Impuseram-se definitivamente no nosso uso quotidiano da língua, por via dos negócios, os termos: franchising, franchise, franchisar, franchisado e franchisador.
O franchising ou franchise consiste num negócio em parceria, no qual uma empresa de sucesso comprovado (franchisador) ensina a um terceiro (franchisado) o seu conceito de negócio, permitindo-lhe que ele utilize a sua marca, ensinando-lhe os seus métodos de gestão, a sua fórmula de negócio – o famoso know-how –, prestando-lhe apoio contínuo e, em alguns casos, concedendo-lhe o direito de revender em exclusivo os seus produtos numa determinada região. O franchisador expande o seu negócio e recebe royalties, ou seja, um valor mensal, fixo ou uma determinada percentagem sobre a facturação. O franchisado compra o direito para abrir uma loja, o chamado direito de entrada, uma espécie de jóia paga pelas vantagens de se tornar membro de uma cadeia já estabelecida no mercado e usar a marca. Há inclusive em Portugal várias associações, entre as quais o Instituto de Informação em Franchising, que há algumas semanas realizou um certame no qual participaram mais de 70 marcas, 20 das quais novas. Segundo os números mais recentes, este sector assegura hoje em Portugal cerca de 70 mil postos de trabalho, o que dá bem a medida da sua importância.
Os termos desta família aí estão, pois, perfeitamente implantados, certamente utilizados e plasmados em milhares de contratos, relatórios, estudos e publicações, e até em leis da República e acórdãos judiciais, justificando claramente mais atenção do que a que lhes tem sido dada pela quase totalidade dos dicionários. Os substantivos franchise e franchising são, aliás, usados indistintamente em português com o mesmo sentido, quando o primeiro seria o mais correcto, como assinala pertinentemente o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa – que estranhamente os dá como substantivos femininos –, já que é este termo que em inglês designa a licença, a concessão, sendo o segundo o gerúndio substantivado do verbo to franchise. Etimologicamente provenientes do inglês, ainda que franchise provenha originalmente do francês, nem um nem outro foram aportuguesados para "franchaisingue" ou "franchaise", como seria curial. Talvez por serem os primeiros a entrar, já que constam na maioria dos dicionários mais modernos, mantiveram-se na forma inglesa originária. Só que, com a implantação e o crescimento deste modelo de negócio, acabaram por surgir novos vocábulos, nomeadamente o verbo franchisar e os substantivos franchisado (e não franchisee) e franchisador (e não franchiser ou franchisor), todos como neologismos. Já aparecendo inclusive, por adição de prefixos, subfranchisar e multifranchisado, por exemplo. E até mesmo franchisável. É certo que já existem em português os termos franquia, franquiado e franquiador, mas para caracterizar o modelo de negócio, ainda que pudéssemos utilizar a franquia, teríamos provavelmente por necessidade especificação de recorrer a uma expressão composta: «acordo de franquia», «contrato de franquia», «regime de franquia», «sistema de franquia», «acordo de concessão em regime de franquia» ou equivalente. Havia ainda a possibilidade de utilizar as palavras representação ou concessão, como aliás acontece com as marcas de automóveis, em que falamos de representante e de concessionário. Só que tal não aconteceu, e a dinâmica da língua viva ditou a entrada no nosso uso diário daquela família de palavras: umas directamente do inglês (franchising e franchise), as restantes aportuguesadas: franchisar, franchisado e franchisador, as duas últimas inclusive dicionarizadas pelo Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora. Mas cuja construção não segue, como seria lógico atenta a sua proveniência, a pronúncia e a prosódia de origem, gerando qualquer coisa como: "franchaisar", "franchaisado" e "franchaisador".
Ora, o curioso nesta família de termos é exactamente este hibridismo, esta aculturação em que parecem subsistir nas palavras elementos da língua de origem e elementos da língua de destino. Sendo inequívoco que este modelo de negócio e os termos franchising e franchise nos chegaram por via anglo-saxónica, a explicação para as formas franchisar, franchisado e franchisador só pode ser ou uma cunhagem a partir do galicismo original franchise, de sonoridade porventura mais adaptável à nossa língua (menos provável). Ou um aportuguesamento apenas por sufixação, importando o português directamente também o radical franchi-. A esta amálgama, a este invulgar cadinho linguístico talvez não seja alheio o facto de o Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, apresentar os termos franchise e franchising como etimologicamente provenientes do inglês, sendo omisso relativamente à proveniência dos neologismos franchisado e franchisador que, e creio que bem, já consagra…