Problemas com o conjuntivo no problema maior de um casal desavindo, com ele a sair de casa, «farto» dos ciúmes dela – em mais uma crónica do autor sobre os usos do português em Angola, no semanário "Nova Gazeta", de 20/03/2014.
Nada mais lhe interessava. Não restava mais nada senão as memórias dos cerca de trinta anos de convivência, de partilha do mesmo tecto, três filhos e muitas histórias, altos e baixo, embora mais baixos do que altos, enfim. Nem mesmo os melhores momentos foram suficientemente fortes para atenuar a dor da mais nova e dura realidade: «Acabou! Já não aguento mais», disse Fred de malas feitas depois de uma longa e agressiva discussão.
O filho mais velho, de 12 anos e o mais chegado ao pai, não acreditava que as malas estivessem a sair para não mais voltarem, até porque aquela era uma cena que se repetia por vezes sem conta. Ele sabia que o pai ia viajar e, algum tempo depois, voltava logo. «Quando eu regressar, vou trazer-te uma bina, iá?», promete o pai.
«Qual bina qual quê? Não prometas ao meu filho o que não consegues cumprir. E espero que estejes certo da tua decisão e que sejes muito feliz aonde fores», diz a esposa num tom praguejador e triste com a ida aparentemente definitiva do marido.
Fred sempre reclamou das cenas de ciúme da esposa. «Parece obsessão», conta. «Um dia ainda perco a minha vida por causa dessa mulher», acrescenta.
O que mais o inquietava, apesar de todo o amor que sentia por Santinha, a esposa, era que ela sentia ciúmes até das próprias cunhadas sempre que fossem visitá-los. Outro dia, Fred quase espatifou o carro numa rocha, na Ilha de Luanda, depois de um belo jantar romântico num restaurante onde estava uma ex-colega que Fred não via há muito tempo.
«Minha filha, não podes continuar assim», aconselha a mãe. «Tu sabes que o certo é o que o teu marido e eu queremos. Que tu estejas bem com a tua família e que sejas muito feliz».
Nem sempre os livros apresentam soluções para estes problemas, no entanto, apontam os melhores caminhos a seguir. Ninguém quer que as famílias ‘estejem’ separadas e, por conta disso, ‘sejem’ infelizes.
Por isso, como amigo do casal, vou fazer o que é correcto: fazer com que os dois estejam unidos e sejam a melhor família do mundo.
Outros textos de Edno Pimentel sobre o português de Angola
in semanário Nova Gazeta, de Luanda, publicado no dia 20 de março de 2014 na coluna do autor, Professor Ferrão. Manteve-se a grafia anterior ao Acordo Ortográfico, seguida ainda em Angola.