importância nos modos de expressão das sociedades atuais. «Desde o século 19, a linguagem tecnológica tem tomado conta do vocabulário culto. Eu diria que a tecnologia tem sido a grande responsável pelo aumento do vocabulário culto», diz o linguista Antônio Houaiss.
A influência da tecnologia sobre a nossa vida pode ser percebida no vocabulário. «Quase dois terços das novas palavras vêm da tecnologia e da informática», diz Arnaldo Niskier, presidente da Academia Brasileira de Letras. Para um termo ser aceito como uma palavra, não basta que ele seja usado por um grupo de pessoas. «Se a TV e os jornais usam um termo, ele acaba se popularizando. Uma língua é dinâmica e tem de refletir as mudanças de uma sociedade», diz Diógenes de Almeida Campos, da Academia Brasileira de Ciências. Ele integrou a equipe que elaborou o vocabulário.
O caso de printar
Além da difusão, é preciso que um termo substitua outro em determinada área. É o caso de "deletar", explica Chediak. O mesmo não ocorre com outro termo usado em informática, "printar". «Em português existe a palavra imprimir. Julgamos que o uso de "printar' não é amplo o suficiente para incorporá-lo como palavra nova», diz Niskier. A diferença entre os dois casos, continua Niskier, se apóia em um limite: a manutenção da identidade de uma língua. «A linguagem tende a se globalizar e, nesse processo, o inglês tende a ganhar espaço, mas é necessário preservar as raízes de cada povo. É preciso estar aberto a esses processos, mas evitando exageros.»
Notícia da "Folha de S. Paulo", do dia 10 de Setembro de 1998.