As línguas são sistemas complexos que estão em constante mudança e o português não é exceção. Com frequência, surgem palavras novas no léxico ou para dar conta de realidades até então desconhecidas ou simplesmente por influência de outros idiomas. São atualmente comuns, entre os falantes de português, os neologismos de importação, sobretudo os de origem anglófona. Este fenómeno motivou mesmo uma discussão feita no último Programa Cujo Nome Estamos Legalmente Impedidos de Dizer (transmitido na madrugada de 4 de novembro, no canal de televisão SIC Notícias) sobre o verbo trolar, uma palavra recente no português europeu. Aquando da emissão deste programa, nos dicionários em linha em Portugal, apenas a Infopédia e o Priberam registavam entrada para este verbo. Entretanto, também o Dicionário da Língua Portuguesa da Academia das Ciências de Lisboa já apresenta registo deste vocábulo, que é associado a uma linguagem informal e com o sentido de, segundo esta última publicação, «provocar com argumentos sem nexos e, por vezes, de forma ofensiva os participantes de um debate ou de uma discussão online».
O verbo trolar tem origem na palavra inglesa troll, que é, nos dias de hoje, frequentemente utilizada para descrever situações relacionadas com discussões na internet em que alguém deliberadamente escreve um comentário para fazer troça de outro. Embora para os mais distraídos este termo possa ser uma novidade que advém da realidade do mundo online, facto é que o nome troll (em inglês) ou trol (em português, podendo ser também trole) não é uma novidade, estando conceptualmente relacionado com uma criatura imaginária do folclore escandinavo, geralmente de aparência feia. Talvez a descrição mais pejorativa associada aos troles venha da literatura, nomeadamente das obras de fantasia. Por exemplo, na trilogia O Senhor dos Anéis e na obra O Hobbit, do escritor inglês J. R. R. Tolkien, os troles são mencionados várias vezes e descritos como seres humanoides, com uma grande força e pouca inteligência. Não deixa de ser interessante que um nome usado na mitologia e literatura fantástica para referir um ser com características que muitos consideram negativas passe igualmente a ser utilizado para descrever indivíduos que perturbam a qualidade dos debates online.
Trol, como nome do português, pode também ser usado para referir, segundo a Infopédia, «uma pessoa feia, desagradável ou pouco inteligente», tendo passado, recentemente, a ser utilizado ainda para descrever quem «participa em fóruns de discussão pública na internet com o único objetivo de perturbar o debate». A partir deste nome, com a junção do sufixo -ar, obteve-se, então, o verbo trolar, que pertence, tal como a maioria dos novos verbos introduzidos no português, à primeira conjugação. Isto significa, portanto, que trolar se conjuga como qualquer verbo regular que pertença a este grupo. Apesar de ainda se reconhecer que a base do radical deste verbo é de origem estrangeira, a sua reanálise foi feita segundo as regras de construção típicas das novas unidades verbais do português. Portanto, este novo verbo comporta-se como qualquer outro verbo do português.
Para além do sentido associado a determinados comportamentos realizados em atividades na internet, o verbo trolar também pode ser utilizado com o significado de «fazer troça de alguém» ou «ridicularizar». Aliás, os comentários feitos a propósito deste verbo no Programa Cujo Nome Estamos Legalmente Impedidos de Dizer são sobretudo no âmbito do uso do verbo trolar como sinónimo de troçar. Pois, «trolai-vos uns aos outros» parecia ser, até aos acontecimentos de 7 de novembro, a descrição mais adequada das relações entre Belém e São Bento.