«O OK é um "estou-me a lixar" ou um "não quero saber". Mais passivo-agressivo não é possível.»
Fui acusado de ser um dry texter. Não percebi do que se tratava, mas compreendi que podia ser algo grave. E era. Procurei rapidamente uma definição e percebi que se refere a alguém que envia – ou fecha – mensagens de forma muito seca e monossilábica ou sem entusiasmo. Uma pessoa manda um texto grande com explicações e a outra responde com um “OK”, não parecendo ter vontade de prolongar a conversa. Ou usa emojis demonstrativos de pouco entusiasmo em querer retorno. Isto é a definição de um dry texter – um “escrevinhador seco”. Seria o meu caso? Provável. O crime, a ofensa maior da forma de expressão destes comunicadores, é, portanto, o “OK” solitário. Uma concordância arrasadora.
Procurei exemplos e descobri um filminho de segundos de um anónimo – «o boss» do texto seco. Alguém, numa bancada a assistir a um jogo de futebol, recebe no WhatsApp uma mensagem longuíssima, supostamente da namorada. Esse fulano faz um infindável scroll no ecrã sem ler e responde direto: «OK», e guarda o telemóvel. «Que rei!» Júbilo geral nos comentários. A prova de que o temido OK – embora fosse um modo de evitar o confronto – era também uma forma deliberada de ignorar paleio e dominar problemas desnecessários. Namorada com conversas da treta? «OK.» Uma falsa concordância, porque responder em segundos a uma mensagem longa equivale a dizer que nem se leu. O OK é um «estou-me a lixar» ou um «não quero saber». Mais passivo-agressivo não é possível. Fiz uma introspeção. É verdade. Quando se está a marimbar, quando já não se tem paciência, quando já não importa o que o interlocutor tem a dizer, responde-se «OK». Não é «sim», é um «não quero saber». Raios, sou um dry texter. Mas venho de muito longe.
Lembro-me do mundo em que se agarrava no telefone fixo e se dizia: «Estou sim, boa tarde. Quem fala?» Cada vez que aquele aparelho à entrada da casa tocava um pouco fora de horas toda a família estremecia, pois só poderia ser uma catástrofe. Tento estar atento a estas nuances comunicacionais das últimas décadas. Até estas do dry texter, que confundem a própria geração Z (os jovens com 20 e poucos anos) na utilização de emojis em contexto profissional. Deduzo que não é novidade para ninguém dizer que os Z chamam aos millennials de cringe, dado que para uns e outros os significados dos emojis são diferenciados. Nada de especial, faz parte da eterna questão geracional. Eu também não sei se é bem verdade – só posso garantir pelo que leio, dado não ser coisa que lhes vá perguntar –, mas parece-me aceitável que cada geração desenvolva a sua «linguagem digital», sendo que os símbolos são os mesmos. Ou seja: para os mesmos emojis, significados diferentes.
Leio que os Z detestam o polegar para cima (hostil, agressivo e coisa de cota), que é a forma de os velhos (eu, um gen X) quererem terminar a conversa. Verdade, acertaram. Também odeiam o coração e o sinal de OK com a mão – são emojis que denunciam a idade do utilizador. Drama. Detestam o tradicional smiley, que consideram forçado e roça a condescendência. Por exemplo, em vez do emoji a rir à gargalhada, preferem a caveira. Sim, a caveira é um dos emojis de eleição. Tudo isto está muito certo, mas levanta questões de interpretação, dado que estamos a falar de linguagem escrita hipersintetizada, em que a «linguagem jovem» de hoje já está ultrapassada amanhã. E tem o drama de estar essencialmente assente no subtexto de convenções sociais em constante evolução. Ou seja, o espaço para a ambiguidade e para o mal-entendido é enorme. E para os jovens, estando numa fase de afirmação de identidade, tudo é mais dramático. Por exemplo, ficar com a mensagem por ler (seja o visto, sejam as setinhas azuis) ou receber um mero “OK” pode fazer com que se entre numa espiral de dúvidas, insegurança e stresse comunicacional. O uso de emojis servirá muitas vezes para calibrar. Agora, só um “OK”? É desprezo? Porquê?
Não consigo contabilizar a quantidade de vezes em que uma resposta minha no WhatsApp levou a mal-entendidos. Durante muitos anos recusei-me a usar emojis, até constatar que, sem eles, arriscava todo o tipo de problemas. Usar sarcasmo ou ironia sem bonequinhos era chatice certa. Já basta a mensagem não ter tom ou a ajuda da linguagem não verbal poder estar a ser lida horas depois de enviada ou sem a atenção devida. Se não tiver emojis, então o risco de mal-entendido eleva-se. Acontece que há essa evolução contínua do significado desses signos. Mas aí, azarucho. Terão de ser os mais novos a fazer o esforço. Um smiley a chorar a rir é o que é, e não respondam com uma caveira. Farei de estúpido. Morte? Como morte?
Consta que há problemas na comunicação empresarial. Entre a gen Z e os superiores hierárquicos. É aqui que as diferenças interpretativas se tornam mais problemáticas. Gestores acham que há falta de seriedade, mas os jovens funcionários dizem que os utilizam para tornar a mensagem mais clara. Porém, a questão levantada é que os emojis podem reduzir a perceção de autoridade de um emissor. É ainda um confronto entre quem aprendeu com SMS e quem nasceu com smartphones. Mas, para ser sincero, o problema geracional dentro das empresas está mesmo na postura dos mais jovens, que é cada vez mais incompreensível para os mais velhos (que vai de uma intransigência em relação a direitos com horários, mesclada com uma inusitada ambição – assim o ouço constantemente), e não em ambivalências comunicacionais. Ah, discordam? OK.