Antologia // Guiné-Bissau Língua esvoaçante * «A língua nasceu solta e desenvolta. Nasceu virada para fora de si, irmanada com os lábios, os dentes e as cordas vocais que lhe deram a fala, a música, o grito e o silêncio, próprio da caverna onde livremente se encontra enclausurada», descreve neste texto a escritora e investigadora guineeense Odete Semedo, no livro Entre o Ser e o Mar, de que respigamos a seguir um extrato. Odete Semedo · 6 de junho de 2003 · 5K
Antologia // Angola A morfologia das palavras As crianças praticam a língua como se esticassem fios de seda para prender os perímetros da vida e com os fios que sobram encontram tempo para enrolar devagarinho em bola de jogar sobre a terra húmida que ajudam a arrendondar com os pés pequenos. Ana Paula Tavares · 23 de maio de 2003 · 6K
Antologia // Moçambique A Língua Portuguesa em Moçambique Devia falar de letras, começo por números. Apenas 40 por cento de moçambicanos falam português. E falam-no como segunda língua. Só 3 por cento têm no português a sua língua materna. O idioma português não é a língua dos moçambicanos. Mas, em contrapartida, ela é a língua da moçambicanidade. Há 30 anos, a Frente de Libertação de Moçambique, ainda na guerrilha anticolonial, viu no idioma lusitano uma arma para a unificação do país e a construção da Nação. Aquele instrumento que servira a ... Mia Couto · 9 de maio de 2003 · 24K
Antologia // Angola Língua materna "(...)Português, irmão, é difícil mas não custa"(Lourentinho, personagem de um livro de José Luandino Vieira) "Pela voz da mãe eles conhecem a mãe deles..."(Provérbio cabinda) Há nas nossas relações com a língua materna um certo efeito almofada que, como a mão fresca das mães nas nossas infâncias febris, amortece a queda, suaviza a dor. Ana Paula Tavares · 3 de abril de 2003 · 6K
Antologia // Angola Discurso sobre o fulgor da língua De Portugal às suas ex-colónia africanas «Segundo Agostinho da Silva — escreve neste conto* o escritor angolano José Eduardo Agualusa — as línguas afeiçoam-se às geografias que colonizam. Num horizonte amplo, desafogado, o sotaque é mais aberto, e numa paisagem fechada ele tende a fechar-se. Assim, no Brasil, em Angola ou em Moçambique as pessoas falam a nossa língua abrindo mais as vogais, e nos Açores, na Madeira, em Portugal continental, mas também em Cabo Verde, fecham-nas. As línguas afeiçoam-se às geografias que colonizam. Num horizonte amplo, desafogado, o sotaque é mais aberto, e numa paisagem fechada ele tende a fechar-se. Assim, no Brasil, em Angola ou em Moçambique as pessoas falam a nossa língua abrindo mais as vogais, e nos Açores, na Madeira, em Portugal continental, mas também em Cabo Verde, fecham-nas.» * conto inserto no livro do autor Catálogo de Sombras. José Eduardo Agualusa · 13 de março de 2003 · 7K
Antologia // Portugal A chama plural Sonho e simulacro da unidade da língua «Não se pode dizer de língua alguma que ela é uma invenção do povo que a fala. O contrário seria mais exacto. É ela que nos inventa. A língua portuguesa é menos a língua que os portugueses falam, que a voz que fala os portugueses. Enquanto realidade presente ela é ao mesmo tempo histórica, contingente, herdada, em permanente transformação e trans-histórica, praticamente intemporal. Se a escutássemos bem ouviríamos nela os rumores originais da longínqua fonte sânscrita, os mais próximos da Grécia e os familiares de Roma.» Artigo de Eduardo Lourenço (1923-2020) escrito em Vence, em 11 de Fevereiro de 1992, para o Atlas da Língua Portuguesa na História e no Mundo (coord. por António Luís Ferronha, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda/Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses/União Latina, pp. 12/13). Posteriormente incluído no livro A Nau de Ícaro seguido de Imagem e Miragem da Lusofonia (2.ª ed. Lisboa, Gradiva,1999, pp. 121-124) e nas Obras Completas Volume IV – Tempo Brasileiro: Fascínio e Miragem (Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2018). Eduardo Lourenço · 27 de fevereiro de 2003 · 8K
Antologia // Moçambique A Fraternidade das Palavras O céuÉ uma m´bengaOnde todos os braços das mamanasRepisam os bagos de estrelas.Amigos:As palavras mesmo estranhasSe têm música verdadeirasó precisam de quem as toqueao mesmo ritmo para seremtodas irmãs. (...) José Craveirinha · 30 de janeiro de 2003 · 8K
Antologia // Portugal Uma língua que não se defende, morre Texto escrito especialmente para o Ciberdúvidas pelo Prémio Nobel da Literatura José Saramago (1922-2010), depois da sua interrupção, em 2002, na sequência do contributos do angolano Pepetela, do cabo-verdiano Germano Almeida e do moçambicano Mia Couto . José Saramago · 3 de janeiro de 2003 · 11K
Antologia // Portugal A «contextura», um conceito polémico no século XIX Segundo o ensaísta António Feliciano de Castilho, é na sintaxe que se encerra o «génio» da língua. As leis que comandam as conexões entre as formas elementares do idioma são, não apenas de difícil revogação, senão mesmo garantia de estabilidade das marcas distintivas do mesmo. É, porém, no prolongamento desta coesão sintáctica que se estende um domínio ainda mais individualizante, e por isso exactamente de maior melindre. Denomina-o Castilho, com outros autores, umas vezes «construção», outra... Fernando Venâncio (1944-2025) · 4 de julho de 2001 · 4K
Antologia // Portugal Os falsos plurais Com as novas técnicas de fertilização, certas palavras passaram ao plural. Exemplos «Já se disse tudo, mas como ninguém ouve, é sempre necessário recomeçar.» Esta frase de André Gide costumava abrir uma das secções da Critério, publicação relativamente periódica que saiu entre Novembro de 1975 e Novembro de 1976. Ao todo foram oito números: os primeiros seis dirigidos por João Palma-Ferreira e Alexandre O'Neill, escritores que nos andam a fazer falta (contentemo-nos co... Francisco Belard · 20 de março de 2001 · 7K