«Que arde», «que tem a propriedade de se consumir pela combustão», regista um dicionário enciclopédico ao descodificar a palavra combustível Num outro dicionário, descreve-se: «Matéria cuja combustão produz uma quantidade de energia significativa.» E dá-se uma frase exemplificativa: «A subida do preço dos combustíveis.» É essa subida que tem vindo a «incendiar» Paris*.
[No sábado, 17/12/2018], mais detidos e feridos resultaram da manifestação nos Campos Elíseos dos chamados «coletes amarelos», a juntar às duas dezenas de feridos e mais de uma centena de detenções no fim-de-semana passado. A reunião que tiveram com o Governo não foi ao encontro dos seus desejos. «Primeiro-ministro disponibilizou-se para dialogar mas garante que o aumento do preço dos combustíveis vai mesmo acontecer» e «Macron preocupado com a imagem de França, mas não recua no imposto sobre o combustível», lia-se numa notícia de terça-feira. É de «combustíveis fósseis» que se trata: «Resíduo de organismos acumulados no interior da Terra, com elevado teor de carbono e oxigénio, como os carvões, o petróleo bruto e o gás natural.»
Os que Bruxelas quer abandonar até 2050. A UE quer deixar de recorrer aos combustíveis fósseis para garantir o abastecimento eléctrico, sustentar a sua rede de transportes ou alimentar a produção industrial nos Estados-membros. Isto para conseguir impacto neutro no clima. Em sentido figurado, «combustível» pode significar «que facilmente se inflama, se apaixona». Ou ainda «causa», «motivo», «alimento de perturbação», «tumulto». Por [Portugal], PS, PCP, BE e PEV chumbaram eliminação do imposto adicional sobre os «combustíveis». De nada serviu que PSD e CDS se «inflamassem».
* O que começou por ser um protesto contra a transição ecológica implementada pelo Presidente francês, que implicou uma subida do imposto sobre os combustíveis, rapidamente se transformou num movimento nacional contra a degradação das condições de vida da classe média e contra a classe política. O epicentro tem sido os Campos Elísios, no centro de Paris, onde na semana passada se reuniram 8 mil pessoas. Houve confrontos violentos com as autoridades. Mas calcula-se que em toda a França tenham saído à rua mais de 100 mil pessoas em solidariedade com o movimento dos «coletes amarelos». Com a pressão a aumentar e a sua popularidade a descer há meses, Emmanuel Macron abriu as portas ao diálogo, mas garantiu que não vai ceder nas suas medidas. Só anunciou a revisão trimestral do preço dos combustíveis. Os «coletes amarelos» não estão satisfeitos. Dizem que vão sair à rua todos os sábados até que as suas exigências sejam satisfeitas. Até lá, há uma muito clara: a demissão de Macron.
Crónica da autora, na sua coluna semanal Palavras, expressões e algumas irritações transcrita do jornal "Público" do dia 2/12/2018, escrita conforme a norma ortográfica anterior ao AO de 1990.