A Folha de S. Paulo noticia: «A vida de Jesus como fanfic» e «Uma Ideia de Você é ou não é uma fanfic sobre Harry Styles? A resposta é complicada».
Curiosa, esta palavra: fanfic. Mas do que se trata, afinal?
Fanfic, ou fanfiction, ou somente fic, trata-se de um estrangeirismo que se refere a um tipo de narrativa geralmente criada e partilhada por fãs na Internet, utilizando personagens ou universos de obras já existentes, sejam elas literárias, cinematográficas ou de outras expressões culturais. Fãs de um determinado romance, série, filme ou até mesmo de figuras públicas escrevem novas histórias ou alternativas para enredos que já conhecem e admiram.
Mas desengane-se quem pensa que esta prática de reescrever ou reinventar histórias é algo recente. Segundo um estudo de Tamires Catarina Félix (O dialogismo no universo fanfiction – uma análise da criação de fã a partir do dialogismo bakhtiniano), a origem da fanfic pode remontar aos séculos XVII e XVIII, quando surgiram versões alternativas de obras como Orgulho e Preconceito, de Jane Austen, ou Dom Quixote de la Mancha, de Miguel Cervantes. Embora naquela época essas recriações fossem feitas no formato impresso, hoje, a Internet oferece o ambiente ideal para a disseminação dessas narrativas e para a criação de comunidades de fãs, algo que se intensificou desde os anos 90.
Interessante é que, embora a prática tenha raízes históricas, não há uma data exata ou documento que registe o surgimento do termo fanfic propriamente dito – crê-se que advenha de fanzines, que surgem em 1949 (Online Etymology Dictionary), e que eram revistas com histórias escritas por fãs. O que parece certo é que, tal como outras palavras ligadas ao universo digital, o termo se consolidou sem a necessidade de uma tradução para o português. Não seria difícil criar uma equivalente: «ficção de fã(s)» seria uma tradução direta e compreensível. No entanto, à semelhança de outros termos já discutidos aqui, como biohack, red flag ou spoofing, traduzir fanfic pode não captar plenamente o seu significado cultural. Há nuances e camadas associadas ao termo original que poderiam perder-se na transposição para o português, comprometendo a precisão da comunicação sobre este fenómeno.
Um detalhe curioso é que o termo fanfic parece ter ganhado mais popularidade no Brasil do que em Portugal. Uma rápida pesquisa em notícias disponíveis na Internet revela que a maioria dos resultados sobre fanfic provém de fontes brasileiras, sugerindo que este tipo de prática e o próprio termo têm mais terreno entre os falantes de português no Brasil. Será mais um exemplo das dinâmicas diferenciadas entre as duas variantes da língua portuguesa?